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Quase 70% das famílias brasileiras estão endividadas

Publicado segunda-feira, 06 de setembro de 2021 às 06:00 h | Autor: Leonardo Lima*
Alta nos preços contribui para o endividamento das famílias
Alta nos preços contribui para o endividamento das famílias -

Cerca de 67% das famílias brasileiras estão endividadas, segundo pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), com dados de março deste ano. Dessas famílias, 10,5% não têm condições para pagar as dívidas atrasadas. Ter planejamento financeiro, renegociar as dívidas e buscar crédito são ações que o a pessoa endividada pode tomar para sair da situação.

O economista e professor de Pós-Graduação da Baiana Business, Antonio Carvalho, aponta que o alto endividamento na vida dos brasileiros já vem de algumas décadas. Desde que a CNC começou a realizar a pesquisa, em janeiro de 2010, nunca houve menos de 54% de famílias endividadas no país. O economista aponta alguns fatores: “a maioria das famílias brasileiras ganha entre 1 e 3 salários mínimos, então é uma renda pequena. E nós temos uma completa ausência de educação financeira e o dinheiro é um recurso finito, precisa ser administrado”.

O economista também explica que houve um agravamento em função da crise econômica, que “pegou frontalmente todo mundo”. As pessoas ficaram mais concentradas em casa e os gastos aumentaram, principalmente com o consumo de energia, água e itens de higiene. Além disso, o desemprego alcançou 14,1% dos brasileiros no 2º semestre de 2021, e em julho a inflação chegou a 8,99% no acumulado de 12 meses.

A baixa renda, falta de educação financeira e o estímulo ao consumo baseado em crédito são fatores expressivos que mantêm o endividados em níveis altos. O economista destaca a facilidade em se conseguir crédito hoje: “até o início dos anos 1990, fazer um cartão era bastante burocrático e o crédito era muito limitado. Hoje, a pessoa com uma renda de R$ 2 mil recebe um limite de R$ 7 mil, basta manter uma frequência de uso”, conta.

Crédito na pandemia

Oito em cada 10 consumidores brasileiros usaram algum tipo de crédito durante a pandemia, conforme pesquisa da Serasa. Apesar da maioria recorrer ao cartão, 42% tiveram como principal crédito procurado o empréstimo, seja o consignado ou com familiares e amigos. E para o período da retomada econômica pós-pandemia, mais de 55% dizem que usarão empréstimos para pagar suas dívidas.

“O empréstimo é sempre um sinal de perigo, mas não é sempre perigoso, depende da finalidade”, explica Antonio Carvalho. Comprar um bem ou fazer investimento, são situações onde pegar um empréstimo pode ser interessante se existir análise e planejamento sobre seu orçamento.

É necessário pensar no impacto daquele empréstimo nos meses que as parcelas serão pagas e entender qual vai ser o impacto mensal desse gasto. Outra pergunta que precisa estar nítida é qual a finalidade que aquele crédito vai ter. A família que pega empréstimo para pagar as contas do dia a dia, por exemplo, não tem receita suficiente para se sustentar e o empréstimo pode ser um problema, porque vira uma porta aberta para o endividamento.

E mesmo após economizar nas despesas de casa e negociar o valor da dívida, quem decidir pegar um empréstimo deve priorizar concentrar as dívidas em um só lugar. “Às vezes você tem várias dívidas, se você pega um crédito consignado, resolve todas e concentra em uma só com taxa mais baixa, então isso é uma operação saudável”, instrui.

“Você só troca uma dívida por outra se essa segunda for mais barata. Se você tem uma dívida com uma taxa de juros elevada e tem possibilidade de pegar um empréstimo consignado, com uma taxa baixa, é uma estratégia”, explica Carvalho.

Hoje, o valor médio da dívida por pessoa é de quase R$ 4 mil, e 30% são pendências com bancos e cartões, também segundo dados da Serasa. Por conta disso, é preciso sempre prestar atenção aos cartões de crédito, que concentram taxas altas de juros se passar do prazo, o que pode se tornar uma bola de neve.

Planejar o consumo

Para reduzir e pagar as dívidas, é necessário uma série de ações que vão do planejamento ao consumo, de fato. É importante ter um gerenciamento das contas de casa, estabelecer uma hierarquia, do mais essencial para o menos essencial, e ajustar o seu consumo. “O quilo da carne está custando mais de R$ 25, mas tem a opção das feiras livres, das colônias de pescadores, tem o frango mais barato, são estratégias para economizar”, explica o economista.

Outra dica é de ser mais vigilante em casa, prestando atenção à luz acesa e muitos aparelhos ligados ao mesmo tempo. Se tem carro, planeje um roteiro para quando sair resolver logo tudo o que precisa e evitar mais saídas e mais gastos com combustível. E não confie na memória. Use lápis e caneta ou então aplicativos que registram as contas de casa para ir controlando e sempre saber a renda disponível.

“A educação financeira é uma questão de hábito. Não é para viver uma vida limitada, é entender quais são os limites da sua renda, porque toda vez que você ultrapassa e se endivida, ela encolhe mais e você vai pagar aquilo que consumiu e mais os juros”, diz o especialista.

Depois de se organizar internamente, a recomendação é negociar as dívidas. E com segurança. Buscar os organismos de defesa de apoio ao consumidor para uma orientação e análise correta, e proporem uma negociação justa e que a pessoa seja capaz de honrar.

O Tribunal de Justiça do Estado da Bahia possui um Núcleo de Prevenção e Tratamento do Superendividado, que atende pessoas que comprometem mais de 50% de sua renda com dívidas. Quem quiser se cadastrar participa de uma oficina de educação financeira, ministrada por Antonio Carvalho, atualmente em modelo remoto. Depois é feita uma análise da situação financeira e a negociação, recomendando os valores das parcelas de pagamento, por exemplo, para garantir que a negociação tenha real chance de ser cumprida.

*Sob supervisão da editora Cassandra Barteló

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