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Exposição CO–LAPSO segue em cartaz na galeria RV

Mostra traz mais de trinta obras inéditas que exploram texturas e composições gestuais

Publicado quinta-feira, 06 de janeiro de 2022 às 07:15 h | Autor: João Gabriel Veiga*

“O caos não é a falta de ordem, é uma ordem que vem muito antes e muito depois de você”, afirma o pintor Igor Souza. Sob esse lema segue sua mais recente exposição, CO_LAPSO, que pode ser visitada até dia 30 na galeria RV Cultura e Arte. Fazem parte da mostra mais de trinta pinturas inéditas produzidas ao longo de 2021, explorando temas como o caos e a imprecisão.

“São sentimentos que já me acompanham há muito tempo. Quando comecei a pintar, entendi a pintura não como a representação de algo exterior, mas como meio de uma autocompreensão”, diz o artista sobre a temática.

“Sou autodidata, então aprendi a lidar com o impreciso para achar no acidente fenômenos que tivessem uma energia que me agradasse. Eu venho por esse caminho da experiência, e de alguns anos para cá, temas da mecânica quântica, como o princípio da incerteza e a própria noção de colapso e onda de partículas começaram a servir de ferramentas poéticas para o que eu fazia. Elas se conectam com toda a questão da espiritualidade, da consciência sobre a matéria”, aprofunda Ígor sobre seu interesse no metafísico (via Carl Jung) relacionado com as filosofias hindu e do candomblé.

Para Igor, esses sentimentos e conceitos são parte integral de se viver.

“A imprecisão é estar no mundo, é uma maneira de aceitar as coisas como elas nos chegam. As coisas são probabilidade, não há certeza. Essa noção de algo ideal tende a reduzir, planificar e dicotomizar as coisas, como se não houvesse um campo enorme de possibilidades entre os extremos. A vida é esse cruzamento dos extremos e das possibilidades. Trabalhar com o impreciso é uma maneira de aceitar a própria vida”, diz.

Essas ideias se refletem se refletem diretamente no trabalho do pintor, que considera impossível não expressar o impreciso: “Isso é você almejar um lugar e atingir outro, e ficar feliz com esse outro que você atingiu. A incerteza sempre esteve na minha trajetória. O que muda talvez seja que hoje eu já desejo a própria imprecisão, produzir imagens que não sejam deterministas, que tenham uma possibilidade de leitura ampla”.

Igor esboça também como essa linha de raciocínio se entrelaça com seu processo criativo. “O meu processo é mais amplo do que a pintura. Fui migrando de áreas: da arquitetura para cenografia de espetáculos de dança e teatro, para  o cinema… Eu passo seis meses me dedicando a coisas fora de casa, em equipe, e depois, num período de quatro em quatro anos, eu paro, sento, reúno o material que produzi durante um tempo e me concentro em raciocinar o que estou fazendo”, detalha.

“O processo artístico é mais amplo e tá sempre sofrendo influência das coisas que eu tô fazendo, que eu tô lendo, de outros trabalhos meus. Mas pintar em si é até hoje para mim muito experimental. eu não posso dizer que eu domino uma técnica. Vou produzindo, tentando caminhos, às vezes eu destruo coisas. Parte do meu processo está em destruir coisas que eu já fiz, porque na destruição, a gente encontra outras coisas no meio”.

A gênese do colapso

A escolha do nome da exposição reflete isso, já que Igor não nomeia obras individuais. “Esses títulos têm que carregar uma ambiguidade. Na exposição passada, fiz uma brincadeira entre ‘habito’ e ‘hábito’. Gosto de criar essa tensão entre um objeto que se abre para mais de uma possibilidade de leitura. A palavra colapso é muito recorrente dentro da mecânica quântica ao se referir sobre esse campo de possibilidades que é o estado de onda que colapsa em partícula através da matéria”, observa.

“Uso a palavra colapso, porém a separando, e a gente tem dois entendimentos. O ‘co’ enquanto algo que se compartilha, e ‘lapso’ que é o esquecimento, uma referência ao consciente coletivo, aquilo que a gente sabe sem saber, pelo inconsciente, pela memória corporal”, explica.

“Nesses dois últimos anos, a gente ouviu muito falar sobre colapso, seja de sistema de saúde, do sistema planetário… essa palavra estava nos rondando. Foi interessante trazer mais diretamente esses temas da mecânica quântica quanto gravar esse momento que a gente está vivendo”, declara Igor, que também conta como a pandemia e o isolamento social nesse período afetou seu processo criativo.

“Eu nunca trabalhei com rascunhos. Começava a produzir e as manchas, os acidentes de cor e forma que surgiam ali me sugeriam coisas, e eu ia dialogando com aqueles fantasmas que apareciam na tela. Só que com a pandemia, minha rotina não existiu, e isso me fez muito mal. Nisso, comecei a ver meu próprio corpo e rascunhar minhas próprias imagens. Foi a primeira vez que usei meu corpo como escala. Tem cinco obras específicas nesta exposição que tem um rastro de corpo, um corpo que está em muitos tempos no mesmo lugar. Eu tento transferir para a tela a estrutura que se formava do meu corpo no espaço”, elucida.


Serviço

O quê: CO_LAPSO / Visitação presencial até 30 de janeiro, de segunda a sexta-feira, das 10h às 18h e aos sábados das 10h às 14h / Online, pelo site rvculturaearte.com

*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.

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