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Entidades cobram heteroidentificação nas eleições

Para corrigir as distorções, entidades querem formato usado para evitar fraudes no sistema de cotas

Publicado domingo, 25 de setembro de 2022 às 00:00 h | Autor: Da Redação
João Jorge fala sobre importância de negros no poder
João Jorge fala sobre importância de negros no poder -

Levantamentos conduzidos pelos movimentos negros apontam que mais de 10 mil candidatos na eleição deste ano no Brasil, cerca de um terço do total de postulantes a cargos eletivos no País, foram fraudulenta ou equivocadamente registrados como “pretos” ou “pardos” nas autodeclarações. 

“A realidade é que tem muito mais candidatos se autodeclarando pardos e pretos do que efetivamente existem – ou mesmo ocupando cargos dentro da politica”, afirma o presidente do Olodum, João Jorge Santos Rodrigues. “Nós, do Olodum, somos contra a autodeclaração de ACM Neto como ‘pardo’, mas, acima de tudo, queremos mais candidatos realmente negros e indígenas em posições de poder”, ressalta Rodrigues. 

“Nem mesmo durante o Apartheid na África do Sul houve tão pouca representatividade de negros entre os governantes como há aqui. Dos 81 senadores que temos no País, apenas um é negro, enquanto metade da população brasileira é negra.” 

Na tentativa de corrigir as distorções, integrantes de entidades ligadas ao movimento negro cobram a criação de bancas de heteroidentificação nas eleições, como tem sido feito nas universidades para evitar fraudes no sistema de cotas. “Mesmo sendo importante, a autodeclaração, por si, se mostrou insuficiente”, afirma o presidente da União de Negros pela Igualdade na Bahia (Unegro), Eldon Neves. “Estamos preparando um documento para levar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que mostra a necessidade da existência de uma banca de heteroidentificação para os candidatos políticos. Nosso desejo é que, já nas eleições de 2024, os candidatos precisem passar por essa banca.”

A Unegro integra um grupo de entidades que tem levado às Procuradorias-Gerais Eleitorais estaduais pedido para revisão do sistema de autodeclaração racial. “A ação afirmativa para negros está sendo fraudada por meio da autodeclaração de candidatos obviamente brancos como se fossem negros, com o propósito indigno de assegurar indevidamente para seus partidos fatia maior do financiamento público na próxima eleição. Tal manobra, além de ilícita e fraudulenta, é torpe e odiosa, e precisa ser combatida com rigor”, afirma o documento assinado, além da Unegro, por Educafro, Cenarab (Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-Brasileira), Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, Centro Santos Dias de Direitos Humanos e Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político.

Estudo feito pelo jornal O Estado de S. Paulo, por exemplo, mostrou que 33 dos deputados eleitos em 2018 como “brancos” agora tentam a reeleição como “pardos”. A coordenadora da Coalizão Negra Por Direitos, Vilma Reis, acrescenta que a estratégia “de mudança de cor” dos candidatos, além de racista, implica na manutenção do ‘status quo’ da cena política nacional. “Em última análise, essa estratégia de ‘mudança de cor’ para acessar recursos eleitorais implica em manter os espaços de decisão e de poder nas mãos de um único segmento social, composto apenas por pessoas brancas”, afirma Vilma. “Isso é muito grave – e o TSE vai ter que pensar em fazer bancas de heteroidentificação para constatar as fraudes e pensar quais medidas vai tomar sobre os casos.” 

O ex-secretário nacional de políticas raciais da Secretaria de Políticas de Promoção para a Igualdade Racial (Seppir) e ex-diretor da Fundação Palmares Alessandro Reis concorda com a necessidade da heteroidentificação, mas afirma que há solução mais simples. “O ideal é que haja uma banca de heteroidentificação, mas acredito que, enquanto essa banca não for uma realidade, o ideal seria que essa cota do fundo eleitoral fosse destinada apenas às pessoas autodeclaradas pretas”, sugere.

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