DIREITO E SAÚDE
Especialistas debatem sobre aborto legal em seminário
Evento é promovido pela Defensoria Pública da Bahia em parceria com o Fórum Estadual Sobre Aborto
Por Ian Peterson*
O Código Penal Brasileiro permite, desde de 1940, que abortos sejam realizados de forma legal em três circunstâncias no País: em caso de estupro; quando a gravidez é de risco; e, desde 2012, caso de anencefalia do feto.
Criança com menos de 14 anos pode interromper uma gravidez de forma legal. Além disso, em situação de violência sexual, não há a necessidade de apresentação de registro policial (boletim de ocorrência) para realizar o procedimento.
Em ambos os casos, as mulheres podem buscar uma unidade de saúde próxima e garantir atendimento médico. No entanto, estas e outras informações são desconhecidas pela grande maioria do público.
Para lançar luz sobre o assunto, autoridades debatem desde ontem o tema durante o III Seminário sobre Aborto Legal. O evento, que acontece de forma virtual e segue até hoje, é promovido pela Defensoria Pública da Bahia (DPE) juntamente com o Fórum Estadual Sobre Aborto, do qual a instituição também faz parte.
A última Pesquisa Nacional do Aborto (PNA) aponta que cerca de 500 mil abortos são realizados por ano no País, e que, desse total, 43% pedem a internação da mulher em hospitais para conclusão da intervenção.
De acordo com a defensora pública e coordenadora do Núcleo de Defesa das Mulheres, Lívia Almeida, em nenhuma das hipóteses citadas na abertura deste texto é necessária apresentar autorização judicial, nem comprovar idade estacionária, para buscar o serviço médico.
“Basta a mulher expressar a vontade de interromper a gestação. No local, ela vai passar por exames apenas para atestar o encaixe da situação dela nos requisitos legais”, esclareceu.
A defensora pública diz também que por conta das diversas nuances que envolvem o tema, o órgão tem trabalhado com a divulgação dos serviços e capacitação. A Defensoria Pública afirma que existem 13 unidades de saúde habilitadas para realização do aborto legal.
“Esses serviços são divulgados e credenciados especificamente para fazer aborto”, contou Lívia.
No entanto, é importante frisar que qualquer unidade pode realizar o procedimento de forma legal. Apesar disso, muitos hospitais exigem documentos comprovando a necessidade do aborto, ou simplesmente se negam a fazer o aborto legal. A fim de evitar que casos como esses aconteçam, a Defensoria Pública realiza o Fórum Estadual sobre Aborto desde 2021 . “A ideia é evitar que esse tipo de situação ocorra”, frisou Lívia.
Acesso ao serviço
A doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Federal de Santa Catarina, Marina Jacobs, palestrou no Fórum e comentou sobre entraves que as mulheres enfrentam para realizar um aborto, principalmente as que vivem afastadas do local de oferta do serviço.
A cidade de Salvador é onde acontecem 75% dos abortos legais feitos na Bahia. Dos 329 abortos legais realizados no estado entre janeiro de 2022 e outubro de 2023, 249 foram feitos na capital.
“Os estabelecimentos de saúde que oferecem o aborto legal são muito poucos. Em 2019, apenas 200 municípios do Brasil todo tinham este serviço”, relatou Marina.
Ela destacou ainda que, dentre outros fatores, a concentração dos serviços em poucos lugares dificulta o acesso. “Já há uma dificuldade de acesso a qualquer atendimento de saúde quando é necessário viajar, e isso fica ainda mais complicado quando o procedimento é rodeado de estigma e pouca informação.”
Um outro ponto levantado pela pesquisadora que dificulta são as normas restritivas brasileiras, que exigem uma estrutura para a oferta do aborto legal muito maior que o recomendado e considerado seguro pela Organização Mundial da Saúde. Seria possível, por exemplo, oferecer aborto medicamentoso na Atenção Primária à Saúde, ou por telesaúde para pessoas no primeiro trimestre de gestação.
A discussão sobre o acesso aos serviços de aborto legal revela uma lacuna significativa entre a legislação existente e a realidade enfrentada por mulheres no Brasil. A informação emerge como uma poderosa ferramenta que pode desempenhar um papel crucial entre a vida e a morte nesse contexto.
Como evidenciado pelas estatísticas, a concentração dos serviços em determinadas regiões, como Salvador, representa um desafio significativo para muitas mulheres que buscam interromper uma gestação de forma segura e legal.
Além disso, a conscientização pública desempenha um papel fundamental. A realização de fóruns, como o implementado pela Defensoria Pública está realizando, representa um passo importante na disseminação de informações precisas e na promoção de um diálogo aberto sobre o tema.
*Sob a supervisão da jornalista Hilcélia Falcão
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