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SALVADOR

Porto de Sauípe: Moradores culpam hotéis por decadência

Por Vitor Pamplona

04/05/2007 - 23:03 h

As ruas de Porto Sauípe, povoado no litoral norte baiano a 80 km de Salvador, ainda estão escuras quando o ronco dos motores de dezenas de ônibus corta a praça principal e desperta do sono boa parte dos moradores. Dentro dos veículos, centenas de operários da construção civil seguem rumo ao canteiro de obras do que será em breve o ultraluxuoso condomínio residencial Quintas de Sauípe, construído a 6 km dali pelo Grupo Odebrecht. Sob o olhar de velhos pescadores, marisqueiras, donas-de-casa e pequenos comerciantes, a presença dos forasteiros no lugar se tornou indesejada. “O problema antes era a falta de peixe, caranguejo, marisco. Mas isso já voltou ao normal. A decadência de Porto Sauípe agora são os trabalhadores da Odebrecht. Afugentaram os turistas que restavam”, reclama Noel Dias Correa, nascido há 50 anos no povoado.



A cena se repete cinco dias por semana, desde julho do ano passado, quando a antiga vila pesqueira voltou a figurar como dormitório de trabalhadores no mapa da ampliação do complexo turístico da localidade. Distrito de Entre Rios, Porto Sauípe serve de dormitório para operários há 11 anos, quando foram iniciadas as obras do complexo hoteleiro da região. Desde então, a população local aumentou de 1,5 mil para mais de 6 mil habitantes. E, com a explosão demográfica, a rotina dos moradores sofreu mudanças drásticas. “A pesca, de onde se tirava o sustento, foi sendo esquecida. Hoje falta gente para ir ao mangue ou ao mar, porque o pessoal mais novo não quer mais esse tipo de trabalho”, diz Francisco Jesus dos Santos, o “Chico do Peixe”, que há 17 anos administra a Casa dos Pescadores de Porto Sauípe.



Chico e Noel, dono de uma barraca de praia na foz do rio Sauípe, de onde se pode ver o início do mangue que beira a comunidade, não são os únicos a mostrar insatisfação com a presença dos operários. Em um passeio pelas ruas principais, os depoimentos convergem para o consenso: ninguém parece aprovar a vinda dos trabalhadores – 1.500 vagas diretas foram criadas pelo condomínio Quintas de Sauípe, segundo a Odebrecht, que alugou quatro pousadas nesta temporada.



Mas, afinal, os empregos não chegaram à ex-vila de pescadores ou a gente do lugar prefere mesmo manter distância do “progresso” importado pelos conglomerados turísticos instalados na região?



A resposta vem nas palavras do pescador aposentado Celino Batista, 68 anos: “No começo, os mais moços trocaram a pesca pela construção. Havia pouco peixe, o caranguejo tinha sumido, e com salário de peão se ganha mais. Mas as obras grandes acabaram e deixaram mais prejuízo do que benefício”, acredita. A conclusão de Celino, cujo filho Jaílson trabalha como porteiro em Costa do Sauípe, é partilhada por muitos moradores, que falam em aumento da violência, crescimento desordenado e diminuição da atividade econômica oriunda do turismo, dentre outras reclamações. Outrora um refúgio de baixo custo para visitantes da capital ou de outros rincões do País, Porto Sauípe está “às moscas”, queixam-se.



Os operários ocupam grande parte das vagas nas pousadas do lugar, mas o dinheiro ganho por eles nos canteiros de obras dos hotéis não fica no lugar. “Os trabalhadores vêm de cidades vizinhas. Ganham o salário e vão gastar lá nos dias de folga. Para o comerciante daqui é pior. É um dinheiro que não fica em Porto Sauípe”, conclui Luís Batista Santos, o “Baubau”, que já trabalhou para a Odebrecht e agora produz festas na região.



Babau diz que, na semana anterior, um grupo de operários assaltou uma loja de material de construção. Roubaram cerca de R$ 12 mil, mas a polícia, que confirmou a história, recuperou o dinheiro porque os assaltantes foram gastá-lo em um show da cantora Nara Costa organizado por ele. “Estavam com os bolsos cheios, todos perceberam. É uma decadência”, repete a palavra usada pelo barraqueiro Noel.



Construtora se diz “surpresa”



O condomínio Quintas de Sauípe é o terceiro projeto da Odebrecht no litoral norte. Em 1996, a empresa começou a construir o complexo de Costa do Sauípe, onde cinco hotéis de luxo e seis pousadas foram erguidos em parceria com a Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil. Até 2003 a Odebrecht foi sócia do fundo, principal acionista do empreendimento, arquitetado para rivalizar com potências como Aruba, Bahamas e Cancún, mas que só acumula prejuízo desde sua criação – R$ 3,37 milhões em 2006, embora com movimento de 192 mil turistas (60% da capacidade).



O segundo projeto da construtora foi o condomínio Casas de Sauípe: 118 mansões, vendidas por até R$ 1,5 milhão a unidade, fora o valor do terreno. Na terceira fase do que chama de “projeto de desenvolvimento de Costa do Sauípe”, que corresponde à construção de Quintas do Sauípe, a empresa deve fazer mais 172 casas.



Por meio de sua assessoria, a Odebrecht disse ter ficado “surpresa” com as reclamações dos moradores de Porto Sauípe. Afirmou que cumpriu a legislação e fez um estudo sobre o impacto ambiental e social das obras. “É notório que o projeto foi equivocado. Causou danos na comunidade e criou expectativa de criação de empregos, o que não se concretizou”, diz Pedro Vieira, chefe de gabinete do prefeito de Entre Rios, Ranulfo Ferreira (PT).



A empresa rebate ainda as críticas com programas sociais implantados no entorno de Costa do Sauípe. Um deles é o Projeto Berimbau, que capacita artesãs para produzir bolsas, chapéus, tapetes e outros artefatos a partir da folha da piaçava. Em Porto Sauípe, existem atualmente 53 mulheres envolvidas com o trabalho. “Isso foi algo bom. Exportamos até para países da Europa, como a Itália”, conta dona Vilma Batista, mulher do ex-pescador Celino.



Embora reconheça esse tipo de iniciativa, o chefe do gabinete do prefeito faz uma avaliação bastante crítica das conseqüências da implantação do complexo: “Porto Sauípe foi a localidade mais prejudicada, principalmente com o crescimento desordenado. Sem dúvida, houve mais dano que benefício”, salienta.

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