SALVADOR
Taxa de lixo é questionada na Justiça
Por Yuri Silva*

A Taxa de Coleta, Remoção e Destinação de Resíduos Sólidos Domiciliares (TRSD) – cobrada no carnê do IPTU e conhecida como “taxa do lixo” – vem sendo questionada judicialmente por contribuintes que consideram a cobrança irregular.
>>Tributarista discorda que haja desvio de finalidade
Pelo menos dois pontos motivam as ações: uns afirmam que a taxa seria inconstitucional, por ser destinada a outra finalidade além da coleta de resíduos sólidos, e outros dizem que a lei que instituiu, em 2007, o Código Tributário Municipal daria isenção aos grandes produtores de lixo, se eles se responsabilizarem por tratar os resíduos.
O problema, explicam especialista e empresários ouvidos por A TARDE, é que, mesmo com a isenção prevista em lei, o município segue cobrando a taxa dos contribuintes que passaram a cuidar do próprio lixo.
Em nota, a prefeitura alega que a não-obrigatoriedade do pagamento do tributo foi extinta quando o Decreto 25.316, editado em 2014 para regulamentar a isenção, foi revogado. A posição, entretanto, é rebatida por diversos juristas de renome.
Shopping centers
Por causa disso, quem promete judicializar a questão, caso não haja acordo com a prefeitura, é o presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), Glauco Humai. Na capital baiana, contabiliza ele, nove estabelecimentos do tipo são filiados à entidade.
Juntos, esses centros comerciais são responsáveis por pagar R$ 6 milhões referentes à TRSD, de acordo com o presidente regional da Abrasce, Edson Piaggio.
Segundo Glauco Humai, a contratação de terceirizadas para executar o serviço custa um terço desse valor. “Não queremos o desgaste de uma briga judicial, mas vivemos uma crise. Quem vai sofrer é o pequeno lojista, que vai ter esse valor repassado no condomínio. Nós vamos ter que judicializar para manter a sustentabilidade do negócio”, defende Humai. Segundo ele, a taxa não estava sendo cobrada em 2016, mas foi emitida em 2017.
Vice-presidente do Instituto Miguel Calmon (Imic), um centro de estudos econômicos independente, o advogado Marcelo Nogueira Reis observa que a instituição também é contra a cobrança da taxa aos chamados grandes geradores de resíduos sólidos.
“O valor cobrado pela prefeitura é muito superior ao praticado por prestadores de serviço contratados diretamente por esses grandes geradores”, aponta Reis. E complementa: “A prefeitura deve devolver a execução desse serviço às empresas para haver um pagamento justo pela destinação dos resíduos”.
Ações
Esse fato já gerou outras ações. O Tribunal de Justiça da Bahia não informou quantos pedidos de liminar tramitam na corte sobre o assunto. Entretanto, só o escritório de advocacia Pimenta Advogados, do tributarista Marcos Pimenta, trata de cinco casos do tipo. Quatro deles, conta o especialista, já obtiveram vitória em primeira instância.
Os processos citados, segundo Pimenta, tratam de taxas cobradas que variam entre R$ 26 mil e R$ 56 mil. Ele não revela quem são os clientes, alegando questões éticas, mas defende a inconstitucionalidade do uso da taxa para outro fim que não seja o recolhimento de lixo em imóveis.
Para o advogado, doutor em direito tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a destinação, desde 2007, da taxa para o Fundo Municipal de Limpeza Urbana desvia sua finalidade, pois o valor, para ele, é aplicado em outros serviços de limpeza.
“Quando o Supremo Tribunal Federal autorizou a cobrança, disse que o valor arrecadado deveria ser usado exclusivamente para a coleta, remoção, tratamento e destinação de lixo dos imóveis, nunca para toda limpeza urbana, como varrição e limpeza de bueiros”, explica Marcos Pimenta.
Sobre isso, a prefeitura afirmou que aplica “rigorosamente” os recursos da TRSD em serviços para os quais a taxa é destinada. “A arrecadação com a taxa não cobre sequer um terço da despesa pública municipal relacionada à limpeza urbana”, alega, em nota, o município. E que “242 mil imóveis da cidade são isentos da taxa de lixo e do IPTU”.
Doutor em direito tributário pela Universidade de São Paulo (USP), o vereador de Salvador Edvaldo Brito (PSD) critica a cobrança: “A taxa de lixo é impossível no Brasil, enquanto prevalecer esse modelo. É impossível mensurar quanto cada imóvel produz de lixo e quanto cada um deveria pagar”.
Ele diz que “o que podia existir é uma taxa de limpeza urbana, para o cuidado geral da cidade”. Brito ainda defende que a isenção da TRSD para grandes produtores de lixo, prevista no Código Tributário Municipal, permanece em vigor atualmente.
“A revogação por decreto, como foi feita, não tem poder de rever uma lei, porque a lei é hierarquicamente superior. O decreto só repete a lei, para efeito de regulamentação. Mas o que vale, de fato, é a lei”, explica.
Mestre em direito tributário pela PUC-SP e presidente da Comissão de Direito Tributário da seccional baiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA), o advogado Oscar Mendonça também afirma, assim como Edvaldo Brito, que a isenção não pode ser revogada por decreto.
*Colaborou Geraldo Bastos
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