Transporte de priscas eras

Como se fosse possível inverter o fluxo do tempo, em sucessão incessante de momentos em marcha à ré, Salvador retrocede de 2022 aos anos 1970, ao investir no ultrapassado transporte coletivo conhecido pela sigla BRT.

A edição de domingo de A TARDE detalhou os erros da descabida obra, ao serem demonstrados em todas as hipóteses verificadas na premonição certeira de fracasso.

O custo alcança R$ 283 milhões, avaliando-se os primeiros quatro quilômetros, ligando os bairros da Pituba e Itaigara, onde moram pessoas de maior poder de consumo.

Não se sabe se o material utilizado é de um metal precioso ou a qualificação da mão de obra justificaria folha de pagamento a maior, mas o montante supera em até seis vezes o limite tido como razoável pelos especialistas.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), reconhecido nacionalmente pelo rigor de seus cálculos, estima em R$ 10 milhões o custo por cada mil metros, muito distante do dinheiral derramado na capital baiana.

Como gravame, os R$ 64 milhões pagos seriam multiplicados se o Tribunal de Contas da União (TCU) não assinalasse o flagrante de sobrepreço, transformado, eufemisticamente em “desconto” pelos consórcios, ao limitarem a rapina.

Como não faria melhor um tiranete de província qualquer, o ex-prefeito autorizou o início das obras sem estudo de viabilidade ambiental, de mobilidade, de impacto urbano ou econômico, ao deboche da legislação.

Os ministérios públicos estadual e federal ingressaram com ação civil conjunta em processo na 14ª Vara Federal Cível, enquanto as máquinas destroem 300 árvores centenárias.

Este viés da voracidade no avanço sobre os vestígios de natureza, em um município cada vez mais cinzento e cimentado, é outro dos efeitos do equipamento, capaz de sugar os rios Lucaia e Camarajipe.

Acrescem à irracionalidade as elevadas tarifa e manutenção, além da falta de demanda de passageiros, na contramão do mundialmente elogiado sistema metroviário capaz de verdadeiramente mudar a vida dos soteropolitanos.