O novo Decreto 9.739/19 e os concursos (9)
Seguindo na análise da nova norma, hoje iniciaremos pela mais infeliz das disposições desse decreto, e que vai trazer inúmeras dificuldades para alguns administradores, ou, ao contrário, em alguns casos, facilitará a vida daqueles que buscam pretexto para terceirizar serviços que deveriam ser executados diretamente pela administração pública. Ela está no art. 39, que considera reprovadas as pessoas que não atingirem uma classificação dentro de determinado quantitativo, mesmo que tenham superado a nota mínima estipulada no edital.
Já falei sobre isso nessa série de textos, e espero que isso seja modificado. Para tanto, irei encaminhar sugestão à Casa Civil, além de já ter contactado um Deputado Federal encarregado da relatoria de um importante projeto de lei dentro desse tema. Mais que privar, de um direito claríssimo, o candidato aprovado, a regra prejudicará muito a administração em algumas situações. Por mais que se tenha a intenção de não contratar servidores, há casos em que isso é inevitável para o funcionamento da máquina pública. E a Constituição Federal acabará sendo desrespeitada por causa dessa regra sem sentido. Se o desrespeito não ocorrer, alguns serviços serão seriamente prejudicados.
As regras de conteúdo absurdo costumam pecar também pela falta de tecnicidade. No caput o artigo diz que deverá ser feita uma relação de “candidatos aprovados”, por ordem de classificação, e no parágrafo primeiro é dito que os que não estiverem nessa relação “estarão automaticamente reprovados”. Trata-se de uma repetição desnecessária, ou aquilo que se chama de letra inútil.
O mais grave de tudo, no entanto, é a confusão que será formada na interpretação de duas disposições que se enfrentam nesse decreto. Uma é a que consta do parágrafo segundo desse artigo 39, que diz que a aplicação dessa regra tomará por base a classificação da primeira etapa, no caso de concursos com mais de uma etapa, e a outra é aquela do artigo 35, sobre o qual já falamos, que diz que, exceto nos casos em que houver lei específica, a segunda etapa dos concursos, quando houver, será sempre constituída de curso ou de programa de formação, e obrigatoriamente terá caráter também classificatório. É evidente que um candidato reprovado com base no artigo 39 alegará a existência de conflito com o artigo 35, que o beneficia, dando-lhe o direito de se submeter à segunda etapa. E o mais grave é quando a verificação for feita ao final da segunda etapa, e aquele candidato reprovado com base na regra do 39 tiver obtido melhor classificação geral com base na regra do 35. O fundamento de que a sua nomeação atende melhor ao interesse público é bem convincente, e, mesmo que não seja, certamente ocasionará a obtenção de liminares, e quem sabe até suspensão de concursos até o julgamento do mérito de ações. Se a verificação for feita na primeira etapa, ignorando-se o artigo 35, será ainda mais fácil de conseguir uma liminar para frequentar o curso, e ao final dele o problema será maior ainda se o candidato obtiver notas melhores durante a formação. Vejam que confusão desnecessária esse Decreto está criando, com grandes prejuízos aos candidatos, e sérios transtornos aos gestores e à prestação dos serviços públicos. Seguiremos no tema.