Semipresidencialismo de coalizão
Confira coluna Conjuntura Política desta segunda
O término do mandato de Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Câmara dos Deputados representa um ponto de inflexão na política brasileira. Durante seus quatro anos de mandato, Lira centralizou o poder e utilizou estrategicamente as emendas parlamentares, especialmente as de relator, conhecidas como "orçamento secreto".
Na verdade, Lira consolidou o centrão como força política dominante, empregando as emendas como moeda de troca para assegurar apoio e aprovar pautas de interesse. Essa dinâmica intensificou a interdependência entre os poderes, permitindo que o Congresso assumisse um papel determinante na execução orçamentária. Isso já seria uma espécie de semipresidencialismo de coalizão? Nesse sistema, o poder executivo é compartilhado entre um presidente e um primeiro-ministro na formação e sustentação de um governo.
O que está em jogo? Por um lado, o fortalecimento do Parlamento pode promover maior representatividade e equilíbrio entre os poderes. Por outro, a ausência de mecanismos institucionais às claras para regular essa nova configuração pode resultar em conflitos institucionais. Além disso, a utilização de emendas parlamentares sem transparência adequada levou à práticas clientelistas, comprometendo a eficiência e a equidade na aplicação das políticas públicas.
O legado de Arthur Lira na presidência da Câmara, durante os governos Bolsonaro e Lula, evidencia a necessidade de repensar a interface entre democracia, representação e governabilidade. Nosso presidencialismo às avessas inverteu a lógica, permitindo que o Congresso acumule poderes que colocam um presidente eleito pelo voto direto e popular sob custódia de interesses difusos.
Essa disfunção ficou evidente na semana passada (19) com o adiamento da votação do Orçamento para 2025. O relator, senador Ângelo Coronel (PSD-BA), postergou a decisão aguardando definições sobre a reforma ministerial e a distribuição de espaços aos partidos nas comissões temáticas do Senado. Sabe o que isso quer dizer? Que o orçamento de uma República está refém das circunstâncias apequenadas em torno dos espaços políticos a serem ocupados pelos partidos.
De forma realista, será inevitável que o presidente Lula promova uma reforma ministerial que realinhe nos ministérios um novo desenho de governabilidade, considerando os partidos de centro-direita com força parlamentar, mas adianto que não será suficiente. A conta não fecha. Após quatro anos, a perpetuação do centrão como força política legislativa primária confluiu com um novo tipo de arranjo político-institucional que coloca o Executivo em segundo plano na relação com o Legislativo, algo grave em um presidencialismo. Mesmo que Lira se torne ministro do governo Lula, a disfunção institucional permanecerá. O que fazer?
*Professor Adjunto de Ciência Política da UNILAB e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (UFRB). E-mail: [email protected].