Doença transmitida por carrapato pode levar a óbito em poucos dias | A TARDE
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Doença transmitida por carrapato pode levar a óbito em poucos dias

Aumento de casos no País chama atenção para cuidados em ambientes rurais

Publicado segunda-feira, 10 de julho de 2023 às 05:30 h | Autor: Jane Fernandes
Carrapato-estrela 
é o inseto que hospeda bactéria que causa  doença
Carrapato-estrela é o inseto que hospeda bactéria que causa doença -

A febre maculosa provocou pelo menos dez mortes no Brasil este ano, a maioria em São Paulo. Na Bahia, doze casos foram confirmados na última década, quatro deles no ano passado. Em todos, os pacientes foram tratados e se recuperaram plenamente. Este ano, a Secretaria da Saúde do Estado (Sesab) notificou 16 casos suspeitos da doença, mas nenhuma confirmação até o momento.

Entre as suspeitas comunicadas à Sesab, seis foram descartadas, duas tiveram resultado inconclusivo, e oito ainda estão aguardando o resultado dos testes laboratoriais. Segundo o Ministério da Saúde (MS), o país registrou mais de 50 diagnósticos confirmados da doença entre janeiro e junho, com ocorrência nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. 

A febre maculosa é uma doença causada pela bactéria Rickettsia rickettsii, mais comumente transmitida por meio da picada do carrapato-estrela, nome popular do carrapato da espécie Amblyomma sculptum. Em humanos, a infecção pode provocar um quadro febril agudo com desfecho letal em mais de terço dos casos, conforme estatísticas do MS.

Febre alta, de início súbito, dor de cabeça, dores no corpo, náuseas e vômitos são os principais sintomas iniciais da doença, elenca a infectologista Margarete Barreto, da Maternidade Climério de Oliveira (MCO-Ufba/Ebserh). “Com a evolução da doença, entre o terceiro e quinto dia, podem surgir manchas avermelhadas no corpo. E caso a doença progrida, disfunções orgânicas podem ocorrer e levar ao óbito”, alerta. 

“O diagnóstico é estabelecido considerando a história clínica do paciente, a presença de critérios epidemiológicos, e através da investigação laboratorial com exames inespecíficos, a exemplo, hemograma e análise bioquímica, e exames específicos: métodos imunológicos ou métodos diretos para identificação da espécie envolvida, a riquétsia”, explica a médica. 

Margarete conta que o tratamento da patologia é feito com antimicrobiano específico e deve ser iniciado imediatamente diante de uma suspeita de febre maculosa. “Além do tratamento específico, deverá ocorrer o tratamento de suporte mediante as alterações clínicas que o indivíduo possa apresentar”, completa. 

Imediato

A coordenadora técnica do Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (Cievs), Talita Urpia, esclarece que no Brasil a febre maculosa é uma doença de notificação compulsória imediata. “A orientação que a gente passa para os serviços é que na suspeita de febre maculosa em um paciente, que eles notifiquem ao Cievs imediatamente. Não é para notificar apenas pelo sistema oficial de informação, que às vezes apresenta um delay”, declara.

Então, além de registrar a suspeita no sistema adequado, o serviço de saúde que tenha realizado o atendimento do paciente com suspeita da doença deve fazer contato por telefone com o Cievs. “É necessário para que a gente possa orientar o serviço sobre o tratamento, quem tem que ser iniciado de imediato, orientar quanto à questão laboratorial e todo o processo do paciente, tentando sempre minimizar a gravidade”, reforça Talita. 

A partir da notificação de um caso suspeito, o Cievs também adotará as medidas para averiguar as possibilidades de surto naquela região. “Lógico que com esse acontecimento em São Paulo (o surto em Campinas), a gente fica um pouco mais alerta, os profissionais acabam ficando também mais atentos, com uma sensibilidade maior para a notificação”, comenta a coordenadora. 

Devido à elevada letalidade da doença quando contraída por humanos, não é preciso aguardar os exames laboratoriais para iniciar o tratamento, bastando para isso que o quadro clínico e o cenário epidemiológico sustentem o diagnóstico. Um aspecto importante é a ocorrência da picada do carrapato-estrela ou a ida do paciente a locais com maior probabilidade desse contato acontecer, como matas, rios e cachoeiras, completa Talita. 

Histórico

O estado de São Paulo concentrou 36% dos 2.157 casos de febre maculosa registrados no Brasil entre 2012 e 2022, conforme dados do Ministério da Saúde. Números da pasta apontam ainda que 62% dos 753 óbitos registrados no período citado também ocorreram em cidades paulistanas. 

Tudo indica que um evento realizado em uma fazenda situada em Campinas, na região leste de São Paulo, foi o local onde as primeiras vítimas contraíram a infecção causada pela bactéria Rickettsia rickettsii. A primeira morte foi confirmada no dia 12 do mês passado, na capital do estado, a vítima tinha participado do evento com o namorado, que também morreu após apresentar os mesmos sintomas. 

Na última segunda-feira (3), a prefeitura de Campinas sancionou uma lei tornando obrigatório que estabelecimentos sujeitos à presença do carrapato-estrela a informem a visitantes sobre o risco de febre maculosa. Segundo a legislação, a medida também se aplica a produtores, promotores e organizadores de eventos que possam ocupar esses espaços. 

Melhor forma de evitar a doença é prevenir a picada do carrapato 

Nem todo carrapato-estrela está infectado pela bactéria Rickettsia rickettsii, causadora da febre maculosa, mas como não é possível identificar previamente, a melhor forma de prevenir a doença é evitar a picada do artrópode. A coordenadora da Clínica Veterinária Unifacs, Simone Freitas, conta que esses carrapatos vivem preferencialmente na vegetação próxima de lagos, lagoas, rios, combinação que pode ser encontrada em áreas rurais, trilhas na natureza, mas também em parques urbanos. 

“É muito difícil fazer o controle do vetor, porque o carrapato se reproduz de forma muito rápida. Uma fêmea põe muitos ovos e esses ovos ficam no ambiente por muito tempo. Ele tem várias fases de vida e durante todas essas fases, se estiver com a bactéria, pode infectar qualquer animal que ele pique para se alimentar, já que o carrapato se alimenta de sangue”, ressalta. 

A recomendação de Simone para quem for a locais propícios à presença do carrapato-estrela é evitar sentar diretamente sobre a vegetação, usar botas e calças se for fazer caminhada, e evitar passar nas regiões com mato alto, pois há uma tendência de os carrapatos ficarem na ponta do capim. “As calças devem ser vedadas nas pernas, você passa até fita na perna, se for o caso, para evitar que os carrapatos subam”, acrescenta. 

Simone Freitas, coordenadora da Clínica Veterinária Unifacs
Simone Freitas, coordenadora da Clínica Veterinária Unifacs |  Foto: Olga Leiria | Ag. A TARDE
 

Outra medida importante, lembra a coordenadora, é o uso de repelentes e a colocação de coleira inseticida em animais domésticos que sejam levados a esses locais. Como o carrapato precisa passar em torno de quatro horas sugando o sangue da pessoa ou animal para ocorrer a transmissão da bactéria, caso esteja infectado, esses produtos impedirão sua fixação na pele.

Por isso é importante verificar a possível presença dos artrópodes na própria pele ou no pelo de animais domésticos ao retornar desses ambientes. “A pessoa deve remover esse carrapato. Ele não deve ser espremido, deve ser retirado com auxílio de uma pinça de uma forma delicada. Até porque o aparelho bucal desse carrapato é bem desenvolvido e pode acabar ficando na pele”, alerta a veterinária. 

"O carrapato-estrela pode ser encontrado na pelagem de alguns animais que servem de hospedeiro ao artrópode, mas não adoecem com a sua presença. Capivaras, gambás, sariguês, algumas aves e cavalos estão entre os bichos mais propensos a ter essa espécie de carrapato, especialmente pelos seus habitats", completa Simone. 

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