MÚSICA
Banda Afrocidade toma impulso para novas conquistas
Com o lançamento do primeiro álbum da carreira, a celebrada banda traz suas referências musicais
Por Júlia Lobo*
Direto de Camaçacity. O título da faixa escolhida pela Afrocidade para ficar no topo já apresenta a mensagem que a banda traz no primeiro álbum da carreira. Com uma mistura de pagodão e trap (subgênero do rap), a canção encabeça Vivão, disco lançado em janeiro e que marca o novo momento do grupo e reforça as influências artísticas e musicais vindas de Camaçari.
Criado há dez anos através do Cidade do Saber, projeto social desenvolvido na cidade, o Afrocidade parte de uma longa pesquisa e experimentação dos ritmos envolvidos no afrobeat. Com base na percussão, o grupo também explora o arrocha, o reggae e o dub jamaicanos. Vivão conecta todos os estilos e fortalece o discurso social e político não apenas com as composições, mas também a partir dos convidados, como Nildes Bomfim, mestra de cultura popular de Camaçari que participa da vinheta Canoeiro.
“A gente canta antes de todos os shows, porque representa essa passagem, uma transição, e daí que surgiu a ideia de trazer ela para o disco, porque ele representa o início de um novo ciclo, novo momento na nossa carreira. Canoeiro traz esse lugar de passagem e Dona Nildes fazendo a abertura traz a ideia de não perdermos a nossa origem”, diz Eric Mazzone, voz, bateria e direção musical da Afrocidade.
Ao todo, são oito canções e duas vinhetas. Além de Nildes, o grupo contou com o produtor Mahal Pita na composição de Topo do Mundo e o guitarrista Léo Mendes na faixa 304, que combina o trap à acordes da música de terreiro. A cantora baiana Luedji Luna é a parceria em Lua Branca, única faixa que já continha trechos escritos e foi atualizada com a representação religiosa carregada pela artista.
“O disco está bem diversificado, cada faixa tem uma identidade e isso traduz muito o que a gente está querendo dizer no momento, o Afrocidade é um grupo multigênero, a gente não é específico, estamos bem de boa em não sermos definidos como algo específico. A gente está buscando. Na verdade, estamos numa eterna busca”, afirma Eric.
Todas as faixas são composições inéditas. O álbum foi uma das 48 iniciativas contempladas pelo projeto Natura Musical e, para desenvolver o trabalho, a banda alugou uma casa para juntar todos os integrantes, depois de testados contra o coronavírus. "Nós somos uma banda que compõe e faz as coisas muito coletivamente, e foi um grande desafio conceber tudo isso com essa insegurança”, complementa Mazzone.
Além de Eric, o grupo é formado por José Macedo (MCDO) na voz, Fernanda Maia (voz e percussão), Rafael Lima (percussão), Marley Lima (baixo), Sulivan Nunes (teclado), Fal Silva (Guitarra) e a dupla de bailarinos Ghuto Cabral e Deivite Marcel.
Cidade: força e palco
Vivão não só nomeia o álbum como também é outra vinheta. A história da palavra veio de uma seguidora que, ao perceber que a banda estava compondo novos trabalhos, soltou “Caramba, o Afrocidade tá vivão!”. Daí em diante, a expressão passou a contemplar diversos aspectos do disco.
A vinheta que leva o nome reproduz um diálogo sobre o significado de Vivão para a banda. Antes da pandemia, o Afrocidade estava em um momento de destaque com o hit Baby Te Liguei e tinha acabado de puxar o trio navio pirata da Baiana System, junto o rapper paulista Mano Brown. Com a chegada da covid-19, doze shows foram cancelados de vez.
A banda também estava entrando nas plataformas de música digitais com o EP Afrocidade Na Pista (2019). Mesmo com mais de dez anos de trajetória, o grupo mantinha a força com o Afrobaile, em Camaçari. Os shows e ensaios eram os únicos locais onde a banda compartilhava as músicas.
“A gente sempre se sentiu um pouco desatualizado, fazíamos as composições e elas não apareciam nas redes, então as pessoas tinham apenas o primeiro contato através do baile e ficávamos sem nossa identidade virtual”, reconhece Eric.
Com Vivão, a retomada vem de forma musical e imagética. O projeto também inclui um álbum visual que traz trechos menores das músicas do disco, como pequenos clipes em um só vídeo. Disponível no canal de YouTube da banda, a gravação apresenta todos os integrantes do Afrocidade, performance e instrumentos dentro do cenário de um apartamento.
“Era de fato assumir essa representatividade no disco, tem faixa que tem mais integrantes, tem faixa que tem menos, a ideia era trazer a nossa imagem, nosso rosto, nossa cara, para que as pessoas pudessem associar diretamente o que estavam ouvindo com aquele corpo ali. Dar nome, dar cara, dar sobrenome”, afirma Mazzone, que dividiu a direção do álbum visual com o fotógrafo Roncca.
A capa do Vivão reforça ainda mais a identidade assumida pela banda. Sobre um fundo azul, uma foto tirada do Morro da Manteiga, em Camaçari, envolta pelo mapa da cidade. A intenção é deslocar a imagem de pólo petroquímico e resgatar as expressões culturais do local que influenciou o grupo e continua como referência artística.
“A gente não vê a representatividade do nosso território, que faz parte de Salvador também, e é enxergado de forma bem separada. Estamos contribuindo bastante com esse contrafluxo, tentando reescrever essa história. No último Afrobaile que teve, foram uns seis carros de transporte de Salvador para Camaçari. O show é bom em todo lugar, mas de onde viemos tem um toque diferencial”, reitera Eric.
O próximo Afrobaile está marcado para sábado que vem (dia 12), em Camaçari. Ainda sem previsão da turnê do Vivão, o show vai trazer algumas canções do álbum. Como diz o trecho da primeira música: “Direto de Camaçacity no verbo pelo corre da verba”.
*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.
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