EXORCIZANDO FANTASMAS
Caian versa sobre suas dores em Paixão e outras drogas
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Por Victor Hernandes*
Quando o assunto é paixão, variadas reflexões surgem para embasar discussões relacionadas ao tema. A temática se tornou também assunto no álbum Paixão e outras drogas, do cantor baiano Caian. Acompanhado de um roteiro musical cronológico e com diferentes percepções acerca do amor e questões relacionadas à luta contra as drogas, o disco do músico chega com treze impactantes faixas.
Segundo o artista, a euforia causada pelo amor e as consequências deste ato foi o ponto que fez com que a paixão se tornasse o principal tema abordado neste seu álbum.
“Sempre digo que estar apaixonado pode causar efeitos tanto altamente prazerosos quanto destrutivos, assim como os usos de substâncias químicas. Por isso, não só quis trazer essa conexão como, principalmente, deixar que a paixão fosse entendida como assunto principal do disco e as ‘outras drogas’ viessem como cenário que cerca essa história, possibilitando as metáforas e analogias construídas nos versos de cada composição”, explica.
Além dessa questão do afeto, o músico apresenta também no disco suas dores, experiências e vivências. As histórias do próprio Caian servem de modelo e referência dentro da produção. Na faixa, Não me deixe mudo, ele próprio se apresenta e dá a carta de boas vindas da produção.
“Contar o que vivi foi uma maneira de superar a própria dor, os traumas, o passado e, sobretudo, seguir adiante, transformando uma tragédia amorosa em arte. Nesse ponto, a experiência de construir uma obra totalmente autoral, pensando em dramaturgia é nova. Mas os reflexos surgem bem antes, de todos os anos que venho me dedicando aos trabalhos com música e artes cênicas”, relata o guitarrista.
Temas aflorados
São diferentes questões que podem ser observadas em Paixão e outras drogas. Desde o entusiasmo causado pelo sentimento da paixão, como também as mais profundas emoções experimentadas pelo artista.
“A intenção com cada canção composta e faixa produzida foi a de criar um cenário que a pessoa possa fechar os olhos e sentir cada sentimento que eu sentia, à sua maneira e baseada nas próprias experiências. Falo daquela euforia da paixão, da ressaca do álcool, do melhor momento ébrio da vida até chegar na fossa profunda de uma separação. São essas as emoções que, apesar de serem vividas de maneiras e intensidades diferentes por cada pessoa, são comuns”, revela o músico.
Um incentivo de resistência e força para as pessoas que sentem dificuldade em aceitar a própria existência é outro quesito proposto pelo artista. Ele alerta fortemente também sobre a importância da autoaceitação, reconhecimento e identificação.
“Meu depoimento totalmente sincero é uma maneira das pessoas se identificarem em alegrias e ruínas semelhantes. Estou dizendo aqui que estou vivo. Um homem negro de Salvador, cheio de falhas e imperfeições. Tenho que encontrar minha maneira de viver no mundo, ser bem-vindo até o fim. É um convite para a sobrevivência dos que sofrem dificuldades de carregar a própria existência em espaços tão adoecidos”, ressalta.
Ainda neste trabalho, Caian levanta importantes discussões, como o racismo estrutural brasileiro, luta contra drogas e do sistemático genocídio da população negra na sociedade atual.
Para o músico, é inevitável ser um artista negro e não falar dessas questões em sua obra.
“Eu não poderia, sendo um artista que representa também a população negra desse país, falar de drogas sem falar da farsa que é a guerra contra elas e as consequências disso. Meu disco é para acolher quem sofre com essas injustiças da sociedade e para quem está do outro lado, repensar seus posicionamentos políticos. Ser antirracista é ser antiproibicionista também. Temos números muito maiores de pessoas pretas e pobres que estão morrendo de tiro da polícia – a mesma que nunca chega aos bairros nobres”, pontua.
Timbres singulares
O disco faz um recorte de pelo menos seis décadas dos estilos de execução e produção de rock. Apesar das treze músicas do álbum possuírem grandes particularidades, as faixas se conectam ao decorrer do CD.
Acompanhado de uma potente banda de rock, Caian diz que o motivo de suas canções serem tão únicas é por conta da forte sonoridade presente em cada uma.
“Essas canções se conectam principalmente porque quase todas foram escritas por um mesmo autor. O que dá a liga do disco é justamente a musicalidade e personalidade de todos profissionais envolvidos.”, comenta.
Sobre a mistura de toda essa sua musicalidade, o cantor afirma ainda que “o resultado tem uma pegada que vai de Jonhy Cash à Cascadura. E claro, acima de tudo, vem com o meu sotaque de homem preto, soteropolitano, que reivindica no próprio trabalho ocupar lugares que antes eram protagonizados majoritariamente por brancos, ainda que o gênero musical também tenha surgido por meio dos negros”, completa.
A musicalidade de Caian já é desenvolvida em seu trabalhos autorais há mais de quinze anos. Músico, compositor e cantor de Salvador, o artista também é multi instrumentista, toca guitarra, violão, piano e teclado. Como guitarrista um extenso currículo, onde já tocou por todo o país com o rapper Baco Exu do Blues durante um ano, além de colaborar também em importantes projetos de Dão, Marcela Bellas e Nabiyah Be e do Trio Virgulino, de Pernambuco.
Em uma carreira premiada, o músico já foi indicado ao Prêmio Caymmi de Música, na categoria Revelação, com o álbum Plutão. Já participou também de diversos tributos aos Novos Baianos, durante oito anos, aonde chegou a tocar até com a cantora Baby do Brasil.
Em Paixão e outras drogas, Caian assume o vocal, mas também toca guitarra, violão e teclados. O álbum já pode ser encontrado nas plataformas de streaming e também no canal do Youtube do cantor.
Serviço
O quê: Paixão e outras drogas / Caian / Independente / Disponível nas principais plataformas digitais de streaming
*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.
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