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CULTURA

Clyde Morgan: "Corpo bem cuidado não envelhece"

Por Eduarda Uzêda, do A TARDE

26/11/2008 - 23:06 h | Atualizada em 27/11/2008 - 0:02

O dançarino, coreógrafo, pesquisador e professor Clyde Morgan é a prova viva de que um corpo bem cuidado não envelhece. Com 68 anos de idade, 48 dedicados à dança profissional, transpira jovialidade e leveza, lucidez e vivacidade.

Morgan, que está em Salvador participando do I Encontro Internacional de Dança Negra, fala da dança brasileira e baiana, culto afro e orixás e preconceito em entrevista exclusiva à repórter Eduarda Uzêda. Acompanhado do percussionista Khalid Saleem, ele coordenou uma oficina no Espaço Cultural Coliseu, no Cruzeiro de São Francisco.

A TARDE – Clyde, você participa do I Encontro Internacional de Dança Negra. Dança tem cor?
Clyde Morgan –
Dança não tem cor, mas o que a dança tem é uma forma de expressar as características e a história de cada povo que dança. É como atletismo. Atletismo não tem cor, mas tem determinadas áreas onde determinada raça se manifesta com mais experiência e agilidade do que outra. Por exemplo: você não encontra na África muitos campeões de esqui. Esquiar não é uma experiência do povo do Congo ou povo do Quênia, os grandes corredores, campeões de corrida de longa distância. Você não encontra este tipo de capacidade entre os esquimós.

A TARDE – Você fala então da questão da especificidade.
Clyde Morgan –
Exatamente. E essa é a beleza da dança. Agora, tem momentos na história da dança onde há uma mesclagem e esta mesclagem, miscigenação cultural, é que faz da dança afrocultural brasileira uma coisa única, tanto que ela tem a informação e experiência do europeu, mas também do indígena e do africano. O próprio Carnaval é uma manifestação disso. Mas dança também é técnica e ensinamento.

A TARDE – Fale mais sobre isso.
Clyde Morgan –
Uma pessoa asiática nascida em São Paulo claramente vai assimilar toda a cultura paulista. Como você vê hoje vários japoneses no samba brasileiro.

A TARDE – Como você vê a dança e os profissionais de dança no Brasil e na Bahia?
Clyde Morgan –
Eu ensinei durante uns 10 anos na Ufba (70 a 80) e depois, quando eu fui para os EUA, continuei com esta ligação com a Ufba, Funceb, e várias entidades brasileiras, tais como o Balé Guaíra, Corpo de Baile do Teatro Municipal de São Paulo, Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Tenho participado quase sempre de eventos culturais do Brasil inteiro.

A TARDE – E diante desta sua experiência, qual é a sua análise, afinal?
Clyde Morgan –
Em primeiro lugar, já existia um campo de dança bem amplo. Existia a dança moderna, existia a dança folclórica, mas o que fui transformando com a minha presença foi a presença do negro, a posse masculina da Escola de Dança da Ufba. No início da formação tive como alunos Mestre King, Eusébio Lobo da Silva, Zebrinha, Firmino Pitanga.

A TARDE – Então, quando você chegou o espaço do negro bailarino era realmente reduzido, bem pouco.
Clyde Morgan –
Sim, era bem pouco. E eu fui criando papéis de dança e de performance para esta turma que deu outra visão de capacidade. Um grande número destas pessoas foi estudar no exterior em busca de um bom desempenho profissional na Europa, Ásia e Estados Unidos e elas retornaram com trabalhos mais rebuscados, mais profissionalizados.

A TARDE – Repassaram os conhecimentos.
Clyde Morgan–
É. Elas, por sua vez, criaram seus próprios grupos, suas próprias companhias e ingressaram nas universidades como professores. Então tudo foi transformado com estas sementes. Eu não quero ignorar, descontar a participação das mulheres. Tanto as negras como as brancas foram assim extraordinárias. Fiz um recorte da área masculina porque houve uma carência desta participação. Mas realmente a dança moderna foi sustentada pela força feminina. Quero dar crédito às pessoas pioneiras aqui, a exemplo de Lia Robatto e minha própria esposa, Lais. Com minha chegada o espaço já tinha sido criado para minha atuação.

A TARDE – E hoje é muito diferente?
Clyde Morgan –
Tem uma grande diferença. Antigamente o Teatro Castro tinha anualmente apresentação de vários grupos folclóricos. A dança folclórica estava no auge. Esta área diminuiu muito.

A TARDE– Então, apesar de aumentar o número de homens na dança, o número de grupos diminuiu?
Clyde Morgan –
Sim, o número de grupos folclóricos. Mas vou passar para o outro assunto que é a dança erudita, que já está se transformando. Isto porque os meninos estão estudando o balé clássico, estudando dança moderna, incorporando estas formas modernas com a dança afro e capoeira. Então esta mudança é significativa. E eu vejo isso no Brasil inteiro. Eu vejo nos grupos que conheço. O grupo Corpo, um grupo fantástico que conheci em 1971, no Festival de Inverno de Ouro Preto. Hoje em Dia o grupo se apresenta anualmente em Nova Iorque, com grande sucesso.

A TARDE – Que outras mudanças você pode apontar neste momento?
Clyde Morgan –
Eu vejo a inclinação e a propensão do negro dançarino de estudar e se aprofundar mais na área de sociologia, técnicas mais aprimoradas, e se envolver mais com as universidades, principalmente nos EUA.

A TARDE – Você apontou mudanças boas, mas o que precisa melhorar?
Clyde Morgan –
O que vejo que precisa de mais progresso é na área de patrocínios. Eu não gosto de fazer este tipo de comparação, mas vou fazer. Nos EUA, nós temos bolsas para talentosos e carentes para que eles se desenvolvam nas universidades. Os brasileiros precisam também deste tipo de apoio e patrocínio de entidades comerciais e industriais. Continua sendo uma área de carência.

A TARDE – O senhor é filho de Oxalá e ogã de Omolu do Ilê Axé Opó Afonjá, não é?
Clyde Morgan –
Eu fui criado no centro cultural dos EUA, ligado diretamente com a cultura africana. Esta organização se chama Karamu, palavra que significa o centro da comunidade. Foi neste centro que adquiri experiência nas danças africanas, dança moderna, jazz e teatro infantil. Sou formado na área de história inglesa e na língua francesa.

A TARDE – E foi neste centro que você conheceu as danças da África?
Clyde Morgan –
Dentro deste Centro Cultural que conheci danças da África e depois fui para Nova Iorque. Dancei na Cia. de José Limon, grande amigo de Heitor Villa Lobos. Em seguida fui para a África, fiz turnê na África inteira. Vamos dizer que minha cabeça foi feita nesta época. Meu entendimento foi nesta época.

A TARDE – E na Bahia, quem o levou ao Ilê Axé Opô Afonjá ?
Clyde Morgan -
Foi minha esposa, Lais Morgan, que era amiga da família do Mestre Didi. Eu cheguei aqui com a cabeça feita, mas não conhecia esta turma baiana. Agreguei conhecimentos aqui. Na Nigéria foi confirmado Oxalá como dono da minha cabeça. Mas meu trabalho artístico, minha vida, meu espiritual estão ligados aos esclarecimentos que aconteceram aqui na Bahia, principalmente no Ilê Axé Opó Afonjá.

A TARDE – Para finalizar, estamos no mês da consciência negra. Você já foi vítima de discriminação racial?
Clyde Morgan -
Eu sou provavelmente uma pessoa privilegiada. Pode ser que existisse discriminação onde eu fiz parte, mas frontalmente, diretamente, eu não posso dizer que fui vítima, que tive esta experiência. Mas tenho visto a discriminação com outras pessoas.

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