LITERATURA
Box traz sete romances que compõem Em Busca do Tempo Perdido
Por Chico Castro Jr.

Atire a primeira madeleine quem nunca hesitou diante do esplendor literário de Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust (1871-1922). A mera visão de suas quase 2.500 páginas já fizeram muitos pretensos leitores tremerem em suas polainas - por mais boa vontade que tenham.
Catedral gótica monumental em forma de literatura, a obra definitiva do gênio francês ganha nova chance de apreciação com a chegada às livrarias de uma caixa com os sete romances que a compõem distribuídos em três volumes de capa dura, pelo selo Nova Fronteira, da Ediouro.
O acabamento de luxo é mais do que adequado à classe da obra e marca os 145 anos de nascimento de Proust. Nesta edição, a tradução é do poeta e crítico Fernando Py, que também assina um prefácio para cada livro.
No volume um estão No Caminho de Swann e À Sombra das Moças em Flor. O volume dois apresenta O Caminho de Guermantes e Sodoma e Gomorra. E o terceiro fecha com A Prisioneira, A Fugitiva e O Tempo Recuperado.
"Proust revolucionou a história da literatura quando escreveu Em Busca do Tempo Perdido, que é hoje considerado 'o maior romance do século XX' e até 'o maior romance de todos os tempos'", afirma Ana Carla Sousa, editora de clássicos da Nova Fronteira.
"Seu valor e sua beleza vão se revelando mais impactantes com o passar do tempo. Como disse William C. Carter, especialista em Proust, 'apesar de ter 100 anos, é uma obra muito moderna. Quem lê sempre reconhece, nos personagens, pessoas do seu convívio ou a si mesmo'", acrescenta.
Como dito no primeiro parágrafo, suas caudalosas 2 mil e tantas páginas, aliadas à fama de "difícil" ou "denso", já espantaram muitos possíveis leitores. Ana Carla aconselha respirar fundo e exercitar o ponto fraco da chamada Geração Y: foco. "Diria que é preciso repensar o ritmo da leitura, pois a obra exige concentração. Mas é um desafio que sem dúvida nenhuma compensa", garante.
Um truque para botar o pé no caminho, seja o de Swann ou Guermantes, é escolher um dos sete livros de acordo com a conveniência (leia-se número de páginas) ou interesse temático para iniciar a leitura. "Como os episódios da obra não foram dispostos em uma ordem cronológica rígida, é possível, sim, ler os volumes fora da ordem", diz Ana.
O gatilho da memória
Escrito entre 1908 e 1922 e publicado entre 1913 e 1927, Em Busca do Tempo Perdido é a saga do Narrador, como é conhecido o protagonista. Não há quem até hoje resumiu Em Busca... e seus muitos temas em poucas palavras. Mas um que certamente é central é a questão da memória.
Daí a madeleine citada no primeiro parágrafo. O tradicional bolinho francês foi eternizado por Proust ao servir como uma espécie de "gatilho de memória" para um personagem, que mergulha em um devaneio involuntário rumo ao próprio passado, ao degustar uma madeleine.
Outro tema marcante é a homossexualidade, investigada por Proust em Sodoma e Gomorra. "Ele aborda a homossexualidade abertamente, gerando polêmica numa época em que o assunto ainda era tabu. Essa abordagem, no entanto, precisa ser relativizada, pois a obra foi escrita em um contexto social bem diferente, mas é inegável sua importância ao tratar do assunto de forma tão direta e explícita", observa Ana.
Nesta edição, Fernando Py ficou a cargo da olímpica tarefa da tradução, sucedendo Mário Quintana, Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade. "Não há dúvida de que é uma aventura intelectual largamente compensadora, um trabalho altamente gratificante. Desde que se adotem critérios seguros e sejam obedecidas o mais fielmente possível as peculiaridades essenciais do autor", afirma Py.
"No caso, a fluência musical da frase, a por vezes enorme extensão desta e dos parágrafos, sem dividi-los em blocos retalhados, o movimento ondulatório dos períodos etc. E mais, tratando-se de uma edição brasileira, construir frases e períodos à nossa maneira, sem lusitanismos nem regionalismos", conclui o tradutor.
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