LITERATURA
Veja cinco opções de quadrinhos autorais para ler no verão
Por Chico Castro Jr.

Coisa boa para quem está de férias no período que ora nos torra o juízo – leia-se verão – é botar a leitura em dia. Se for história em quadrinhos então, é juntar o útil ao delicioso.
Aqui, selecionamos cinco opções, todas lançadas recentemente e aptas ao mais estrito prazer estético e literário.
O destaque desta leva é uma das obras mais espetaculares já produzidas para esta mídia. Diastrofismo Humano é o livro dois da saga Crônicas de Palomar, do quadrinista californiano Gilbert Hernandez.
Gilbert, ao lado do irmão Jaime, criou, nos anos 1980, uma revista independente chamada Love & Rockets. Nela, cada um deles criou um universo ficcional próprio. Jaime criou o conhecido como Locas, onde o título da série (Amor & Foguetes) fazia sentido em torno de Maggie, mecânica de foguetes vivendo aventuras amorosas em um contexto chicano punk rock.
Já Gilbert, inspirado no realismo fantástico de Garcia Márquez, criou a cidade de Palomar, recanto esquecido em algum país da América Latina.
Ele povoou essa cidade de um dos conjuntos mais inesquecíveis de personagens criados para qualquer mídia ficcional. E contou a história deles atravessando gerações.
Nas histórias, vemos esses personagens nascendo, crescendo, enlouquecendo, indo e voltando da cidade grande, tendo filhos – vivendo.
Há o grupo de amigos em torno de Heráclio, um homem de família com um filho fora do casamento, os quais acompanhamos desde crianças. Há Luba, a voluptuosa bañadora de Palomar, que tem uma tropa de sete filhos – e que se torna prefeita. Há Tonantzin, a bela vendedora de quitutes exóticos, que se politiza ao extremo e acaba cometendo um ato de autoflagelação. E por aí vai.
Neste volume, um assassino serial ataca na humilde cidadezinha, o que é visto como um sinal da mudança dos tempos. Como os habitantes de Palomar reagirão? Quem é o assassino? Cativante, Diastrofismo Humano pode ser lido isoladamente, sem prejuízos para o entendimento da trama.
Se quiser começar do início, busque Sopa de Lágrimas, o livro um de Palomar. Mundialmente aclamada, as Crônicas de Palomar são uma aula de narrativa sequencial.
Essex e Rosa Vermelha
Similar à Diastrofismo é Condado de Essex, do canadense Jeff Lemire. Hoje mais conhecido por assinar HQs mainstream como Arqueiro Verde (DC) e Velho Logan (Marvel), Lemire tem em Essex um breakthrough, a obra que o revelou ao público, abrindo caminho para HQs autorais como O Soldador Subaquático (Mino) e Sweet Tooth (Vertigo).
Apontada pela Canadian Broadcasting Corporation (TV pública) como um dos "cinco romances canadenses essenciais da década de 2010", Essex é a obra mais pessoal de Lemire, ambientada na comunidade rural em que ele cresceu. A edição lançada no Brasil pela Mino traz a obra completa em três volumes: Contos da Fazenda, Histórias de Fantasmas e Enfermeira do Interior.
Outra leitura densa é Rosa Vermelha, a biografia em quadrinhos de Rosa Luxemburgo (1871-1919), filósofa, economista e revolucionária alemã. Com uma história de vida dramática e riquíssima, Rosa é retratada por Kate Evans como uma pessoa extremamente passional, mas também de grande capacidade intelectual – como, de fato, o era.
Com o feminismo (novamente) em alta, leitura altamente recomendada para se iniciar na vida e obra dela.
Em tempo: a estudiosa Isabel Loureiro, autora do livro Rosa Luxemburgo e o Dilema da Ação Revolucionária (Unesp, 2005) assina ótima apresentação da edição, lançada pela Martins Fontes.
Bar e Tabloide
Mas chega de falar de HQ gringa. Faz tempo que o Brasil não deve nada ao resto do mundo – que, aliás, tem importado (e premiado) muitas obras e quadrinistas brasileiros.
Duas das melhores HQs brasileiras lançadas em 2017 são Bar (Mino) e Tabloide (Veneta). A primeira é um primor de estética underground, coisa de deixar a turma da inesquecível Chiclete Com Banana (a HQ, não a banda) orgulhosa.
Exalando paulistanidade, Bar reúne diversos episódios ambientados em um boteco pé-sujo do centro de São Paulo. Com personagens típicos deste tipo de cenário, a HQ assinada pelo coletivo Miolos Fritos tem na arte enlouquecida e ultradetalhada o ponto forte, além do domínio do palavrório paulistano na boca dos personagens, um mais engraçado que o outro.
Já Tabloide, apesar de trazer proposta totalmente diferente, tem em comum a ambientação paulistana.
Thriller policial com toques surrealistas, traz uma destemida jornalista investigativa, Samantha Castello, obcecada em descobrir a verdade sobre o estranho caso de um cadáver vestido de noiva, encontrado à beira de uma represa. Na busca, Samantha mergulha no que há de mais bizarro na marginalidade paulistana, incluindo escravos bolivianos, assassinos pagos e uma sociedade secreta.
Ágil, a trama se desenrola cheia de detalhes que prendem o leitor página após página. Aguardamos agora uma merecida e bem produzida adaptação para o cinema.

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