MÚSICA
Grupo de rap Underismo movimenta Salvador com a 'arte da verdade'
Por Ashley Malia | Foto: Felipe Correia

Em meio às batalhas de rima e o desejo de fazer acontecer, oito jovens soteropolitanos se unem e criam não só uma palavra ou um grupo, mas um movimento dentro do rap soteropolitano que já mobilizou centenas de pessoas que buscam ouvir um som que extrai o que há de mais caro hip-hop: arte e verdade. Senpai, Ponciano, Ares, Alfa, Trevo, Kolx, Dj Moura e Nobru formam o grupo de rap Underismo, misturando a poesia do ‘liricismo’ com as ideias fora-da-caixa do ‘underground’, movimento de contracultura que foge dos padrões comerciais e midiáticos.
Um dos grandes feitos da carreira dos baianos foi a criação do Baile Under, evento lançado em abril de 2018 com a intenção inicial de divulgar o EP recém-lançado, ‘R3$IDU0$’ (lê-se ‘Resíduos’). "A gente fez o EP e percebemos que, naquele momento, éramos muito pequenos para alguém nos contratar, mas a gente precisava fomentar isso para fazer acontecer o que estávamos precisando", contaram.
A primeira edição do evento acabou lotando a Mouraria 53, um casarão antigo localizado na rua da Mouraria, no centro de Salvador. "A gente não imaginava nada disso [a lotação]. Arrumamos o espaço, limpamos tudo e pensamos: 'e agora, o que vai dar?'. Quando chegou o horário da festa, a casa já estava lotada e com mais ou menos 100 pessoas na rua esperando alguém sair para poder entrar", relembraram os artistas. "A galera gostou e se viu representada, isso fez com que a gente pudesse construir algo concreto", explicaram.

Além de mudarem a própria história, os artistas conseguiram mudar também a percepção das pessoas sobre o espaço onde acontecia o Baile Under. "A Mouraria [53] estava em ruínas, a gente ressignificou aquilo, fizemos as pessoas frequentarem e olharem com outros olhos", disseram.
A gente começou sem nada, fizemos o EP vendendo camisa e depois criamos o evento. Com essa ideia, outros grupos já começaram a fazer também, porque os contratantes não querem pagar a galera daqui [da cidade] pra participar de evento
O trabalho com a produção do evento, na época gerenciado por Filipe Duarte, trouxe uma popularidade que se concretizou nas mensagens de apoio e admiração que recebem nas redes sociais e nas batalhas de rima - duelos de improvisação de MCs - da cidade. Trevo contou que as referências que outros MCs fazem ao grupo nas batalhas mostra para eles um pouco do que é esta ascensão. "Já aconteceu de eu chegar para batalhar e todo mundo começar a cantar 'Pretx Chave' (lê-se 'preto' ou 'preta' chave)", completou Alfa, falando sobre o sucesso do último lançamento do grupo, em parceria com a marca de roupas Produto Dugueto e produzido por Felipe Mimoso, da produtora GANA.
'Pretx Chave', música mais recente do Underismo, foi lançada em Fevereiro deste ano e já alcança a marca de mais de 62 mil visualizações em seu videoclipe no YouTube. Segundo os artistas, eles quiseram falar sobre o rompimento das portas e barreiras que a sociedade impõe.
Batalhas de rima
O Underismo já tem "três anos de construção e dois anos 'na pista'", como afirma o idealizador Senpai. A ideia do grupo partiu do jovem de 20 anos que sempre frequentou muitas batalhas de rima em Salvador. "Eu devo muito às batalhas de rap. Conheci primeiro o Ponciano e criamos uma amizade forte. Continuamos batalhando nos eventos até conversarmos sobre a ideia de criar algo nosso, com a nossa estética", contou, lembrando que a ideia do nome "Underismo" partiu de Ponciano, com a junção dos termos "liricismo" e "underground".
Os outros integrantes também se uniram a partir das batalhas de rima. "Foi tudo por batalha, Ponciano e Kolx na Batalha do Cabeça Cara, Trevo na Batalha do São Caetano e Ares na Batalha do Pega-visão na Sussuarana", explicou Senpai. Já Alfa e Moura entraram no grupo por último. O mais jovem entre eles, Alfa, contou, em tom de brincadeira, que foi o "intruso" que pediu para entrar, pois já admirava Senpai das batalhas de rima. "Mostrei minhas letras, falei 'sou bom'", afirmou ele, rindo. Moura, por sua vez, já era conhecido pelos meninos por causa da profissão de DJ. E a partir das amizades, em meio às batalhas de rima e reuniões, tudo se concretizou, segundo eles.
Mas afinal, o que é Underismo?
Durante a entrevista ao Portal A TARDE, cada um dos cinco integrantes que estavam presentes tentou definir o que é 'ser Underismo' com suas próprias palavras, já que se trata de um termo que eles mesmo inventaram. Trevo inicia, falando que, para ele, 'Underismo' é uma coisa continuada, por conta do sufixo "ismo". "É algo que se reflete no estilo de vida, a gente se sente muito representado pela galera que ta no 'underground' trabalhando, vendendo arte, no trabalho informal mesmo. É essa 'parada' de 'underground' como algo continuado... underismo", refletiu.
O trabalho é uma relação de objetivo dos jovens, segundo Ares, é uma forma de fazerem o que acreditam. O DJ Moura destaca que, para ele, é onde transformam em arte as próprias vivências, pessoais e coletivas. Alfa, por sua vez, relatou que o 'Underismo' foi sua identificação de vida, por ter entrado no grupo aos 16 anos, vindo de uma realidade diferente dos outros meninos.
Por fim, o criador do grupo, Senpai, prefere definir 'Underismo' como um movimento. "Eu aprendi com cada um aqui dentro, coisas de vida, de rua, ensinando e aprendendo. São todos professores e alunos que eu levo como família, como formadores e arte e como um movimento... se você tocar em mim aqui e agora, você é 'Underismo'. A gente tenta movimentar Salvador desta forma", finalizou.
No último sábado, os rappers baianos se apresentaram com o grupo ÀTTØØXXÁ (Attooxxa), no Bailaum BLVCKBVNG (Bailão Black Bang), na Praça Tereza Batista, no Pelourinho, mesclando o som do rap com o pagode baiano.
Assista ao vídeo da música 'Pretx Chave':
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