CULTURA
Estréia Meninas, documentário de Sandra Werneck
Por Agencia Estado
O drama social brasileiro tem muitas faces. O documentário Meninas, de Sandra Werneck, apresenta uma delas, a gravidez na adolescência, que vem se tornando cada vez mais freqüente. O filme toma quatro casos e os acompanha, da gravidez ao parto. São quatro moradoras de áreas populares do Rio: Evelin (13 anos), Edilene (14), Luana e Joice (15).
Por que essas garotas engravidam numa idade em que deveriam estar brincando, estudando, no máximo começando os primeiros namoricos? O filme não responde. Deixa que pensemos e tiremos conclusões. Pode ser que se deva à desestruturação do meio familiar. Pode ser que se trate de efeito da erotização precoce. Pode ser apenas subproduto de uma vida que se tornou banal e então um bebê de carne e osso seja apenas uma boneca com a qual alguém se diverte.
O entorno das mães precoces começa logo a aparecer no filme. Uma delas ficou grávida do namorado de 22 anos, que trabalhava no tráfico de drogas na Rocinha e se desligou da atividade. Outra é órfã de pai e vive com a mãe e quatro irmãs em casa. Outra não planejou a gravidez, assim como sua mãe que vive sozinha e não sabia que, em sua idade, ainda podia "pegar filho".
Não há julgamento na maneira como as garotas são apresentadas. Ao contrário, se nota ternura pelas personagens. Uma empatia que talvez impeça o aprofundamento do problema pois, quando têm respeito excessivo pelos personagens, os cineastas ficam com medo de melindrá-los com perguntas embaraçosas. É um limite dos documentaristas brasileiros, o "tabu dos pobres", poucas vezes transposto. O cineasta de classe média sente-se culpado quando filma os "desfavorecidos". Cerca-os de todos os cuidados e, curiosamente, por isso mesmo, recusa-se a entrar em seu mundo. Coloca-os num altar - e os mantêm a distância. Torna-se então possível "reverenciar" o povo, cuidando-se para não cair em nenhum tipo de incorreção política, e por isso os filmes parecem tão estéreis, como se a matéria da vida não tivesse sido tocada. Bem-intencionados, sim, porém particularmente parcimoniosos em relação à tragédia social que dá sentido à vida daqueles personagens. Essa tem sido uma tendência muito comum no documentário brasileiro contemporâneo, humanista mas ainda pouco incisivo, em especial por causa dessa postura "culpada" em relação aos personagens.
Por exemplo, em Meninas gostaríamos de saber mais por que escolheram um caminho que trará sérias conseqüências para suas vidas. E para isso não seria preciso ouvir especialistas, sociólogos, assistentes sociais, que as tratassem como objetos de estudo e pontificassem sobre suas condutas. Nada disso. Bastaria escutar as próprias meninas. Mas, para escutar, é preciso perguntar. E, para fazer as perguntas certas, é preciso não temer as perguntas "erradas", isto é, as inconvenientes, que são as mais importantes.
Dito isso, Meninas revela-se bonito filme, que roça uma realidade brasileira bastante inquietante. Quando os sistemas fechados de explicação faliram, fica difícil encontrar uma explicação unificada para essas coisas. Econômica, social, comportamental? Problema dos tempos? Ignorância? Sabe-se lá. Talvez elas mesmas não saibam. Mas precisariam falar mais a respeito.
Meninas (Br/2006, 71 min.) - Documentário. Dir. Sandra Werneck. Livre. Cine Bombril 2 - 14 h, 16 h, 20 h, 22 h. Unibanco Arteplex 7 - 13 h, 15 h, 17 h, 19 h, 21 h. Cotação: Bom
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