CULTURA
Instituto Inhotim exibe obras do baiano Mestre Didi
Exposição 'Mestre Didi - Os iniciados no mistério não morrem' reverencia a Bahia
Por Eugênio Afonso

No décimo ano da morte do escritor, tradutor, artista plástico e sacerdote afro-brasileiro soteropolitano Deoscóredes Maximiliano dos Santos, mais conhecido como Mestre Didi (1917-2013), ele continua sendo reverenciado Brasil afora. Desde o último dia 27, por exemplo, o púbico que for ao Instituto Inhotim, em Brumadinho (MG), vai poder contemplar a exposição Mestre Didi - “Os iniciados no mistério não morrem”.
Com curadoria do pesquisador e historiador de arte gaúcho Igor Simões, estão expostas cerca de 26 obras (da década de 1960 até os anos 2000) – todas pertencentes à coleção do próprio Inhotim – feitas de fibras do dendezeiro, búzios, contas, sementes, tiras de couro, e relacionadas à atividade de liderança religiosa do mestre baiano no candomblé.
O título da mostra remete a um trecho de uma cantiga entoada durante as cerimônias fúnebres de um Ojé, sacerdote da tradição Egungun. E os trabalhos expostos portam símbolos que remontam às tradições iorubá, às vivências sagradas e à presença feminina na trajetória do artista.
De acordo com Simões, a mostra partiu da vontade de expor a coleção de obras do sacerdote baiano presentes no acervo do Inhotim.
“Ela é uma exposição que mostra Mestre Didi em todas as suas dimensões. Não são obras de devoção, mas trabalhos tridimensionais que dialogam com o ambiente sacro”, conta Igor.
“Mestre Didi não cabe no singular. Ele tem que ser entendido como um intelectual, um guardião da cultura afro-diaspórica”, complementa o curador.
Fonte de vida
Mas não são somente as obras do Mestre Didi que poderão ser visitadas em Inhotim – um dos mais importantes acervos de arte contemporânea do Brasil e considerado o maior museu a céu aberto do mundo. Tem também a exposição A Noite Suspensa ou o que Posso Aprender com o Silêncio, da artista visual e designer paulista Mônica Ventura.
Para a designer, o objetivo da instalação, que tem tutoria de Lucas Menezes, curador assistente do Inhotim, é dar continuidade ao seu posicionamento enquanto artista, mulher e negra de acessar espaços interditados para corpos racializados.
Mônica faz alusão a diferentes práticas religiosas de matrizes ancestrais através de uma instalação, de grandes proporções, toda feita de palha de buriti e com uma abóbada azul.
A base de terra afixada no chão se assemelha a uma Yoni, forma que remete ao feminino e cujo significado, em sânscrito, é “passagem divina, fonte de vida”, ou ainda pode estar relacionado ao órgão sexual da mulher.
“Trago minha investigação sobre culturas e processos construtivos ancestrais dos povos do continente africano, ameríndios e da cultura védica da Índia. Há também uma proposição de movimento onde o observador é convidado a caminhar pela instalação e desvendar as camadas contidas. Tudo está vivo nessa composição, a terra, a palha, os pigmentos naturais, e os símbolos que vibram”, detalha Mônica Ventura.
Com aproximadamente quatro metros de altura por nove de largura, a proposta do trabalho é olhar o entorno e a potência local usando o solo da região na construção da obra. Para se ter uma ideia da dimensão, foram utilizados 12 toneladas de terra e 30 quilos de palha, dentre outros materiais.
Menezes diz que o trabalho de Mônica aborda a questão da ausência de corpos dissidentes não padronizados nos ambientes de fruição cultural. “Mais do que práticas religiosas e fés específicas, ela vai fazer uma amarração própria, uma composição que dialoga com o espaço arquitetônico e traz uma dimensão mágica”, pontua o curador.
“De modo geral, quero deixar a mensagem de envolvimento entre obra e espectador, de consciência ecológica e tecnologias ancestrais”, arremata a artista paulistana.
Galeria Praça
As exposições Mestre Didi - “Os iniciados no mistério não morrem” e A Noite Suspensa ou o que Posso Aprender com o Silêncio fazem parte do programa Abdias Nascimento e o Museu de Arte Negra – inaugurado em dezembro de 2021 –, ocupam o vão central da Galeria Praça, e dialogam com questões da ancestralidade e da religiosidade de povos afro-indígenas.
“A realização e a importância dessas mostras partem do pensamento em torno do legado de Abdias (um dos maiores expoentes da cultura negra no Brasil), que tem sido o eixo norteador dessa programação a partir de temas sobre coletividade, ancestralidade africana, e na valorização da arte e da cultura negras”, explica o jornalista Deri Andrade, curador assistente do Inhotim.
As duas mostras devem permanecer abertas para visitação até o primeiro semestre de 2024 e contam com o patrocínio master da Shell, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura.
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