ENTREVISTA
Lia Afrontosa usa web para abordar temas sensíveis com humor e deboche
Influenciadora visitou sede do Portal para bate-papo sobre diversos assuntos
Por Matheus Calmon

Com um vestido amarelo repleto de nomes de mulheres potentes e relevantes de vários momentos da história, Lidiane Oliveira chegou à sede do Portal A TARDE, acompanhada de sua filha para um bate papo sobre diversos assuntos. O clássico 'Oi, geeeeente', no entanto, marcou presença perto do final da conversa.
Em suas redes sociais, Lia Afrontosa, como se apresenta, aborda, com humor, acidez e uma dose de deboche, absurdos que revelam o lado mais cruel da sociedade, à exemplo do caso de Karine Cervalho Lima, 19, grávida de 7 meses, assassinada brutalmente pelo ex-namorado que não queria ter filho negro.
Na ocasião, ela frisou que o ódio não surge repentinamente, mas é ofertado em pequenos gestos passados de geração em geração "como uma herança maldita".
"Lia Afrontosa, a Lidiane Oliveira, é essa mulher preta, publicitária, influencer, que nasceu se comunicando, nasceu para a comunicação e que usa as redes sociais para a troca, para ampliar diálogos e para se posicionar", contou.

Antes de ser 'Lia Afrontosa', Lidiane tinha um perfil intitulado "Humanas Coletivo". Após recomendação de uma amiga jornalista, alterou a apresentação.
"E aí eu pensei na Lia Afrontosa. Li de Lidiane e Afrontosa porque é realmente uma afronta, uma mulher preta, gorda, baiana, se denominar, se apresentar como influencer digital".
Ela pontua que as pautas que aborda são as pautas que, de alguma forma, permeiam sua vida. "Tudo o que diz respeito ao negro, tudo o que diz respeito à mulher, tudo o que diz respeito aos grupos minorizados me atingem, nem sempre diretamente, mas me atinge de alguma forma".
"O humor é uma ferramenta de educação, é uma ferramenta de transformação, o fazer rir também faz pensar, também faz refletir e eu me encontrei nesse caminho".
Para equilibrar o humor com a seriedade necessária para as pautas e assuntos sensíveis, ela aposta na própria sagacidade.
"Quando você trata desses temas com humor a resposta do público é imediata e ela é surpreendente, porque não se espera se usar humor para se falar de temas tão pesados. Então, assim, bom senso... nunca vai agradar todo mundo, mas eu acredito no bom senso, em você ser uma pessoa educada e que tente não ofender ninguém ou ofender quem apenas você queira ofender".
Apesar da importância e necessidade do seu trabalho na web, Lia lembra que enfrentou dificuldades para encontrar seu espaço nas redes sociais. Questionada se encontrou as portas abertas, ela dá uma sincera risada reflexiva.
"Portas abertas... portas abertas é um sonho, nunca encontrei. A gente vai de voadora, mesmo, arrombando e chegando. É um mercado muito difícil de se adentrar. É fácil você produzir conteúdo, mas monetizar é extremamente difícil e Salvador é mais difícil ainda, eu acho que se eu tivesse em um estado do sudeste, talvez Rio, São Paulo, nesse eixo, eu achasse uma facilidade maior, mas eu costumo brincar que Salvador é uma panela que ninguém tira a tampa para acrescentar novos temperos".
Ela segue, afirmando que segue tentando, forçando, se impondo e tentando fugir da invisibilidade diária que lhe é imposta. "A gente luta contra essa invisibilidade, é luta contra o tempo inteiro, é, bem difícil".
Com a definição de que fora de Salvador o mundo, possivelmente, seja melhor, ela conta que há, sim, possibilidade de deixar a capital baiana.
"Pensar a gente pensa, porque acredito que já está intrínseco aqui, nós temos essa cultura de só valorizar o que é nosso depois que ele sai e volta. Depois que ele vai para esse eixo Rio-São Paulo, faz sucesso lá fora, e volta, aí a gente passa a respeitar, as portas passam a se abrir com mais facilidade. Então, surgindo uma oportunidade que caiba marido e filhas, tô dentro".
Lia conta que é o tipo de pessoa que prefere não fazer planos, mas ir vivendo dia após dia. "Eu sou movida à paixão, o que me move ali naquele momento. Não faço grandes planos, não, porque aqui a gente é passageiro e não sabe a hora que a gente vai partir. Então, eu não planejo a longo prazo, nem a médio prazo. Por enquanto eu gosto de estar aqui nesse lugar".
Com o destaque conquistado após anos de trabalho, ela revela uma tática para devolver os pés ao chão sempre que é elogiada e diz que, caso se considere necessária, estaria em um lugar desconfortável.
"Sempre que eu faço um trabalho e que recebo muitos elogios, eu faço questão de lavar meu banheiro para baixar meu ego, lavar meus pratos, arear minha panela, para o ego dar uma abaixada, porque todos nós somos necessários".
Em meio a toda atividade, Lia ainda encontra tempo para apresentar o telejornal 'Oxente Caraca', em parceria com o influenciador Adalberto Neto, a quem considera um presente da pandemia.
Na ocasião, em meio às lives constantes, foi impactada pelo conteúdo do carioca, o convidou a uma live e a amizade surgiu.
"Dali nasceu uma amizade, uma sincronia, a gente combina muito, nós temos um raciocínio muito parecido, um humor ácido, muito parecido também. E aí surgiu a ideia de criar o 'Oxente, Caraca', que é um produto fictício, jornalístico, onde nós comentamos todas as notícias da semana, toda semana a gente grava e a comenta os assuntos principais. E é um jornal totalmente parcial, tendencioso. E a gente gosta de deixar isso bem escuro, para que não reste dúvidas".
Confira uma das edições
Lia reflete que a comunidade negra pode se fortalecer e se unir, inicialmente, consumindo as produções da própria comunidade.
"A gente comprar dos nossos, consumir a cultura dos nossos, os produtos, os serviços dos nossos, isso é muito importante, já que nós somos maioria quantitativa e qualitativa também. É um viés da união necessária, muito importante".
Lia pontua que seu trabalho nas redes sociais já lhe rendeu diversos momentos marcantes, à exemplo da possibilidade de conhecer artistas, como o ator Nando Cunha e o cantor Péricles.
No entanto, o que ela prefere mesmo é o contato com as pessoas que não têm tanta visibilidade. "esse contato com os meus seguidores diário é o que me fortalece. Eu digo que eles me salvam todos os dias e é verdade. Às vezes eu posto algo e alguém fala assim 'eu precisava ouvir isso', 'eu estava precisando dessas palavras'. Isso me traz uma alegria, gratidão, eu digo 'poxa, cumpri'. Se tirou um sorriso ou se a mensagem chegou naquela pessoa e ajudou de alguma forma, para mim, valeu".
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