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LITERATURA

Sobrinho de Jorge Amado lança livro de memórias sobre o tio

Roberto Amado revela que a obra não foi um ato voluntário, mas uma encomenda feita em 2015

Por Júlia Lobo*

01/02/2022 - 6:02 h

Imagine você, uma pessoa entusiasta da literatura brasileira, indo até o próprio quarto para buscar alguma coisa e se depara com ninguém mais, ninguém menos do que o casal Jorge Amado e Zélia Gattai fazendo a revisão da versão original de Dona Flor e Seus Dois Maridos. Consegue imaginar?

Esta não é só uma fantasia, mas a realidade do sobrinho do célebre autor baiano, Roberto Amado, quando ainda nem havia chegado aos dez anos de idade. Hoje, aos 66, o filho de Joelson, o irmão do meio, traz no novo livro Jorge Amado, meu tio (Editora Ibrasa, 320 páginas, R$ 85), memórias dos mais de 40 anos vividos ao lado do escritor, que faleceu em 2001.

Ao longo dos 20 capítulos são narrados os ‘causos’ em dias de lançamento de obras, as histórias de cada integrante da família, o exílio de Jorge e até as celebridades que batiam à porta da Casa do Rio Vermelho para uma prosa com Jorge, como Dorival Caymmi.

Lançado em dezembro do ano passado, Roberto revela que a obra sobre suas memórias do tio não foi um ato voluntário, mas uma encomenda feita em 2015, quando ainda trabalhava como editor de um site da Editora Abril.

“Uma amiga me apresentou a um português, o Fernando, que era dono de uma editora em Portugal e tinha um projeto internacional de literatura incrível. Ele me pediu esse livro sobre o tio Jorge e disse ‘escreva vinte capítulos de vinte páginas cada um’, fiquei até um pouco mexido, mas ele era um cara elegante, sabe?”, conta.

O sobrinho, que já tinha mais de 30 anos atuando como jornalista e seis livros publicados, entre romances, reportagens e infanto-juvenil, decidiu aceitar o pedido. O livro ficou pronto no ano seguinte, no entanto, devido a problemas nos negócios do português, não foi publicado. Desanimado com a notícia, Roberto não poderia imaginar que o episódio teria um resultado positivo no futuro.

No meio tempo, até a publicação em 2021, ele iniciou o mestrado em Letras em 2018 na Universidade de São Paulo (USP). O tema da dissertação foi o protagonismo dos escritos de Jorge Amado no Romance de 30, movimento literário com foco nas desigualdades da época, entre 1930 e 1945. O autor utilizou da própria vivência, do conhecimento literário aprendido com a família e do acervo pessoal, com artigos do próprio Jorge, para compor o trabalho.

Quando a editora Ibrasa, que já havia publicado outro livro dele, demonstrou interesse na publicação de Jorge Amado, meu tio, a pesquisa serviu para acrescentar novos pontos de vistas sobre as lembranças do desenvolvimento da carreira do escritor baiano.

“Ela revela coisas que normalmente não são estudadas, o movimento não era estudado em si, mas a partir dos autores, e mesmo Jorge Amado, ele não é muito estudado, era mais o Graciliano Ramos, a Rachel de Queiroz. Isso por certo preconceito contra ele que vem por vários motivos, um deles é porque o tio Jorge era tido como comercial”, explica Roberto.

Outra causa, e que ele concorda em parte, era a ideologia política do escritor, que chegou a ser deputado federal no Rio de Janeiro, em 1945, pelo Partido Comunista Brasileiro. O sobrinho traz no livro que foi a época em que mais dedicou à militância que suas obras tiveram certo declínio. Não só ele, mas o próprio Jorge e família concordavam, particularmente em relação à Subterrâneos da Liberdade, escrito durante o exílio na Tchecoslováquia.

Roberto só não concorda totalmente porque acredita que o desprezo dos críticos literários pelo viés ideológico e a linguagem por muitas vezes carregada de informalidade e ‘palavrões’ não passa de um julgamento “péssimo, uma miopia horrorosa”. Foi desta maneira que Jorge encantou o mundo inteiro com as histórias de Dona Flor e Gabriela.

É de família

O autor também não tem receio de dizer que Jorge Amado não é o seu favorito.

“Hoje eu posso dizer que é o Guimarães Rosa. Mas isso também é de uma época, quando eu estava começando a escrever, ler, lá pelos 18 anos, e estava muito metido (risos). Falava que o tio Jorge repetia muitos temas, tinha uma abordagem limitada”, recorda. Mais tarde, ele viria a reconhecer que esse era o verdadeiro talento do menino grapiúna.

No entanto, foi o tio Jorge que, como ele afirma, o ajudou a entender a si mesmo. Ao ler Capitães da Areia, quando ainda nem chegava aos 12, se deu conta da paixão que nutria pela literatura. Não foi a profissão desempenhada diante da pequena pressão de ter um pai e irmão médicos, mas deu o incentivo necessário para desistir da Biologia e ingressar no jornalismo.

Segundo Roberto, a família Amado como um todo era ligada à literatura. Seu pai Joelson era um leitor assíduo de poesias e o tio James, o mais novo, também foi um escritor de peso, sendo membro da Academia de Letras da Bahia por 23 anos. Porém, Fanny Rechulski, sua mãe, quem fez despertar o interesse pela leitura.

“Ela quem me indicava os livros desde os oito anos de idade. Ela mesma dizia ‘esse livro aqui é uma droga, não leia esse livro’. Foi assim com Subterrâneos da Liberdade, me disse para não perder tempo com ele”, relembra.

Fanny era paulista, judia, comunista, poliglota, cientista social e atuou como fonoaudióloga. Ela conheceu o marido, Joelson, quando trabalhava como secretária de Jorge durante os compromissos políticos.

Assim, seja para um papo entre escritor e futuro aspirante, sobre as namoradas – principalmente – e até mesmo ser responsável pela sua vida com a junção dos pais, o tio Jorge estava presente.

(Mais moço, eu) “Falava que o tio Jorge repetia muitos temas, tinha  abordagem limitada”
Roberto Amado, jornalista e escritor
(Mais moço, eu) “Falava que o tio Jorge repetia muitos temas, tinha abordagem limitada” Roberto Amado, jornalista e escritor | Foto: Arquivo Nacional | Wikimedia Commons

Amor dos Amados

Essas e outras memórias, desde o lançamento de Dona Flor e Seus Dois Maridos (1966) até a gradual perda de visão de Jorge Amado em seus 80 e poucos anos – mesma degeneração na retina que acometeu o irmão Joelson com 40 –, são compartilhadas no livro.

Também são incluídas fotos inéditas no decorrer dos capítulos.

Logo no início, Roberto deixa claro que Jorge Amado, meu tio não é uma biografia, mas “uma história que me pertence e foi materializada nesta obra”.

Em suas mais de 300 páginas é possível perceber a família afetuosa e companheira que era, erguida pela saída de Vô João do Sergipe atrás das terras férteis do cacau, em Ilhéus. Ali ele conheceu Eulália Leal, a destemida Vó Lalu.

O autor ainda sinaliza a confusão na memória que a união entre eles pode ter causado. Em um trecho do livro, Roberto conta sobre uma das inúmeras brincadeiras do tio, quando o teria subornado para dizer uma frase, repetidamente, à Tia Zélia.

“Estávamos lá na casa do Rio Vermelho e cheguei nela para falar ‘velha, decrépita, centenária, velha, decrépita, centenária’, várias vezes. Quando fui pedir ajuda do meu irmão André com algumas lembranças, ele me disse que isso aconteceu com Paloma, nossa prima, filha do tio Jorge, então pode ser que eu tenha roubado a memória dela, mas juro que foi gentilmente, por um momento achei que tinha vivido aquilo”, diz, aos risos.

*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.

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