GASTRONOMIA
Cardápio dos baianos guarda conexões com comida de Oxóssi
Por Daniela Castro

Para os católicos, 23 de abril é dia de louvar São Jorge, santo imortalizado na lenda em que mata o dragão e que se popularizou também fora dos domínios da igreja.
Faz parte do imaginário popular e volta e meia é visto em letras de música, estampas de roupa e até no futebol - o santo guerreiro é padroeiro do Corinthians paulista.
Mas a fé em São Jorge não tem uma única face. Nas religiões de matriz africana, o santo é frequentemente associado a Ogum, especialmente no sudeste e sul do Brasil.
Na Bahia, porém, este posto do sincretismo religioso é reinado de Oxóssi. Diga-se de passagem, além da data, quinta-feira é o dia da semana dedicado à sua figura.
Senhor do milho
Trata-se do "senhor de Ketu, senhor da fartura, o grande caçador, provedor das famílias, corajoso, desbravador e grande amante".
Quem explica é Elmo Alves que, além de filho de santo, é chef de cozinha. Tem mais um detalhe: hoje também é aniversário dele.
Ele junta referências da religião e da profissão para nos lembrar que santo também come. "Aqui no Brasil, na re-significação do candomblé, existe a adesão do milho como elemento primordial do culto a Oxóssi", destaca Alves.
Independentemente da orientação religiosa, passam pela mesa do baiano alimentos que podem revelar alguma conexão com as comidas preferidas do orixá.
Comida votiva
O lelê é um exemplo. Feito à base de milho, com leite de côco e aroma de cravo e canela, a iguaria figura na nossa cultura alimentar como um bom acompanhamento para o café da manhã ou a merenda da tarde.
Nas festas juninas, que não tardam a chegar, o lelê também costuma ter espaço garantido no banquete dedicado a outro santo, o João, com outras receitas criadas a partir do milho.
Mas voltemos ao terreiro. O lelê guarda semelhanças com o axoxô, comida votiva de Oxóssi. Este, resultado de um processo que exige tempo e ritual.
"O milho é colocado de molho vários dias, cozido e escorrido. Acompanha tiras de côco e melaço de cana ou açúcar", descreve o chef.
Elmo Alves, que preparou as duas receitas exclusivamente para nós, na cozinha do restaurante-escola Senac (Pelourinho), lembra que é preciso estar atendo a um detalhe na cozinha sagrada. "Oxóssi tem quizila com mel", avisa. Traduzindo, o santo não se dá bem com o ingrediente.
Oxóssi também faz gosto pelo inhame. Entram na oferenda ao orixá também alimentos como o feijão fradinho, que é torrado depois de deixado de molho e bem escorrido.
Além de comestíveis, os grãos podem virar um amuleto ao serem carregados na bolsa ou na carteira. Diz o preceito do candomblé que esse ritual garante a fartura que o orixá representa.
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