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CRÔNICA

Fernando, o crítico

Minha relação com Fernando Pessoa é antiga e íntima

Por Clara Cerqueira*

26/11/2023 - 12:00 h
Leia a crônica deste domingo
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Hoje pela manhã fiz meu café preto de costume e fui procurar minha leitura matinal, hábito que venho desenvolvendo com o objetivo de cultivar felicidade. Depois de um tempo de pesquisa, acabei chegando aos textos de Fernando Pessoa.

Minha relação com Fernando é antiga e íntima. Nós nos conhecemos através de minha avó materna, que me deixou uma coletânea completa de seus poemas em capa de couro e papel bíblia que, coitada, de tanto ser folheada, perdeu a lombada. Comecei minhas leituras na mais tenra idade e descobri com o poeta lusitano o poder do belo. Quando o peso do mundo parece insustentável, quando nada mais faz sentido, a poesia e a arte são as únicas capazes de nos mover e nos trazer esperança. Esse foi o primeiro de seus ensinamentos.

Quando precisei decidir o que faria da vida, lá estava ele, grande conselheiro. Prestei vestibular para Letras, tendo como única certeza o meu amor pela leitura e o meu amor por Pessoa. Não me arrependo nem um segundo. Não que minha relação com a academia tenha sido fácil, não foi, mas Fernando, Alberto, Ricardo, Bernardo e Álvaro estavam lá, sempre prontos a me confortar, e eu conhecia bem o poeta e seus heterônimos.

Durante minha interminável estadia na França, a coletânea de poemas me trazia de volta para casa. Graças a ela, tive forças para concluir o mestrado em tradução literária que quase me destruiu a alma. Inclusive, depois de aprovada com louvor, já na volta, o destino me levou a Lisboa. Quando senti o cheiro do Rio Tejo foi como se estivesse sentindo o cheiro do Mar da Ribeira e, em poucos segundos, as muitas horas que me separavam de Salvador desapareceram. Fernando me recebia em sua casa e mais uma vez me trazia calma.

Eis que neste semestre voltei para o curso de Letras como aluna especial do doutorado. Levei anos para tomar essa decisão, mas cá estou eu de volta à academia, gata escaldada morrendo de medo da água fria. Estou cursando uma disciplina sobre literatura moderna e contemporânea, cuja ementa propõe investigar principalmente o conceito de arte e literatura em nosso tempo. Muitos são os questionamentos em torno do tema e poucas são as respostas claras, mas uma coisa me parecia certa: grande parte dos críticos têm horror a um tipo de arte e/ou literatura ditas utilitárias, com métodos e fins outros que não a própria arte.

E eis que Fernando resolveu opinar. Eu juro que não estava procurando nada relacionado ao tema, só estava lendo poesia mesmo, mas meu companheiro de vida decidiu fazer parte da discussão e faço questão de citá-lo: “Só a Arte é útil. Crenças, exércitos, impérios, atitudes – tudo isso passa. Só a arte fica, por isso só a arte vê-se, porque dura”. Admito que fiquei meio chocada com a afirmação “Só a Arte é útil”. Logo agora que eu estava começando a achar que tinha encontrado o fio da meada, ele me vem com uma dessas! Como interpretar isso? E não pára por aí, ele discorre sobre o fazer artístico e cita grito e carta como exemplos de canto e literatura. Uma opinião mais contemporânea que essa, eu não conheço.

Pela primeira vez na vida, recebi dele um enigma e não uma resposta. Fernando, o crítico literário, tá aí uma faceta que eu desconhecia. Vou precisar da ajuda dos universitários. Só minha professora, sábia e generosa como ela é, será capaz de me ajudar a entender melhor esse amigo tão querido e tão volúvel.

*Escritora

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