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MAM exibe exposição Casa de Mulheres 2024

exposição explora diversas perspectivas sobre o lugar social da mulher

Por Priscila Miraz*

03/03/2024 - 16:00 h
Entrada principal do casarão do museu

Foto: Olga Leiria / Ag. A Tarde

Data: 29/04/2022
Entrada principal do casarão do museu Foto: Olga Leiria / Ag. A Tarde Data: 29/04/2022 -

Com participação de 51 artistas do Brasil e do exterior, a exposição Casa de Mulheres 2024 está aberta para visitação no segundo andar do casarão do Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM-BA), até 31 de março. Com curadoria de Alejandra Muñoz e Neyde Lantyer, a exposição se vincula ao Seminário Protagonismos Femininos nas Artes, Arquitetura e Design, realizado entre 24 e 26 de janeiro, promovido pela Escola de Belas Artes e Faculdade de Arquitetura da Ufba.

A proposta da exposição explora diversas perspectivas sobre o lugar social da mulher, presentes em poéticas diversas que partem, por exemplo, de arquivos particulares, explorando as relações familiares e as experiências de vida, como em Jardim de inverno (2023), de Rosa Bunchaft (BA), instalação fotográfica sobre o retrato de família como tradição e o uso da cianotipia na botânica como metáfora do cultivo cotidiano das relações; do uso de arquivos institucionais, jornais e leis como em Casa 3 (2023) de Ines Linke (BA), sobre o sucateamento da moradia das estudantes da Ufba; de cidades e de rios que atravessam as histórias familiares, como em A história das secas é sobre a água (2020-23), de Cibele Bonfim (BA/CE); propostas de coletivos artísticos que intervêm na paisagem urbana como o Coletivo Pixa Mina, que estabelece aproximação com o próprio entorno do MAM-BA; que mobilizam a relação entre a produção artística e os artesanatos como a instalação de Maria Luedy e do Coletivo Quilombo (BA), Casula (2017); ou performances com trocas de histórias de vida e retratos, como em Desenho por saber (2023), de Gaby Ela (BA).

Podemos estabelecer um exercício de percepção do particular ao coletivo, tratando de como processos de construção de subjetividades femininas no mundo contemporâneo produzem discursos na cultura que são espaços valiosos de compreensão da atualidade como, por exemplo, abordar a invisibilidade da mulher artista imigrante, proposta de Neyde Lantyer na instalação Anônimo era uma mulher artista (2021). Lantyer, que vive e atua em Amsterdã há 26 anos, traz a dimensão internacional da mesma problemática. Sua pesquisa sobre mulheres artistas migrantes investiga o mundo da arte eurocêntrico, onde o cenário é também de profunda desigualdade de gêneros e desvantagens para as mulheres artistas em geral, e não apenas para as estrangeiras. Articulando o seminário e a exposição, o projeto de Muñoz e Lantyer nasce da interseção dessas duas pesquisas. A perspectiva feminista da exposição é bastante clara.

Por esse viés muito bem delineado, a exposição se distancia criticamente de qualquer visão única, essencialista ou biologizante do que é ser mulher e mulher artista no mundo contemporâneo: as pautas atuais dos movimentos feministas e sociais, da decolonialidade, estão postas, e como afirma Luana Saturnino em seu livro Dramatização dos corpos, “pensando politicamente, é cada vez mais urgente um conhecimento situado e incorporado que deixe de lado os pseudo-universalismos e uma visão falocêntrica do mundo”.

Casa de Mulheres 2024 demandou extensa pesquisa histórica sobre as problematizações que foram colocadas pelas feministas na segunda metade do século 20, estabelecendo vínculo com o legado de mulheres artistas, historiadoras e críticas que apontaram as estratégias de poder e de saber que a história da arte utilizou e utiliza para justificar exclusões por marcadores sociais como raça e classe, que atravessam as questões de gênero, demostrando o papel estruturante que essas desvalorizações e apagamentos têm na formação da própria história da arte.

Já no título é apresentada essa vinculação: Casa de Mulheres 2024 é uma homenagem à Womanhouse, considerada a primeira exposição feminista da história, que aconteceu em 1972, em Los Angeles, organizada por Judy Chicago e Miriam Shapiro. Outro marco da discussão feminista na arte, também presente na exposição, é o artigo de Linda Noclin, Por que não existiram grandes artistas mulheres?, só traduzido para o português no século 21, já que as discussões sobre arte feminista no Brasil tardaram a chegar, o que não quer dizer que não tivemos aqui, desde 1960, produções importantes sobre o lugar social das mulheres, como foi demonstrado no trabalho fundamental de Cecilia Fajardo-Hill e Andrea Giunta, Mulheres radicais: arte latino-americana, 1960–1985.

Abrir arquivos nesse contexto é fundamental e foi o que Alejandra Muñoz fez para escrever em 2020 o artigo Fissuras: as artistas e os museus, apresentando a disparidade da presença de artistas mulheres e homens nos museus de Salvador. No caso do MAM-BA, museu que hoje recebe Casa de Mulheres 2024, Muñoz encontrou que o “MAM-BA conta com 1.345 obras e previsão de mais 83 peças até o final de 2022. […] Do total da coleção, apenas 358 obras são de artistas mulheres. E, apesar da previsão de se agregarem mais 17 obras de mulheres até o final de 2022, o legado de Lina Bo Bardi parece estancado em 26% do acervo de autoras femininas até o próximo ano”.

Outro dado importante para a historiografia da arte levantado por Muñoz nesse artigo e presente na exposição é a realização, entre 17 de maio e 2 de junho de 1969, da 1ª Exposição Feminina de Arte na Bahia, no Foyer do Teatro Castro Alves, reunindo mais de 30 artistas baianas vinculadas à Escola de Belas Artes, ou seja, três anos antes da Womenhouse. Não foi uma exposição que mobilizou questões claramente feministas, como é o caso da estadunidense, mas é uma iniciativa que ao propor esse recorte está mobilizando as dinâmicas de seu momento histórico. Uma das participantes dessa primeira exposição, Marlene Cardoso, tem uma obra exposta em Casa de Mulheres 2024, Sem título (1969). É extremamente significativa essa representação histórica no contexto da história da arte baiana.

Em Mulheres radicais as autoras trazem um ponto central para pensarmos as produções de artistas mulheres, também presente em Casa de Mulheres 2024: a noção de corpo político. As necessidades contemporâneas modificaram maneiras de pensar e representar o corpo, mas podemos afirmar que ele continua com a importância conceitual de corpo político. Em Pelos pés que se ama (2022), Patrícia Paixão (BA) cria um painel de fotografias de pés impressas em lençol, remetendo à frase de um agressor: os pés nos lençóis remetem a sentimentos ambíguos com relação ao amor e a violência. Um corpo inteiro, um corpo sem cabeça, um pé, esculturas em cimento envoltas em sisal, de Jasi Pereira, na instalação As cores do silêncio V, I, VII (2023), redimensiona o corpo pela fragmentação, mas também pelo uso dos materiais.

É bastante expressiva a presença de arte têxtil: Nita Monteiro (RJ) na instalação Metamorfose (2022-23), utilizou diversos tecidos criando uma narrativa das transformações da vida entremeada às transformações do céu e da terra. Logo abaixo, o trabalho de Alzira Fonseca (BA), O intraduzível risco de sonhar (2023), tristemente danificada depois de aberta a exposição, é uma instalação com carvão, pastel seco e biscoito cerâmico sobre terra que se relaciona com a primeira aproximando a vida do onírico, assim como O sonho é do sonhador (2022), desenho bordado sobre tela de Milena Oliveira, que explora o ato de sonhar e a importância que os ancestrais atribuem a eles.

Se a proposta de Muñoz e Lantyer teve aderência entusiasmada de artistas e pesquisadoras, é necessário dizer que encontrou outra proximidade histórica com propostas anteriores: o problema da desestrutura e falta de apoio financeiro para a execução por parte de instituições de apoio às artes e à cultura. Entretanto, um ponto relevante para as mesmas é a solidariedade da própria diretora do MAM, Marilia Gil, que cedeu espaço ao projeto no museu e tem sido diligente na resolução dos problemas que o projeto tem enfrentado.

Salientamos o quanto uma exposição de mulheres artistas bem fundamentada como é Casa de Mulheres 2024 contribui para apontar as barreiras que ainda existem para essas propostas, e principalmente visibilizar artistas de relevância na arte contemporânea. Como as curadoras disseram em conversa, “apesar dos avanços dos protagonismos e méritos das artistas mulheres, a produção feminina ainda está sub-representada e não é levada a sério”.

* Doutora em História Cultura e professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia ([email protected])

*O conteúdo assinado e publicado na coluna Olhares não expressa necessariamente a opinião de A TARDE

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