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ABRE ASPAS

"Nossa comunidade é uma comunidade diversa"

Confira entrevista com Rafael de Lucena Pedral, Coordenador estadual de Turismo LGBTQIAP

Por Vinícius Marques

16/04/2023 - 6:09 h
Rafael Pedral, coordenador de ações no turismo LGBTQIAP+, da Secretaria de Turismo do Eatado
Rafael Pedral, coordenador de ações no turismo LGBTQIAP+, da Secretaria de Turismo do Eatado -

Há quase um mês, a Secretaria de Turismo do Estado (Setur-BA) nomeou Rafael de Lucena Pedral, artista que interpreta a drag queen Petra Perón, eleita Miss Salvador Gay, Miss Bahia Gay e Miss Brasil Gay, na Coordenação de Regionalização com o objetivo de coordenar a Política Estadual de Turismo LGBTQIAP+. Rafael também tem uma longa trajetória de ativismo pelos Direitos Humanos e Movimento LGBTQIAP+. O artista já foi secretário de juventude da ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos) e representante LGBTI+ no Conselho Nacional de Juventude, além de um dos articuladores do Fórum LGBTI+ da Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA).

Nesta entrevista, ele conta sobre o que pretende fazer à frente da coordenação, o fato de ser uma drag queen numa secretaria estadual e os problemas que a comunidade LGBTQIAP+ enfrenta na Bahia.

Como começou seu trabalho de militância e sua entrada na política?

Começou de forma organizada quando entrei na universidade, no curso de História, na Universidade Federal da Bahia (Ufba), e fui atrás do Centro Acadêmico de História. Comecei a me organizar, encontrar pessoas que são militantes, que se movimentam em diversas pautas. Depois entrei no Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Ufba, então, esse processo de conexão com os movimentos foi se ampliando. Em 2007, também me filiei ao Partido dos Trabalhadores (PT), e de lá para cá fui conhecendo esse movimento, com o qual mais me identifico e me insiro, que é o movimento LGBT.

Pode explicar o que é o turismo LGBTQIAP+?

O turismo LGBTQIAP+ é um segmento turístico, mas também se confunde com a população, com a comunidade. É tudo aquilo que envolve eventos, serviços, produtos destinados no campo do turismo para a nossa população. A nossa comunidade vem sendo violentada muito fortemente, com negação de direitos. Além de violação de direitos, o Brasil é o país que mais violenta LGBTs, que mais assassina a população trans, e isso sempre colocou essa população à margem em diversos lugares.

Mas nos últimos períodos tem havido um crescimento muito forte, sobretudo com as conquistas de direitos como a adoção, a união estável, mais recentemente a equiparação à lei de racismo do crime de homofobia pelo Supremo Tribunal Federal (STF), os nomes sociais das pessoas trans na gestão pública, no título de eleitor... São várias conquistas que nos posicionam como pessoas com direitos e consumidores, então, o mercado tem se voltado muito para isso, tanto é que tem um termo mais comumente utilizado que é o Pink Money, o dinheiro rosa, por setores do empresariado e dos serviços públicos que estão mais atentos ao nosso segmento.

Mas, de forma geral, é um turismo que, às vezes, até se confunde com turismo de luxo, é um segmento muito exigente, exatamente por serem pessoas estigmatizadas, com histórico de violências de direitos, são pessoas muito politizadas, com sabedoria dos seus direitos. São pessoas que, como a gente brinca, não têm herdeiros, ou têm poucos filhos, ou têm poucas relações de união estável, então, são pessoas que viajam muito, de forma geral buscam experiências até para também fugir da dinâmica violenta ou dificultosa. O turismo é uma das promessas dos próximos anos, vem crescendo muito forte no mundo e no Brasil, e o Nordeste, como tem sido carro-chefe do turismo brasileiro, também tem crescido bastante. Na Bahia, não é diferente.

Quais ações a coordenação de turismo LGBTQIAP+ pretende desempenhar?

Temos uma coordenação recente, inclusive é inédita no Brasil, então precisamos inicialmente produzir indicadores, fazer perguntas para o mercado, para os turistas. Vamos começar neste mês o mapeamento da cadeia produtiva, sobretudo o sistema hoteleiro, de transportes, agências de turismo, bares, restaurante e afins, para fazer certas perguntas sobre o turismo, se eles entendem a dinâmica do Gay Friendly, da hospitalidade, se eles tem colaboradores LGBTQIAP+, se eles trabalham com esse público específico, se eles estão antenados às questões de violação de direitos, e se caso acontecer como eles vão proceder, se eles demandam qualificação, porque aqui a gente também vai produzir qualificação. Esse é o primeiro momento que nós estamos fazendo aqui, arrumando a casa, procurando entender esse mapa da nossa cadeia produtiva, e também saber o tamanho dos desafios.

No segundo momento, que já é paralelo também, é a estreia do nosso módulo de qualificação para acolhimento dos turistas LGBTs. Vamos fazer uma série de qualificações em todas as três zonas turísticas do nosso estado, exatamente para sensibilizar a cadeia produtiva, mas também qualificá-las e, consequentemente, garantir que a Bahia tenha um serviço de qualidade para com os turistas. O turismo no Brasil é um muito forte, é um setor que entrega muito, que gera muita renda, então, se a gente está lidando com um segmento específico, nada mais justo do que esse próprio segmento seja beneficiado.

Para além dos turistas que aqui venham, sejam bem acolhidos, tenham ótimas experiências e que possam voltar outras vezes, mas também que os LGBTQIAP+ da nossa comunidade baiana também tenham um posicionamento no mercado de trabalho, que possam também monetizar no processo, é uma cadeia que se autoajuda. Vai ser um processo de acúmulo que nós vamos perseguir. E também aí o terceiro eixo, que é o mais forte, que a Bahia sempre fez, que é o da promoção. Nós temos a locação histórica, regional, e para esse segmento também a Secretaria de Turismo, a Bahia, sempre fez muitos postos de trabalho, inclusive a Setur.

Antes da coordenação, já era afiliada à Câmara de Comércio e Turismo LGBT, e também a IGLTA (Associação Internacional de Viagens LGBTQ+, em português), mas agora vamos ter mais presença em congressos, em grandes eventos nacionais e internacionais, fazer campanha publicitárias também para o acolhimento. Acho que o turismo LGBT é um turismo, como eu falei, muito politizado, sabe seus direitos, então, só vai onde tem algum nível de segurança ou que o campo dos Direitos Humanos seja algo aplicado na prática. Esses são os principais trabalhos que nós estamos aqui desenvolvendo.

Para você, o que significa e qual a importância de interpretar uma drag queen e estar neste cargo dentro de uma secretaria estadual?

Eu acho ótimo. Essa coisa do ineditismo é bom, que bom que estamos avançando, são processos de acúmulo, de outras pessoas que vieram antes de nós e que lutaram, perseguiram para que minha geração e as que estão por vir ocupem espaços de poder, de mudar uma sociedade, mas também o ineditismo tem a ver com o processo de apresamento de algum nível de dívida histórica. Estou aqui mais empolgado com os processos que eu posso fazer, o que eu posso contribuir, e minha persona drag acho que ajuda bastante em abrir canais de diálogo, falar com as pessoas.

É uma arte genuína da nossa comunidade, então, coloca num lugar mais propositivo e positivo a minha participação no governo, e se eu não me engano, além de mim, outras drag queens já estão sendo nomeadas. Acho que fui a primeira, mas já tem outras em outras secretarias também, então, é um grande papel, um grande avanço para que essas políticas públicas sejam implementadas, executadas pelas pessoas da comunidade. Vejo com muito bom agrado, estou empolgado com o desafio e acredito que vamos fazer um bom trabalho.

Empresas privadas de turismo têm dado uma atenção reforçada para o tema, isso porque segundo dados da IGLTA, um turista deste nicho gasta, em média, três vezes mais em viagens do que heterossexuais. Como vocês pretendem dialogar com esse setor?

Nossa comunidade, é bom reforçar, é uma comunidade diversa, cada letrinha da sigla representa identidades ou orientações sexuais diversas e com seus atravessamentos, sejam de raça, classe e de gênero. Esses dados, de forma geral, às vezes colocam todo mundo na mesma caixinha, mas não são. Esses dados são reais, mas correspondem, sobretudo, à população Gay, que de forma geral tem um poder aquisitivo mais alto, um grande grau de escolaridade, de politização e que não tem um parceiro ou filhos. Mas nessa mesma comunidade, a gente tem uma outra população, que é a população Trans, que no Brasil 90% dela está na prostituição, por não ter outra renda ou outra forma de trabalho, então, é bom a gente sempre botar uma lupa sobre essas diferenças na nossa comunidade e não cair nesses blocos.

A gente precisa trabalhar também de forma diferente para a nossa comunidade. Temos que entender que é esse público que vem para a Bahia, os principais estados emissores, esses indicadores que vão fazer as pesquisas tanto para o mercado. Isso vai fornecer elementos importantes. Mas os próprios movimentos sociais têm um acúmulo de dados com relação a isso, como a Antra, que é a Articulação Nacional de Travestis e Transexuais, eles produzem dados anuais, relatórios anuais sobre violência e negação de direitos da população trans e travesti.

Para essa população, o trabalho da gente vai ser de garantir muito mais que elas adentrem o mercado de trabalho desse turismo LGBT. São trabalhos de uma mesma coordenação, de uma mesma linha política, mas que vão exigir de nós sensibilidade e ações diferenciadas para alcançarmos um crescimento da comunidade de forma geral, acessos de direitos, e o fundamental: promover o turismo, que as pessoas venham para a nossa Bahia, permaneçam aqui um tempo e, sobretudo, quando voltarem aos seus destinos falem bem da nossa Bahia e convidem outras pessoas a virem nos conhecer.

No último relatório de mortes violentas no Brasil, segundo dados do Grupo Gay da Bahia (GGB), o Brasil continua sendo o país onde mais LGBTQIA+ são assassinados no mundo: uma morte a cada 34 horas. A Bahia aparece no topo do ranking com 27 mortes violentas de LGBT, representando 10,5% do total. Em questão de segurança, como a coordenação pretende orientar o público que chega e quais ações nesse sentido estão sendo planejadas?

Obrigado pela pergunta, porque além das qualificações, esse vai ser o nosso principal desafio, ajudar o Governo do Estado para enfrentarmos essa triste realidade. Com relação ao turismo, vamos estar fazendo a promoção, o mesmo trabalho que a Secretaria de Justiça faz, mas voltado para o segmento com relação a sensibilização, a formação, qualificação, o convencimento para garantir direitos. Nós temos na Bahia uma política do Centro de Promoção e Defesa dos Direitos LGBTQIAP+, o CPDD, localizado no Pelourinho, e também é um equipamento que vai nos colocar à disposição como ponto focal da rede de proteção e defesa dos nossos direitos para caso também venham acontecer violação de direitos dos turistas.

Aqui na Bahia nós temos um sistema, o Serviço de Orientação ao Turista, que está no aeroporto, rodoviária e no Pelourinho, além da Praia do Forte e alguns outros locais no nosso estado, e além desse lugar também temos o Disque 100. Finalmente, o Disque 100 voltou, é a principal ouvidoria ou canal de denúncia contra a violação de direitos, seja de qualquer natureza que venha acontecer e também para nós LGBTs. A Defensoria Pública do Estado e o Ministério Público do Estado têm feito grandes trabalhos nesse sentido, do turismo também. Quanto mais se denuncia, quanto mais se fala sobre e convence os nossos, com certeza a gente mais contribui para sair desse triste patamar.

Atualmente, qual é o panorama do turismo LGBTQIAP+ na Bahia e qual sua importância para o estado?

Vamos traçar um panorama a partir do início da nossa pesquisa. Queremos entregar em maio o primeiro relatório. Para ter noção, aqui no nosso cadastro, o Cadastur, temos mais de 15 mil CNPJs cadastrados. Sobretudo hotelaria, transporte turísticos, bares, restaurantes e afins, e de agência de turismo, então, são muitas empresas, colaboradores que vão estar nos fornecendo respostas para embasar um plano de ação da secretaria, com diagnósticos mais precisos, até porque a gente vai ter um mapa dos nossos desafios no próximo período.

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