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12/09/2019 às 16:26 • Atualizada em 12/09/2019 às 16:59 - há XX semanas | Autor: Gilson Jorge

MUITO

Novos HQs trazem Salvador e Feira como cenários

Igor Albuquerque e Amine Barbuda lançam HQ futurista
Igor Albuquerque e Amine Barbuda lançam HQ futurista -

Edmundo Jukevics aterrissou na Bahia em 1960 trazendo um violento ódio aos comunistas soviéticos que ocuparam o leste do seu país, a Polônia, em 17 de setembro de 1939, e juntamente com os nazistas no oeste promoveram uma devastação, matando inclusive parentes seus. Com o golpe militar de 1964, o polonês naturalizado brasileiro virou um agente da ditadura e capelão, que liderou uma violenta campanha de perseguição e tortura aos comunistas, à liga camponesa e aos terreiros de candomblé de Feira de Santana, terra onde cresceu o roteirista Marcelo Lima, que encontrou a história no livro O bicho chegou a Feira, do escritor e jornalista Muniz Sodré.

Com o aval do autor, Lima adaptou a história para os quadrinhos em uma revista homônima que está pronta desde 2017 e deve ser lançada em breve, quando for inaugurada a nova sede da Fundação Gregório de Mattos (FGM) no Comércio. A obra foi financiada por um edital do selo literário João Ubaldo Ribeiro, projeto da FGM. “É a história de Antão das Neves, um homem negro que ascende socialmente, adapta-se à elite feirense, mas começa a ter pesadelos com cobras, que coincide com a chegada do capelão à cidade”, resume Lima.

Os pesadelos de das Neves começam a se aproximar da realidade quando a sua filha adere aos protestos contra a ditadura militar e a família entra no radar dos agentes da repressão. Lima conheceu o livro de Muniz na bibliografia de uma dissertação, em 2011, enquanto pesquisava sobre o período áureo da cultura da feira livre e da cultura sertaneja na chamada “Princesa do Sertão”, cujo declínio coincidiu com a época do golpe militar.

“Eu entrei em êxtase quando soube da existência do livro e comprei”, lembra Lima, que naquela época também estava pesquisando a vida de Lucas da Feira, um homem negro que na primeira metade do século 19 se rebelou contra a escravidão e passou a atacar tropeiros a caminho da Feira do Gado. Ele foi o protagonista do primeiro HQ de Lima, Lucas da Vila de Sant’Anna, produzido em coautoria com o roteirista Marcos Franco e o ilustrador Hélcio Rogério, ambos feirenses. A revista foi publicada em 2010 por meio de um edital do Ministério da Cultura.

Os quadrinhos são a paixão de Lima, mas para pagar as contas o setor audiovisual parece mais efetivo. “Eu estou trabalhando muito em roteiros de games e séries para TVs e aplicativos”, explica o roteirista de Auts, um desenho para crianças autistas exibido na TVE Bahia e no aplicativo Play Kids. Em novembro, Lima viaja para o Rio de Janeiro como um dos cinco finalistas do curso de desenvolvimento de roteiros Nossos Passos Vêm de Longe, que une cinema e literatura de autores negros.

Editais

Não há editais específicos para quadrinhos, mas é possível submeter propostas na rubrica Artes Visuais ou pelo próprio Selo João Ubaldo Ribeiro, que abarca conto, crônica, dramaturgia, literatura infantil, poesia, romance, republicação e a categoria livre, onde esse gênero pode se encaixar. “O grande chamariz dos quadrinhos é o potencial de incentivo à leitura”, afirma o gerente de promoção cultural da FGM, Felipe Dias Rego. A fundação exige como contrapartida que os selecionados participem de conversas com estudantes da rede pública de ensino e um quinto dos exemplares é doado às escolas.

Vencedores do edital para artes visuais, o roteirista Igor de Albuquerque e a arquiteta e artista visual Amine Barbuda tiveram esse contato com os alunos no último mês de agosto. Como o seu livro -13, -38: amanhã de novo é voltado para um público maior de 16 anos, as conversas aconteceram em escolas do ensino médio da rede estadual.

O projeto de Amine e Igor é um romance gráfico ambientado na Salvador de 2049, que perdeu seu nome e é conhecida pelas suas coordenadas geográficas (-13, -38 ). A história toda se desenrola em um dia da vida de Clarissa Huang, uma sino-baiana que trabalha com a poesia de Gregório de Mattos.

Uma curiosidade é que o sobrenome da protagonista é uma referência a uma pastelaria de uma família chinesa do centro de Salvador. “É uma história com temática ambiental que traz três olhares, o de agora sobre o futuro, o de 2049 sobre o futuro e o de 2049 sobre o passado”, explica o roteirista, que apostou em um ambiente altamente tecnológico para narrar as 24 horas na vida de Clarissa. O impacto da realidade virtual em sua existência, impasses filosóficos e as novas configurações para a arte. “Não uso hologramas, é tudo mental”, define Albuquerque. “Não é Star Wars”, completa Amine.

Com uma arquiteta na equipe de criação, o livro discute também os espaços urbanos. “É uma história que repensa a ocupação da terra”, afirma Albuquerque. Se a parada para comer um pastel no centro rendeu a Albuquerque a inspiração para vislumbrar uma personagem miscigenada, a inspiração de Amine para a aparência de Clarissa veio de uma amiga sul-mato-grossense e do tempo que passou em Santiago de Cuba. “Lá há muitas famílias formadas por negros e chineses”, relata. Amigos há dois anos, Amine e ele já haviam feito algumas parcerias, trabalhando inclusive na revista cultural Barril, publicada até 2018, e recentemente decidiram que era a hora de emplacar um projeto em quadrinhos. Os balões de diálogos do livro foram desenhados por Túlio Carapiá, colaborador de A TARDE.

Albuquerque embarca ainda este ano para a Itália, como parte de seu programa de doutorado, e pretende apresentar o livro em países europeus. “A França é o grande mercado de quadrinhos, e a Inglaterra também tem um público leitor grande para esse gênero”, afirma.

Mercado

Salvador em algum ponto do futuro também é cenário para a história de ficção em que androides herdam a terra, ponto de partida para o HQ que Bruno Marcello, o Bua, deve lançar ainda este ano, projeto financiado pelo edital setorial de artes visuais da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb). “Com maior investimento público, em eventos e editais, o mercado de quadrinho autoral cresceu muito no Brasil. Conheço artistas que vivem exclusivamente de quadrinhos autorais”, afirma Marcello, que ilustrou a Tira do Lazinho, personagem inspirado na infância de Lázaro Ramos, com texto da roteirista paulista Susan Kalik. “O projeto deu uma parada, mas acredito que façamos mais tirinhas no futuro”, diz.

Marcello também é coautor, juntamente de Camilo Fróes e Moreno Pacheco, de Cidade-motor, uma outra história ambientada numa Salvador do futuro. Nesse livro, o futuro da capital baiana é pincelado como um aglomerado de passarelas, viadutos e centros comerciais. A obra foi lançada em 2016 pela RV Cultura e Arte, um dos raros lugares em Salvador que vendem HQs.

Retração

Sócio da RV, Ilan Iglesias vê um momento de retração no consumo de quadrinhos em espaços físicos em função não apenas da crise, mas da concorrência online. “A Amazon está fazendo uma concorrência brutal, as pequenas livrarias não conseguem competir”, avalia Iglesias, que está editando a quarta HQ a ser lançada pela RV. O livro, do artista plástico Igor Souza e do roteirista Fábio Costa, tem como mote a vida de um japonês que migrou para Salvador. Outro gringo na parada. A obra deve estar pronta até o começo de 2020.

Outro trabalho em quadrinhos editado pela RV foi Billy Jackson, sobre um baiano que faz covers de Michael Jackson, ambientado nos dias posteriores à morte do ídolo, em junho de 2009. A revista foi escrita por Victor Mascarenhas, com desenhos de Cau Gomez, colaborador de A TARDE.

Hugo Canuto, que publicou a HQ Conto dos Orixás em 2017, apostou no crowdfunding, e a campanha deu tão certo que ele já está partindo para a terceira tiragem. O estado onde ele mais conseguiu vender foi São Paulo, depois a Bahia e o Rio de Janeiro. Mas houve compradores no exterior também. “Vendi para a Rússia, Grécia, Islândia, África do Sul, Estados Unidos e Nigéria”, lista Canuto.

Fazer HQ em alto nível é caro. Somente a impressão de um projeto padrão pode sair por pelo menos R$ 10 mil. E ainda há uma quantidade razoável de profissionais envolvidos. Roteirista, ilustrador(a), revisor(a) de texto, revisor(a) de diálogos e, às vezes, um profissional específico para desenhar os balões onde ficam os diálogos.

“Ganhar dinheiro com quadrinhos antigamente só trabalhando para Maurício de Sousa ou para o mercado nacional, mas os espaços são muito concorridos”, diz Marcello.

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