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Resgate independente: conheça a rotina de pessoas que tiram animais das ruas
Por Aline Valadares
Do lado de fora, uma placa alertando “cuidado, cão perigoso” entrega que na casa de Bárbara Leite há animais de estimação. Quem chega é recebido pelo pitbull Lyon, seguido da cadela Penélope e do gato Pingo, mas é no fundo da residência que está o lar temporário para animais resgatados na rua.
Em média, são 50 gatos e 19 cães, divididos em dois gatis e quatro áreas para os cachorros. Todas as manhãs, logo cedo, a protetora se encarrega de cuidar de cada um deles, limpando o espaço, alimentando-os e medicando-os. Ela começou a resgatar bichos abandonados há 20 anos e, desde o início, teve o apoio do marido.
O papel dos protetores independentes é resgatar animais em situação de negligência, seja em lares inapropriados ou nas ruas de Salvador, onde, de acordo com a ONG Célula Mãe, há cerca de 200 mil cachorros e gatos abandonados. Após o resgate, verificam e tratam possíveis doenças, vacinam, castram e colocam para adoção. “Se nós vemos tantos animais de rua é porque não tem castração. O castramóvel foi feito para animais já em domicílio”, afirma Bárbara.
No Brasil, praticar maus-tratos contra animais é crime, com punição de três meses a um ano de prisão e multa. Sancionada em fevereiro de 1998, a lei ainda prevê que “incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos”. Em caso de lesão permanente, a pena passa a ser de um a quatro anos de detenção – se houver morte, pode chegar a seis.
O que faz um protetor carregar a alcunha de ‘independente’ é o fato de que arca, sozinho, com todas as despesas do animal. “Os protetores se sentem desamparados. Nos postos, só tem vacina contra raiva, mas não adianta, há outras doenças”, reclama.
Por meio de parcerias entre organizações de defesa animal e clínicas veterinárias, alguns protetores conseguem consulta, medicamentos e exames pela metade do preço. Por meio do Instituto Patruska Barreiro, Bárbara ajuda outros protetores e pessoas de baixa renda a agendar horários em clínicas conveniadas.
Acumuladores
Alguns protetores também ajudam animais que são “colecionados” pelos chamados acumuladores, pessoas que os abrigam mesmo sabendo que não podem mantê-los em um espaço adequado. Essa é uma das atividades que Suze Tavares, voluntária na União de Proteção Animal de Salvador (Upas), tem feito com 45 gatos que vivem em um porão de uma idosa no bairro de Brotas. “O ambiente é sujo e não recebem muitos cuidados. Melhor que estivessem na rua, sinceramente. Isso faz mal para eles, quando há muitos juntos eles ficam frágeis”.
Suze conta que é comum alguns protetores e organizações resgatarem animais para castrar, evitando a proliferação nas ruas e, depois, devolvê-los às comunidades em que viviam. No caso, ela se refere aos gatos considerados ferais, ariscos demais para viver em um ambiente doméstico por já estarem acostumados com a vida na rua. “A gente que é protetor acompanha até o pós-operatório desses animais, mas os dóceis, a gente divulga nas redes sociais, nas feirinhas”.
Ainda assim, ela defende que os bichos não devem permanecer nas ruas sem vacinação ou castração. “É uma questão de saúde pública, não é responsabilidade das pessoas. Isso é injusto com o protetor que faz todo o trabalho”, ressalta. Suze diz ainda que “bicho pode virar praga” e, quando se torna um problema para os cidadãos, alguns deles tentam envenená-los, o que, além de configurar maus-tratos, pode contaminar o solo e se tornar um crime ambiental.
Atualmente, Suze tem quatro gatos para adoção em sua casa, além de outros cinco que já assumiu como dela. Afirma que foi o grupo Sotero Bichanos, que realiza doação de gatinhos castrados e promove ações de resgate, que a inspirou no início de sua trajetória como protetora.
Orientação
Qualquer pessoa que resgatar um animal na rua e precisar de orientação de como cuidar dele pode pedir ajuda à Upas, ao Sotero Bichanos, ao Instituto Patruska Barreiro e ao Gatil Irmã Francisca. Também é possível castrá-lo de forma gratuita indo a uma unidade de saúde da prefeitura com o cartão do SUS. Lá, pega-se uma senha e cadastra-se o animal, que é direcionado para ser operado em clínicas parceiras.
Além de serem protetoras independentes, Bárbara e Suze são voluntárias em ONGs de defesa animal, categorias nas quais José Dantas, vendedor de equipamentos de informática, já se encaixou. “Agora estou no meio-termo, aproveitando o melhor de cada lado”, afirma. Ele está há sete anos envolvido na causa e diz ter se decepcionado com algumas instituições, onde encontrou pessoas mais preocupadas em se lançar na política do que com os animais de fato.
Dantas já não faz mais de sua casa uma hospedagem para gatos, pois precisou se desfazer do ambiente reservado para eles: “Continuo sendo protetor, só que agora focado em um mutirão de castração e feira de adoção”. Ele atua no projeto Ronronar, voltado para resgate, cuidado e doação de gatos que antes se encontravam nas ruas. Mas o diferencial é que o grupo reúne, sobretudo, protetores independentes que arcam com as despesas dos animais. “Quando a pessoa adota, a gente acompanha esse processo no início. Fazemos de tudo para dar certo”.
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