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Sérgio Mattos: "Já temos meninas fora do padrão Barbie"

Por Victor Melo

12/03/2019 - 9:00 h | Atualizada em 13/03/2019 - 11:08
Com 30 anos de carreira, o agenciador baiano descobriu nomes como Raica Oliveira e Cauã Reymond
Com 30 anos de carreira, o agenciador baiano descobriu nomes como Raica Oliveira e Cauã Reymond -

Comemorando 30 anos de carreira, o baiano de Iguaí Sérgio Mattos é um dos principais nomes da moda brasileira quando falamos em agenciamento de modelos. Ele foi um dos primeiros bookers da Elite Models Brasil e scouter de um dos maiores concursos de revelação de modelos entre os anos de 1990 e 2000. Responsável pela inserção de nomes como Isabeli Fontana, Ana Beatriz Barros, Márcio Garcia, Raica Oliveira e Cauã Reymond nas passarelas, ele também participou do início da carreira de Gisele Bündchen. Também foi responsável pelo concurso Top Models, que, em parceria com a Rede Globo, selecionou uma garota para participar da novela Desejos de Mulher (2002). Após anos na Elite e depois trabalhar em Nova York, Sérgio abriu a própria agência, a 40°, que há 15 anos exporta grandes nomes da moda nacional para as passarelas e capas de revistas mundo afora. Para comemorar a carreira, Sérgio está escrevendo um livro – ainda sem título ou data de lançamento – em que vai contar histórias que viveu durante três décadas de trabalho no mundo fashion, com depoimentos de pessoas que fizeram parte da sua história. Como um bom baiano, Sérgio aposta em new faces do estado para serem revelações das próximas temporadas de moda do mundo. Em entrevista à Muito, o empresário faz uma análise do cenário atual do mundo da moda e da influência das redes sociais, além de comentar sobre a diversidade que passou a ser pauta e exigência para esse universo.

Como um baiano de Iguaí começou a se envolver com o mundo da moda?

Eu vim morar no Rio com 7 anos, em 1970, e fui criado aqui. Meu pai era da Petrobras, veio transferido e trouxe a família toda. Eu sou praticamente um baiano carioca. Aqui eu comecei a me interessar por isso, por volta de uns 17 para 18. Tinha muitas amigas bailarinas que faziam bastante comerciais de TV, e um dia me levaram em um. Eu achei aquilo o maior barato, aquele universo todo. Fiz um comercial junto com elas, aquilo me deu ânimo e resolvi fazer a Escola Superior de Propaganda e Marketing, em modelo e manequim, me formei e comecei a dar aula, agitar, isso ainda moleque, nem pensava em agência, em nada assim. Fazia alguns trabalhos como modelo fotográfico e como ator. Fiz um monte de teatro, entrei no curso de jornalismo na UFRJ, mas troquei a faculdade pela loja Yes Brazil, que me deu meu primeiro emprego como vendedor. Esse que foi mesmo o meu estágio na moda. A Yes Brazil era a loja mais badalada nos anos 1980, eu conheci todo mundo e comecei a ter mais contato com o mundo da moda. Depois de um tempo, eles me deram a gerência de São Paulo em 1986, e aí foi onde tudo aconteceu.

Na própria loja?

Eu levava os vendedores cariocas para lá e eles acabavam virando modelos. Então, os produtores começaram a me ligar perguntando quem eram os vendedores, pediam para enviar para trabalhos, eu comecei a apresentá-los e colocar no mercado. Em 1988, quando a Elite veio para o Brasil, o Nelson Alvarenga foi o patrocinador do concurso Look of the Year, e ele ficou bem interessado pelo meu trabalho. Disse que eu descobria todo mundo e me convidou para trabalhar na agência, foi meu início em agência. Eu fazia viagens pelo Brasil inteiro selecionando um bando de gente que se inscrevia para o Look of the Year, e assim foram todos os anos. Também ia para a final internacional, que cada ano era em um lugar diferente, e foi daí, desse concurso, que surgiram grandes nomes. Foi assim os anos 1990 todinho. Nos anos 2000 fui convidado para trabalhar em Nova York pela agência Next. Na época, as brasileiras já haviam estourado, Gisele já era Gisele, e todas queriam um booker brasileiro. Foi uma experiência legal, mas depois voltei e montei a 40°, que está fazendo 15 anos este ano.

E qual é sua relação hoje com a Bahia?

Minha mãe mora em Iguaí, eu vou direto. Lá tem umas 200 cachoeiras, eu adoro ir para lá descansar, curtir as cachoeiras, encontrar família, que é enorme, amigos de infância que encontro até hoje. Adoro Salvador também e estou sempre por aí.

Você era um dos nomes por trás de uma das principais agências dos anos 1980 e 1990 do país. Descobriu modelos que ganharam o mundo. Nesses 30 anos, quais as maiores mudanças desse mercado?

O mercado é muito cíclico, ele vai e vem, a moda vai e vem, o tipo de beleza muda também. O que eu posso dizer agora é que com as redes sociais a moda ficou mais democrática. O padrão de beleza mudou totalmente, já temos as meninas fora do padrão Barbie, porque antigamente as meninas eram todas Barbies, pareciam um bando de clones, tinham que ter aquele mesmo perfil, aquele mesmo estilo. Hoje em dia já existem modelos com vitiligo, modelos plus size, modelos trans, o que faz a moda mais democrática hoje em dia e deixa os perfis mais acessíveis. As pessoas querem ver muito gente como a gente, gente como seu vizinho, sabe assim? Para a moda isso funciona muito, você ver que tem mais modelos com tatuagem, mais modelos com piercing, modelos com cabelos coloridos. A ordem é ser diferente, inovar e lançar tendências. Eu acho que com as redes sociais isso se espalhou muito mais rápido, e as marcas já estão entendendo isso na hora de contratar as modelos.

Como você dizia, há hoje um discurso pela diversidade muito grande. A São Paulo Fashion Week bateu recorde de modelos negras na última edição, em outubro do ano passado. A cor das passarelas mudou, de fato?

Totalmente, e isso é uma coisa que eu já falo há muito tempo, parece que eu sou até vidente (risos). Há 15 anos, eu falava em entrevistas que ia ter mais modelos exóticos, negros, orientais. As modelos negras da 40° estão bombando. A Mahany Pery, que é de São Gonçalo (RJ), está com uma visibilidade enorme. A Nayara Oliveira agora está em Londres fazendo todos os desfiles. Elas chegam, entram no mercado, estouram e vão para fora. A aceitação está muito maior. Aqui no Brasil nós temos mais de 50% da população negra, então, se não tiver mais negros na passarela é porque tem alguma coisa errada. As meninas negras daqui, como eu falei, estão ganhando o mundo. Em alguns mercados em que não se viam tantos negros na passarela, como Milão, você já vê. Eu acredito muito nisso, acho que daqui para o futuro a coisa vai ser assim mesmo, valorizando o diferente. Acho que a moda tem o poder de lançar essa bandeira.

Aqui no Brasil nós temos mais de 50% da população negra, então, se não tiver mais negros na passarela é porque tem alguma coisa errada

Ao mesmo tempo, o padrão dos corpos permanece muito igual, não? Uma magreza que parece impossível de alcançar.

A questão da magreza é uma coisa da alta-costura, os vestidos do Lagerfeld são costurados no corpo, eles já fazem em cima do manequim 16, então, esse é o padrão de passarela. Não é uma coisa que vai mudar, que vai ter plus size em tudo, porque não vai, eles sempre vão ter aquelas magrelinhas, principalmente Paris, que é haute couture mesmo. As modelos ainda vão ter as pernas bem compridas, parecendo aqueles croquis que eles fazem, e o quadril estreito, para poder fantasiar em cima, botar bastante pano, tecido, e elas vestirem mais essas roupas. Eu acredito que esse padrão ainda vá existir. O que falo da diversidade é mais de estilos. As plus size são um ou outro estilista que está colocando, é uma coisa nova, e a gente tem que ver aonde isso vai dar, mas é uma coisa nova. Eu tenho há um ano. São 15 anos de 40°, mas só há um ano eu abri para plus size, porque começou a ser pedido. Eu anunciei, disse que queria e já temos três modelos no casting, elas estão trabalhando e está sendo bem legal.

Hoje se fala muito nas instamodels, modelos que surgiram no Instagram para depois ganhar as passarelas, como é o caso de Kendall Jenner e das irmãs Hadid. Como essa plataforma afeta as agências de modelos?

Tem o lado positivo, porque através do Instagram a gente pode divulgar nosso trabalho, mas também os clientes vão direto nelas, chamando para trabalhar, e se a menina não tiver uma estrutura boa, ela faz qualquer coisa, aceita qualquer convite. Então, é uma faca de dois gumes, porque tem o perigo também, convites malucos, é preciso ter muito cuidado, tem muita gente fazendo convites falsos.

Quando você começou, o Brasil não tinha ainda uma semana de moda importante. A primeira edição da São Paulo Fashion Week aconteceu em 1995. Esse mercado se estruturou ao longo dos anos, se fortaleceu. Qual é, na sua opinião, o maior desafio para as marcas brasileiras hoje?

É a qualidade, fazer um produto que possa concorrer com qualquer marca internacional. A gente já tem alguns despontando, como Lenny Niemeyer, que faz muito sucesso em qualquer lugar que ela vá; tem o Oscar da Osklen, que já está em vários lugares; a Rosa Chá, que faz desfiles em Nova York. Eu acho que o desafio é esse, trabalhar de igual para igual, sem perder nada e procurar estar com a qualidade em alta, o que é muito cobrado em um trabalho internacional. Mas estamos no caminho.

O Brasil já ocupou esse lugar de ser um país exportador de modelos. Ainda é assim hoje? E o que é, na sua opinião, que outros mercados enxergam nas modelos brasileiras?

O que nós temos aqui muito é a energia do brasileiro, aquele samba no sangue, o borogodó que a gente chama, porque o brasileiro tem essa alegra de viver que é natural do nosso povo. E nós temos a mistura, a gente tem tudo quanto é tipo, a gente tem morena de olhos claros, negras com cabelos loiros, a gente vê todos os estilos porque a gente tem uma mistura muito grande, então a diversidade é muito maior aqui. A gente continua alimentando os mercados internacionais com muitas meninas, todo ano é um novo rosto que é lançado no mercado, e eu acredito que isso vá crescer. Nossas grandes concorrentes são as russas, que chovem em peso ali na Europa, que já está mais perto. Mas se coloca uma brasileira e uma russa, a brasileira tem mais borogodó.

Há alguns anos o sonho da maioria das meninas era ser modelo. Você acha que isso permanece? Ou elas já querem ser blogueiras ou influenciadoras digitais?

Já divide um pouco com essa coisa de youtuber e blogueira. Às vezes, você já vê criança falando isso. Eu cresci sem nem saber o que era isso, então, para mim, ainda é uma novidade. Mas ainda tem muita menina com sonho de ser modelo, principalmente no interior. Eu viajo muito e ainda encontro muitas meninas com vontade de ganhar a passarela.

Um dos grandes nomes da moda internacional é a modelo baiana Adriana Lima. Você, que é daqui, costuma procurar new faces no estado?

Para mim, a Adriana é a coisa mais linda do mundo, a número um. Acabei de descobrir uma turma daí, uns seis, que têm potencial para serem tops internacionais. Tem um menino de Presidente Tancredo Neves, Paulo Eduard, que tem potencial Calvin Klein, e um pessoal de Salvador, como Rafaela Rehem, Ana Luiza Costa e Alysson Lima, todos lindos. Na Bahia, nós temos muito da mistura que representa o Brasil.

Não é uma coisa que vai mudar, que vai ter plus size em tudo, porque não vai, eles sempre vão ter aquelas magrelinhas, principalmente Paris, que é 'haute couture' mesmo

A agência em que você trabalhou descobriu Gisele Bündchen. Você participou de alguma forma da carreira dela? Vai demorar muito para o mundo ter uma nova Gisele?

Com a Gisele eu acompanhei o início da carreira. Eu era booker da Elite e scouter do Look of The Year, concurso que a revelou. Eu fui o primeiro a viajar com ela a Ibiza, acompanhei e ‘bookava’ ela quando ela foi morar em Nova York. Inclusive quando a gente foi para Ibiza, fomos com uma baiana, a menina que desbancou Gisele no concurso (Claudia Meneses). Eu descobri uma menina, agora com 14 anos, que todo mundo fala que é a cara de Gisele, a Paula Lacroix. Ela já fez fotos para tudo que você possa imaginar, da Vogue Teen até trabalhos no Japão. Eu não acho que vai ter outra Gisele, Gisele é Gisele, ela criou o nome dela muito forte. Mas virão outras meninas que farão sucesso que nem ela, com essa projeção internacional, e eu espero que seja negra.

Poucos modelos masculinos ganharam o status de celebridade como as modelos femininas. A que você atribui isso? Hoje já está havendo uma mudança nesse cenário?

É coisa do mercado mesmo, o mercado é feminino, tem muito mais marcas femininas, tem muito mais visibilidade para mulheres. Produz beleza muito mais para mulher, apesar de o homem estar mais vaidoso, etc., mas por isso eu acho que o volume de trabalho é maior para as meninas que para os meninos. Mas nós sempre tivemos brasileiros de muito sucesso, desde a década de 1990. Como Sérgio Mello e Jens Peter, que bombaram antes da Gisele. Sempre tem uns meninos que se destacam bastante no cenário internacional, mesmo com muito mais mercado para as meninas.

A moda acabou incorporando o discurso da sustentabilidade. Mas como tornar isso real, se é um mercado que está sempre estimulando o consumo, com o lançamento de numerosas coleções? E se a gente for pensar, os tecidos sintéticos, que têm derivados plásticos, geram microplásticos, uma das grandes fontes poluidoras dos oceanos.

Existe essa preocupação agora, então, todas as confecções já estão pensando em tecidos e em como fazer a coisa ficar sustentável. Existem marcas, como a Reserva, que se preocupam desde a embalagem que eles entregam nas lojas; e os clientes estão querendo saber isso das marcas, até se existe trabalho escravo por trás das confecções. Os clientes procuram tudo isso antes de comprar hoje em dia. Existe a preocupação não só das marcas e das modas, mas, em geral, todo mundo está preocupado com o meio ambiente.

Em 2015, aconteceu a última edição do Fashion Rio, deixando só a São Paulo Fashion Week no calendário de grandes semanas de moda do país. Como isso afetou o mercado?

Para as agências, foi como se a gente tivesse ficado órfão aqui no Rio. Porque era a vitrine dos nossos modelos, principalmente os cariocas, que ficavam loucos para desfilar. Hoje a gente tem que mandar para São Paulo para tentar, toda essa coisa de trocar de cidade. O Rio de Janeiro está precisando que alguém crie uma semana de moda aqui, estamos com esse buraco, esse vazio.

Além de modelos, você também faz o agenciamento de atores. Qual a maior diferença de trabalhar com esses dois segmentos?

É um trabalho bem diferente. O modelo lida mais com estética, então, é a fisionomia, é a passarela; o ator não, é a alma, é uma coisa de deixar um pouco de si e se jogar nos personagens, desconstrução de imagem mesmo. Às vezes, a menina tem aquela pose toda, começa a estudar teatro e desconstrói tudo aquilo para ser uma pessoa mais acessível, porque ela pode tanto ser uma bandida como uma mocinha, os personagens são variados. O ator tem que ampliar um pouco mais, tem que ter mais cultura, tem que ter um bom diálogo, tem que ler mais. É mais difícil, mas o retorno financeiro também é melhor para os atores do que para os modelos.

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