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A herança de um IPTU maldito

Proprietários de imóveis em Salvador estão apavorados com a possibilidade real de aumento no IPTU

Publicado quarta-feira, 12 de outubro de 2022 às 00:00 h | Autor: Karla Borges* | [email protected]
Poder Executivo não enviou à Câmara Municipal um projeto de lei impondo limites para as travas previstas
Poder Executivo não enviou à Câmara Municipal um projeto de lei impondo limites para as travas previstas -

Os proprietários de imóveis em Salvador estão apavorados com a possibilidade real de aumento no IPTU de 2023. O Poder Executivo não enviou à Câmara Municipal um projeto de lei impondo limites para as travas previstas no artigo 4º da Lei 8.473/13 que impediria a Secretaria Municipal da Fazenda de lançar o imposto dos imóveis residenciais com um acréscimo de até 35%. Os imóveis comerciais poderão ter reajustes de 35 a 300%, assim como os terrenos da cidade. Trata-se de uma herança perversa da reforma tributária promovida em 2013.

A administração insiste em se abster sobre a matéria, diferente dos últimos oito anos, quando foram publicadas leis que impediram um aumento superior ao índice inflacionário (Lei 8.621/14 para 2015, 2016 e 2017; Lei 9.279/17 para 2018, Lei 9.548/2020 para 2019, 2020 e 2021 e a Lei 9.601/21 para 2022).  As travas utilizadas pela legislação de Salvador constituíram uma violação ao princípio da isonomia tributária por promover duas formas distintas no lançamento do tributo: imóveis construídos até 2013 não obedecem às regras da Planta Genérica de Valores – PGV, pois o cálculo é feito com base na lei antiga, já os empreendimentos entregues a partir de 2014 são penalizados com valores irreais.

Para 2023, como não foi sancionada lei até 30/09/22, os valores do IPTU dos imóveis travados poderão sofrer um aumento de 35 a 300%. Já as unidades imobiliárias existentes a partir de 2014 não podem sofrer qualquer alteração, devendo, obrigatoriamente, permanecer com o mesmo IPTU de 2022, acrescido apenas da atualização monetária, se algum decreto assim dispuser, pois a súmula 160 do Superior Tribunal de Justiça permite. Qualquer proposta que venha a ser encaminhada a partir de outubro violaria o princípio da anterioridade nonagesimal (noventena): é vedado ao Município cobrar tributos antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.

Ainda que a fixação da base de cálculo do IPTU seja exceção ao princípio da noventena, as alíquotas devem obedecê-lo, e ambas precisam de lei em sentido formal. Ademais, na tabela de receita da Lei 8.464/13, elas variam em função do valor venal e uma majoração nesse valor implicaria no aumento dessas alíquotas, tendo esgotado o prazo legal para tal proposição. O desconhecimento do IPTU de Salvador pelos gestores provocou a omissão do Executivo ao deixar de enviar uma nova PGV no primeiro ano de legislatura, perdendo a oportunidade de corrigir inúmeras distorções existentes. Diante da herança maldita recebida do seu antecessor, não restará alternativa mais plausível para a atual administração que não seja manter os valores do IPTU de 2023 iguais aos de 2022.

*Karla Borges é professora de Direito Tributário

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