SPOOFING
Lava Jato negociou com EUA a divisão de dinheiro cobrado da Petrobras
Arquivos da Operação Spoofing revelam relação entre procuradores do MPF e Estado norte-americano
Chats que fazem parte dos arquivos apreendidos pela Polícia Federal (PF) durante a operação Spoofing — que investigou o hackeamento de procuradores e também do ex-juiz Sergio Moro no caso que ficou conhecido como Vaza Jato — foram revelados nesta quinta-feira, 20, pelo portal UOL e pela newsletter A Grande Guerra, apontando que o ex-procurador e ex-deputado Deltan Dallagnol negociou em sigilo com as autoridades dos Estados Unidos um acordo para dividir o dinheiro que seria cobrado da Petrobras em multas e penalidades por causa da corrupção.
De acordo com os veículos, a negociação entre os procuradores do Ministério Público Federal (MPF) não envolveu a CGU (Controladoria-Geral da União), o órgão competente por lei, para o caso.
A primeira revelação sobre as conversas pela divisão do dinheiro ocorreu no dia 29 de janeiro de 2016, em diálogo de Deltan Dallagnol com procuradores da Suíça.
“Meus amigos suíços, acabamos de ter uma reunião introdutória de dois dias com a SEC (Comissão de Valores Mobiliários) dos EUA. Tudo é confidencial, mas eu disse expressamente a eles que estamos muito próximos da Suíça e eles nos autorizaram a compartilhar as discussões da reunião com vocês”, disse Dallagnol.
“Como estávamos preocupados com uma penalidade enorme para a Petrobras, muito maior do que tudo que recuperamos no Brasil, e preocupados com o fato de que isso poderia prejudicar a imagem de nossa investigação e a saúde financeira da Petrobras, pensamos em uma solução possível, mesmo que não seja simples. Eles disseram que se a Petrobras pagar algo ao governo brasileiro em um acordo, eles creditariam isso para diminuir sua penalidade, e que o valor poderia ser algo como 50% do valor do dinheiro pago nos EUA”, continuou Dallagnol.
A Petrobras fecharia um acordo com os EUA mais de dois anos depois, aceitando pagar uma multa de 853,2 milhões de dólares para não ser processada. O acordo garantiu o envio de 80% do valor ao Brasil.
Metade do montante milionário seria destinado a um fundo privado que a própria Lava Jato tentou criar e não conseguiu. O ministro Alexandre de Moraes suspendeu a criação do fundo a pedido da Procuradoria Geral da República. O dinheiro foi destinado à Amazônia e, agora, o CNJ investiga o caso.
Ainda em 29 de janeiro de 2016, um procurador brasileiro identificado como Douglas enviaria aos suíços uma longa de lista de contatos entre as autoridades norte-americanas relacionados com fraude, da Seção de Confisco de Bens e Lavagem de Dinheiro e de outros setores.
De acordo com reportagem do The Intercept Brasil e da Agência Pública, Deltan Dallagnol escondeu nomes de pelo menos 17 agentes americanos que estiveram em Curitiba em 2015 sem conhecimento do Ministério da Justiça, que deveria ter sido avisado. Entre eles, procuradores norte-americanos ligados ao Departamento de Justiça e agentes do FBI.
Os encontros e negociações ocorreram sem pedido de assistência formal e foram comprovados por documentos oficiais do Ministério das Relações Exteriores brasileiro, obtidos pelo Intercept para além dos diálogos da Vaza Jato.
Durante as conversas e visitas, os procuradores da Lava Jato sugeriram aos americanos maneiras de driblar um entendimento do STF que permitisse que os EUA ouvissem delatores da Petrobras no Brasil.
A troca de informações sem o conhecimento do Ministério da Justiça foi intensa. Com base nessas informações, mais tarde, agentes americanos ouviram no Brasil Nestor Cerveró e Alberto Youssef, além de outros depoimentos usados para processar a Petrobras nos Estados Unidos.
Deltan Dallagnol sabia que estava agindo à margem da lei. Em um diálogo de 11 de fevereiro de 2016, o procurador Vladimir Aras — então diretor da Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) da PGR — alertou o ex-líder da Lava Jato sobre seus procedimentos ao permitir a operação dos agentes americanos no Brasil.
“Obrigado, Vlad, mas entendemos com a PF que neste caso não é conveniente passar algo pelo Executivo”, disse Dallagnol.
“A questão não é de conveniência. É de legalidade, Delta. O tratado tem força de lei federal ordinária e atribui ao MJ [Ministério da Justiça] a intermediação. Estamos negociando com o Senado um caminho específico para os passos do MPF. Por ora, precisamos observar as regras vigentes”, respondeu Vladmir Aras.
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