SABATINA
Kleber Rosa defende inclusão e inteligência no combate à violência
Candidato do PSOL ao governo conversou com o A TARDE sobre agricultura familiar, educação e segurança pública
Por João Guerra
No domingo, 2, os baianos vão às urnas escolher quem será o novo governador da Bahia pelos próximos quatro anos. Seis candidatos se apresentaram para concorrer ao cargo e, nos últimos meses, entre pré-campanha e campanha oficial, apresentaram suas propostas para melhorar a vida dos habitantes dos 417 municípios do estado.
O A TARDE conversou com o candidato do PSOL ao Executivo baiano, Kleber Rosa, a respeito das suas propostas para governar o estado, sobre o processo eleitoral deste ano e o projeto que ele e o seu partido imaginam para a Bahia e para o Brasil.
O soteropolitano Kleber Rosa é investigador da Polícia Civil e é professor da rede estadual de Educação. Ele, no cenário federal nessas eleições, assim como a sigla a qual é afiliada, faz campanha para que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No cenário estadual, no entanto, faz críticas às gestões petistas, além de questionar a imagem de “bom gestor” que o ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União Brasil) tenta passar. Rosa também, durante a campanha, fez críticas contundentes às propostas de João Roma (PL), que representa no estado as políticas implementadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) no governo do país.
Abaixo, segue as respostas do candidato a respeito de economia, educação, cultura, segurança pública e o processo eleitoral de 2022.
A TARDE - Atualmente, o agronegócio é dos motores, talvez o principal motor da economia do país e da Bahia em especial. Como que o senhor pretende lidar com esse setor no estado?
Kléber Rosa - A minha proposta é pensar uma política de agricultura familiar. É organizar em função da prioridade da agricultura familiar, não em detrimento do agronegócio, não contra o agronegócio, mas entender a produção mais popular como a o principal investimento na produtividade agrária. Isso passa por dois duas compreensões. Primeiro, que a gente inclui parte significativa da nossa população de mais populares e com isso a gente garante renda, para a nossa população, o que pode interferir positivamente, por exemplo, na própria geografia da população na Bahia, diminuir as pressões nos grandes centros, garantindo condições de vida digna no campo e garantindo a produtividade mais eco sustentável, mais saudável e mais barata na mesa da população. E eu falo isso não é para negar a importância do agronegócio dos grandes negócios. Mas a economia capitalista tem gerado em torno dos monopólios, ou seja, a se enxugando para que apenas poucas pessoas ou poucos grupos tenham controle sobre um setor e sobre algumas terras. Além disso, eu defendo a manutenção dos trens do subúrbio, não só como transporte de pessoas, mas, sobretudo, como transporte da produção comercial e da produção rural. Porque, a partir dos trens do subúrbio, a gente pode conseguir interligar Salvador, por via férrea, com a região metropolitana, com a região do Recôncavo e até mais além. Então, transporte barato, transporte rápido e eficaz para escoar grão, por exemplo, muito mais barato, do que as rodovias, que exigem o nível de manutenção permanente e muito cara.
A TARDE - No seu programa de governo é apresentado um contexto histórico sobre os efeitos do carlismo na economia baiana que perduram até hoje. Quais efeitos seriam esses?
Kleber Rosa - O carlismo inicia ali na década de 1970 e é desenvolvido a partir do impulsionamento da economia do modelo de industrialização no entorno da capital, sem garantir a industrialização no campo. Não precisa ser necessariamente pensado na indústria mecânica mas eu estou falando de indústria como setor da economia. A própria agricultura familiar pode ser visto como como uma indústria da produção agrícola. Então há o esvaziamento da economia no interior. Isso é o que faz com que haja essa superpopulação no entorno da cidade, daí vem os grandes problemas de habitação, daí vem os grandes problemas com a violência. O próprio desenvolvimento da capital, por exemplo é baseado nesse modelo de industrialização e de benefício para setores específicos e limitados. É o que o professor Paulo Fábio chama de “modernização conservadora”. Eu não quero traduzir o conceito do professor Paulo Fábio, obviamente que do ponto de vista acadêmico é muito mais profundo do que o que eu estou falando aqui, mas entender a ideia de modernização conservadora é justamente essa, modernizar o estado sem mexer nas estruturas de hierarquia social. E esse modelo é responsável pelo quadro socioeconômico que a Bahia passa. Pelo quadro de pobreza, de miséria da nossa população, da maioria da nossa população excluída da atividade econômica e excluída do mercado de trabalho. Então não tenho dúvida de que que hoje a gente vive ainda sobre as consequências desse modelo desenvolvido, sobretudo, a partir da era carlista.
A TARDE – Na sua visão, as gestões petistas não conseguiram superar esses efeitos por quê?
Kleber Rosa - Olha, o papel do PT era justamente romper com esse modelo de movimento conservador. E, para o meu diagnóstico, o problema do PT é não ter conseguido romper com isso. E não ter conseguido não significar dizer “sentou e fracassou”. Houve, na verdade, um esvaziamento do programa do PT. Houve, na verdade, uma adesão do PT a um modelo semelhante ao carlismo, que beneficia, por exemplo, o agronegócio e que não tem uma política séria de agricultura familiar. Que facilita o desmatamento justamente pra beneficiar a ampliação das áreas de terras de criação de gado. Tudo isso para beneficiar o agronegócio. E isso se revela também pelas alianças feitas pelo PT, atraindo setores conservadores, inclusive do velho carlismo, como, por exemplo, de Otto Alencar (PSD) e de João Leão (PP). Eles aderem ao petismo, obviamente, não a um programa, eles, na verdade, modificam o programa original ou são parte daquele processo de abandono do programa original do PT e a adequação a um a um programa mais conservador.
A TARDE - O senhor, assim como o candidato do PCB, Giovani Damico, dizem querer criar um salário-mínimo estadual acima do salário nacional. O que o senhor acha dos programas de transferência de renda e de que forma o estado, governado pelo senhor, conseguiria implementar esse salário-mínimo estadual?
Kleber Rosa - Eu fui secretário-geral da Intersindical na Bahia. E, naquele momento, eu já defendia o salário-mínimo regional como pauta da luta sindical. Eu entreguei ao governador Rui Costa (PT), na sua primeira gestão, o projeto para isso. Para mim, há dois programas eeles precisam estar interligados. A valorização do salário-mínimo e um programa de renda mínima. Porque nós precisamos garantir a quem precisa comer e que não está empregado. A geração de emprego não é imediata, ela não é de uma hora pra outra. Mas a fome aperta. E nós precisamos resolver o problema da fome, que é hoje. Então, o programa de renda mínima é para garantir que toda a família possa comer. Em paralelo a isso, a implementação de um salário-mínimo regional, que na verdade é estadual, na minha proposta, seria de 20% acima do salário-mínimo nacional ao final de um mandato de quatro anos. Com isso, é mais dinheiro no bolso do trabalhador assalariado e mais poder de compra. E, consequentemente, aquece o comércio, aquece o serviço, aquece a economia e gera emprego. Essa é a lógica do giro da economia, obviamente que associado com o crescimento econômico a partir de investimento em outros setores, como é o caso que eu já dei um exemplo aqui da agricultura familiar. E, na medida que as pessoas vão entrando no mercado de trabalho, vai pressionando menos o programa de renda mínima e assim podendo beneficiar outras pessoas.
A TARDE - Normalmente, é comum associar programas de renda com o aumento de impostos. O empresariado baiano e brasileiro reclama das políticas fiscais no país e em particular, na Bahia. Como seria o desenvolvimento de uma política fiscal em um eventual governo do senhor?
Kleber Rosa - Na verdade eu não acho que a gente deva aumentar impostos para fazer transferência de renda. Mas eu acho que é necessário pensar uma nova política de imposto que impacte menos na população mais pobre. O imposto de renda, por exemplo, atinge os setores médios e baixo da população. Então é necessário fazer uma reforma para quem tem mais, proporcionalmente, pagar mais. Isso vale para toda a política de imposto. O meu partido defende também, nacionalmente, a taxação de grandes fortunas. Ou seja, um imposto para os mais ricos como forma de, nem de equilibrar porque não equilibra, mas é uma política de transferência, sobretudo, de quem tem as maiores riquezas em favor da nossa população mais pobre.
A TARDE - Recentemente, a Ford encerrou a produção no Brasil e fechou sua fábrica em Camaçari, o que ocasionou a demissão de cerca de 4 mil trabalhadores só na Bahia. Como evitar o processo de desindustrialização do estado e atrair novos investimentos?
Kleber Rosa - As indústrias fazem uma espécie de leilão predatório com os estados e não têm compromisso com o local onde está instalada, sobretudo multinacionais de grande porte, como é o caso da Ford. Então, assim não tem garantia de que essas indústrias vão permanecer aqui. Elas fazem leilão porque elas podem ser instaladas em qualquer lugar. Isso não faz diferença do ponto de vista do mercado, a não ser mão de obra barata e incentivos fiscais estaduais. Eu acho arriscado entrar nesse tipo de lógica porque, a exemplo do que aconteceu com a Ford, quando eles identificam espaços mais baratos, com gastos menores, simplesmente migram sem nenhuma responsabilização com o local. Eu acho que nós precisamos desenvolver a indústria nacional porque ela tende a ter mais compromisso com o estado onde está. Para isso, obviamente, mais uma vez, é necessário fazer a economia crescer sem que a gente precise ficar refém dessa lógica, de leilão que as indústrias multinacionais fazem e que geram instabilidade. Se a gente for colocar na balança o que significou de benefício da Ford o quanto ela esteve aqui e o que significou de prejuízo quando ela sai, com todos os incentivos fiscais que deixaram de ser arrecadado e com o desemprego que foi causado pela sua saída, obviamente que não é uma equação que que fecha fácil. Isso coloca por terra esse modelo de grandes estímulos de grandes incentivos fiscais para essas indústrias.
A TARDE – Mas como garantir que as indústrias fiquem?
Kleber Rosa - Veja bem, nós podemos ter uma política de estímulo à indústria nacional. E, na minha opinião, a indústria nacional ela tem um compromisso maior com o território e com a territorialidade. Então diminui a possibilidade desse leilão. Esse leilão, na verdade, acontece, sobretudo, mais com as indústrias multinacionais. Mas aí eu acho que isso seria uma tarefa mais de política nacional. Para garantir que houvesse uma unidade nacional em torno desse processo de industrialização para evitar que haja essa disputa entre estados. Porque essa disputa entre estados é nociva e não dá estabilidade a nenhum estado. Eu não entraria em um ciclo desse de grandes estímulos, porque, na verdade, não tem garantia de que a indústria vai ficar, quanto tempo vai ficar e do que é investido de recursos públicos e ao nível de benefício que se traz.
A TARDE - O senhor é professor da rede estadual e vivencia o dia a dia na sala de aula. Os índices da Bahia nessa área tem sido motivo de críticas por parte dos opositores à gestão atual. O que sr. pretende fazer para reverter esse quadro da situação da Educação no seu governo?
Kleber Rosa – São quatro temas centrais. O primeiro é estancar essa lógica de militarização das escolas e garantir uma concepção educacional focada na pedagogia de Paulo Freire, educar para a consciência crítica e uma educação que permita a inclusão da diversidade como fenômeno pedagógico, a Bahia é gigante e diversa e a militarização lida com a ideia de uniformização, né? Não à toa trabalha com a ideia do uniforme de uma maneira tão incondicional e, na verdade, o que a gente precisa não é uniformidade, a gente precisa de diversidade. A educação que é dada as populações indígenas é diferente da educação que é dada no centro urbano de Salvador, que é diferente da educação que precisa ser dada ao estudante que está na zona rural, no semiárido, percebe? Existe essa especificidade, então absorver essa diversidade que é a Bahia na concepção pedagógica escolar é fundamental e , para isso, a gente entende que a concepção de Paulo Freire ela dá conta de compreender o indivíduo a partir da sua realidade social. Segunda questão: valorização absoluta do professor. Não existe educação sem valorização do professor. O professor é o vetor central do processo pedagógico. Minha proposta é diminuir a carga horária do professor de 26 h/aula mínimas para 18 h/aula. E como parte dessa reestruturação, passa a implementação do ensino técnico quanto a iniciação científica. Aí é fundamental o professor ter sua carga horária diminuída para que ele possa, inclusive, se aprimorar para dar conta dessas especificidades que vêm para o ensino médio. E o terceiro elemento é a retaguarda social. Ou seja nós temos um problema do analfabetismo e da evasão escolar que é grande. A realidade histórica no Brasil é de que os governos às vezes têm política para enfrentar o analfabetismo e às vezes não têm. Mas não existe política para evitar o analfabetismo. Que é garantir a presença do aluno na escola, que é garantir o percurso. É isso que nós estamos defendendo de dar com a retaguarda social. Os alunos que estão em situação de vulnerabilidade social precisam ser assistidos pelo estado com a garantia de um programa que o mantenha e que permita que ele se mantenha na sala de aula, evitando a evasão, evitando o analfabetismo. E o enfrentamento ao analfabetismo, por último, que é a tração da EJA [Educação de Jovens e Adultos], ela já é um programa voltado para esse público, então não precisa inventar grandes programas. Minha posição é valorizar a EJA com estímulo, com ampliação para que ela possa absorver todo esse conteúdo, todo esse público que está fora da educação, mas, que na verdade, é um público da EJA e precisa ser trazido para a escola, para concluir seu percurso ou para iniciar seu processo de alfabetização e de formação.
A TARDE - Dois dos seus adversários já estiveram no Executivo trabalhando diretamente com a Educação. ACM Neto na prefeitura de Salvador e Jerônimo no governo, como secretário. Como o senhor avalia a atuação dos dois na área?
Kleber Rosa - ACM Neto pecou por questões centrais. O primeiro foi não assumir a demanda real que cabe à prefeitura. Me parece que 70% da demanda municipal de Educação é atendida pelo estado. É um número significativo, ou seja, não houve e não há a ampliação da rede municipal. A prefeitura não assume a sua responsabilidade com um público enorme. Isso incide de forma muito significativa, por exemplo, na ausência de creches. A gestão de ACM Neto deu uma tal de uma “bolsa creche” aí de R$ 50 que na verdade ele paga as pessoas para não reclamarem da falta de creche. Na prática é isso. Você dá uma bolsa porque não tem creche. Ou seja, tome seu dinheiro para você não reclamar de um serviço que eu não te ofereço. Uma coisa absurda, uma coisa gritante, um programa absolutamente nocivo para a política de creche. E o segundo é o trato que a prefeitura dá a Educação como um todo. O secretário de Educação é um engenheiro que não tem nenhum trato com a Educação, que não prioriza a Educação, que não tem projeto real de Educação e que escolheu maltratar, principalmente, os professores em todas suas lutas, em todas suas reivindicações. Os educadores não têm valorização, a secretaria não respeita o plano de carreira dos professores, não paga e não respeita os direitos dos professores, um plano de carreira, inclusive que foi aprovado e a prefeitura simplesmente ignora. Isso tem sido fonte de conflitos ao longo de muito tempo na gestão carlista. E, sem contar, o fechamento de escolas., onde, além de não oferecer, ainda fecha. A prefeitura na gestão carlista fechou quarenta e duas escolas do EJA no ano passado. O estado também tem uma política de fechamento de escolas. Eu trabalhei, nos últimos quatro anos, em duas escolas que fecharam e eu precisei sair dessas escolas porque fecharam. Trabalhei de uma escola do estado que era ali nos Barris e trabalhei no Rui Barbosa, em Nazaré. Todas as duas escolas fecharam. E a de Nazaré, era uma escola especial para atender alunos surdos. Aí eu fico pensando, onde é que estão esses alunos agora? Além disso, tem uma política de militarização das escolas e, da mesma forma, não tem respeito ao plano de carreira do professor. Não respeita o plano de cargos e salário do professor, não valoriza e não dá condições adequadas para o professor trabalhar. O caso do pagamento dos precatórios revela a falta de compromisso com o professor, o educador tem direito a esse pagamento e o estado simplesmente enviou um projeto que só manda 80% do valor sem a correção, sem juros e moras. Que na prática, segundo alguns cálculos, dobrariam o valor do que o professor vai receber. É uma falta de respeito absoluta com o que é direito. Inclusive, essa verba é uma verba federal, veio para os cofres do estado e o governo resolve pagar uma parte. Essas são as críticas que eu faço a esses dois modelos.
A TARDE - Um dos maiores atrativos que a Bahia tem para o turismo é sua história e a cultura, sobretudo a afrobrasileira. São pontos que o Sr. pretende focar para incentivar o fluxo turístico no estado?
Kleber Rosa - A Bahia investe pouco na cultura e a nossa proposta é investir 2% do orçamento do estado na cultura. Entendendo essa área não só como a indústria de festas. Mas como patrimônio da sociedade, patrimônio dos povos, sendo necessário valorizar, sendo necessário dar visibilidade, de garantir e dar preservação dessas culturas e isso se traduzir ou associar a uma política sustentável de turismo. Porque o elemento cultural está muito relacionado ao turismo. Então, para garantir esse investimento, antes de tudo é preciso garantir editais para popularizar, para democratizar o acesso a recurso da cultura, pois há um monopólio que, inclusive, permite que alguns dos operadores desse mercado cultural, principalmente ligados à música, tenham acesso a verbas públicas sem precisar de um edital. É fundamental popularizar o fomento à cultura. Esses são os elementos que eu estou defendendo.
A TARDE - No seu programa fala sobre a criação de um novo Estatuto da Polícia Militar. Quais seriam os princípios deste estatuto?
Kleber Rosa - O estatuto é importante para evitar distorções na função constitucional da polícia. A Polícia Militar hoje exerce uma função que não é a sua função. O estatuto vem para normatizar aquilo que na verdade já está estabelecido como regramento constitucional e dá garantia da manutenção e do enquadramento disso. O papel da PM é o papel ostensivo e preventivo. Obviamente que o estatuto também prevê atender a questões que envolve o regimento militar e que já estão em desuso, mas que por falta de um regramento, ele termina em alguma medida ainda incidindo e o trabalho do enfrentamento à violência ao crime organizado ser centrado na ação da Polícia Civil, a partir da investigação. Então, quando a gente fala, por exemplo, em enfrentamento d as milícias, a opção da guerra é a pior. Na investigação é atrelada ao uso de tecnologias que estão acessíveis, naquilo que a gente chama de inteligência policial é o mecanismo que eu estou defendendo e é para a linha mestra da ação policial do enfrentamento à violência.
A TARDE - O senhor também fala da valorização da atividade policial. Tem encampado, inclusive a luta dos profissionais da Polícia Civil a respeito de um reajuste salarial mais condizente com a formação exigida para a função. Além desse reajuste do PCs como seria essa valorização da atividade policial em seu governo?
Kleber Rosa - É interessante você falar disso porque o que que acontece? A gente aqui tem um cuidado de não hierarquizar porque, em alguma medida, há uma espécie de equiparação entre o policial militar e o policial civil do ponto de vista salarial. Não quero tratar de uma hierarquização que pareça que você está beneficiando uma categoria em detrimento da outra. Mas internacionalmente há essa hierarquia quando a gente fala de polícia de carreira única, na qual o indivíduo entra na polícia e vai ser patrulheiro, vai fazer o trabalho ostensivo e preventivo e, a medida em que ele avança na carreira, é que ele se torna um investigador, é que ele tira a farda e passa a fazer o trabalho de investigação policial. Aqui a gente não tem isso. Aqui a gente tem duas polícias não hierarquizadas e ainda a opção aqui pela priorização da ideia do fardamento e da militarização, da ação policial ostensiva numa lógica, por aí você percebe, totalmente inversa. A valorização que eu defendo, por exemplo, para a Polícia Civil passa pelo entendimento da investigação como elemento central e com o papel específico. Além disso, hoje já é carreira de nível superior, então o indivíduo que entra na Polícia Civil hoje, ele tem formação em Direito, ele tem formação em Química, ele tem formação em Administração e essa formação está disponível para uma peça científica que é a investigação, que é o inquérito. O inquérito policial é uma peça científica. Ele é produto de fato de uma pesquisa, a investigação ela é uma pesquisa, você colhe, você analisa, você junta, você elabora e dá o parecer. Então, é uma peça que exige um nível de especialização para você lidar com aquilo. Garantir a carreira é diminuir a distância, por exemplo, entre delegados e os trabalhadores da base, investigadores e escrivães, permitindo que esses investigadores, que na verdade é a função central da Polícia Civil, tenham a função, inclusive, de direção em setores da polícia. Hoje um investigador só consegue ir na carreira, no máximo, até chefe da investigação, chefe de um grupo de investigação. Ele não pode ser diretor de um departamento, ele não pode ser superintendente de um determinado setor, ele não pode dirigir uma delegacia. Então isso precisa mudar, até porque uma pessoa que entra com nível superior, um administrador, por exemplo, como é que ele é administrador e ele não pode ter a função de administrar uma unidade policial, só para gente ter uma ideia.
A TARDE - Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgados este ano apontam que das 30 cidades com mais mortes violentas no país, cinco estão na Bahia. O que senhor pretender fazer para melhorar os índices de segurança pública no estado?
Kleber Rosa – O primeiro elemento do ponto de vista policial é reorientar a ação da polícia, diminuir a letalidade, diminuir a lógica militarizante, investir, fazer concurso para Polícia Civil. Meu projeto é triplicar o número de policiais civis. Equipar as polícias para fazer investigação e, obviamente, que há outro elemento do enfrentamento à violência que passa pela inclusão social e é prioridade no meu programa a gente ter política de inclusão social que passa por renda mínima como eu já falei, que passa por geração de emprego, mas passa também por fazer um programa de garantia de moradia digna, tirar as pessoas da rua, de investimento prioritário em educação. Então, todos esses elementos que visam melhorar a a qualidade de vida das pessoas, promover a inclusão social, garantir a perspectiva de futuro da nossa juventude e, dessa forma, impactar nos índices de violência.
A TARDE - Ainda na área de segurança. Em São Paulo, o monitoramento dos agentes teve como resultado a diminuição de 80% da letalidade policial. O que acha dessa medida?
Kleber Rosa - Essa experiência fala por si, né? Como é que nós vamos preterir de um mecanismo que diminui 80% da letalidade? Só vai preferir outra coisa além disso é quem tenta estimular a letalidade. O meu programa, que é um programa voltado para diminuir a letalidade e diminuir o confronto. Então eu defendo de forma urgente, a utilização de câmeras no fardamento policial.
A TARDE - Sobre a política de combate às drogas, seu programa faz uma crítica ao que tem sido feito nas últimas décadas nesse assunto. Como o senhor, como profissional de segurança pública e educador vê o enfrentamento desse assunto no Brasil e, em particular na Bahia?
Kleber Rosa - Eu sou contra essa política de guerra às drogas. Acho que nós temos que fazer uma inversão da lógica. O que mata na verdade na guerra às drogas não é a droga em si. O que mata é a proibição. É a é a ideia de colocar todo um aparato para fazer o enfrentamento é que promove a violência em torno disso. Há também que a disputa por território de uma atividade ilícita que só é ilícita porque é proibido. Então como como noção, como concepção de modelo eu defendo que as drogas sejam tratadas como problema de saúde, não como problema policial. Eu acho que é importante dá acesso às drogas sob o controle do Estado, como é feito com o cigarro e como é feito com a bebida alcoólica. Eu defendo que isso se aplique às drogas de uma forma geral. Obviamente a droga gera um problema para saúde e isso tem que ser tratado no âmbito da saúde. Então é irracional essa lógica de guerra, que provoca mortes por causa de coisas banais. Toda a violência é gerada pela proibição e pela disputa de um mercado proibido em torno das drogas.
A TARDE – E a respeito da polêmica que surgiu desde o registro das candidaturas a respeito da autodeclaração racial do candidato ACM Neto. O senhor tem feito muitas críticas sobre isso e os outros adversários têm explorado isso nos ataques ao ex-prefeito. Como so senhor vê os caminhos que essa discussão tomou?
Kleber Rosa - Primeiro gostaria de dizer que o meu partido se posicionou sobre isso já internamente. Antes de qualquer coisa, quando houve os registros internos das nossas candidaturas, teve caso de pessoas brancas que se declararam pardos e nós instituímos banca de heteroidentificação e demos a opção: muda ou não vai ser candidato. Houve alguns casos. Hoje essas pessoas certamente devem estar agradecidas, né? Ainda que tenham se chateado no momento pela nossa posição. Então, a nossa posição no partido ela independe da polêmica que gerou em torno do candidato ACM Neto. Isso é a primeira coisa. O que nós estamos cobrando hoje do ACM Neto é o que a gente já cobrou de nós mesmo internamente. O meu partido tem uma relação muito forte com os movimentos sociais. Com o debate racial, sobretudo. O debate racial, sobretudo, para gente é algo muito sério. Eu falei isso no debate [da TV Bahia]. Naquele momento eu não queria atacar o candidato. Eu queria chamar a atenção dele para algo que é sério e que é importante. Além de tratar os assuntos que surgem na eleição só como guerra de votos, há assuntos que precisam ser tratados com a seriedade devida. Eu acho que ele deve retirar [a autodeclaração]. A melhor demonstração que ele tem de respeito à luta da população negra é retirar. Porque o que ele está fazendo é um desfavor a essa luta. É a banalização de algo que foi muito caro para gente. Isso é o primeiro dado. O segundo dado é que isso está relacionado ao acesso a verbas destinadas a estimular candidaturas negras e a diminuir as diferenças sofridas por candidatos negros do ponto de vista socioeconômico e a dar situações melhores de competitividade para candidaturas negras. Quando ele faz isso dentro do partido dele, ele está tirando de candidaturas negras de dentro do partido dele mesmo, que poderia ser maior mais bem beneficiada com esse recurso. Se ele fez isso com a intenção de se beneficiar economicamente, isso é deplorável e é criminoso. Se ele não fez, como diz que não fez, ele precisa reconhecer a besteira feita e voltar atrás antes que seja tarde, porque ele vai ficar marcado por isso. Ainda dá tempo de tomar uma atitude digna de respeito a nossa luta.
A TARDE - Qual a avaliação que o senhor faz da disputa eleitoral deste ano para o governo e a avaliação que faz da própria candidatura nesse cenário?
Kleber Rosa - Eu acho que nós conseguimos defender o nosso programa e fazer ecoar a nossa voz e chegar aos baianos dizendo: “olha, existe um diferencial, pensamos isso e nós propomos isso”. Nós conseguimos mostrar a diferença entre nós e todos os outros. E há diferenças significativas. Todos os outros trazem experiências de gestões reais e concretas e nenhuma dessas experiências expressaram atenção a aquilo que são as coisas mais urgentes da nossa população que é a fome, que é o direito de morar, que é o direito a terra, que é o direito à vida, todas essas candidaturas não têm compromisso com a política de segurança pública que preserve a vida, não tem compromisso com o acesso da nossa população à terra. Nenhuma dessas gestões tiveram um programa verdadeiramente comprometido com a fome. O programa de Bolsonaro é um programa eleitoreiro. Todo mundo sabe disso. Foi feito agora a dois meses para garantir uma situação confortável eleitoralmente e só vai até dezembro. ACM Neto, por sua vez, deixou Salvador numa situação deplorável do ponto de vista do desemprego, não tem nenhuma política social. Aliás, não tem não, não construiu nenhuma política social. A gestão estadual, aqui representada por Jerônimo, nem de longe chegou perto do que foram as políticas sociais de Lula. O mesmo partido e teoricamente o mesmo projeto. Acho que nós temos tido um processo de crescimento fantástico e nós vamos seguir até o dia 2 de outubro dando voz, dando eco ao nosso programa, defendendo um programa que seja verdadeiramente de inclusão social e que represente um projeto real para a Bahia que é fazer a abolição que o Brasil nunca fez, garantir dignidade para o nosso povo, garantir inclusão, garantir direito a vida e garantir cidadania plena.
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