ÉPICO DE SUCESSO
'A Mulher Rei' empolga com muita ação e protagonismo da mulher preta
Filme estrelado e produzido por Viola Davis tem tudo para ser um dos melhores do ano
Por Bianca Carneiro
“A Mulher Rei", longa-metragem que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 22, não poderia estrear em um momento mais importante. Em meio à infeliz avalanche de casos recentes de racismo, entre os quais, os ataques a atriz Halle Bailey como Ariel no live action de “A Pequena Sereia”, é um deleite ver mulheres pretas protagonizando um filme sobre cultura africana, que tem tudo para ser um dos melhores do ano. O épico chegou com tudo nos Estados Unidos, arrecadando US$19 milhões em seu primeiro final de semana em cartaz.
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A obra já nasceu grandiosa, abraçada pela vencedora do Oscar, Emmy e do Tony, Viola Davis, que além de protagonizar-la, também atua na produção, e assinada pela diretora Gina Prince-Bythewood, que consegue equilibrar com competência, o drama e a ação que a história merece.
Baseado em fatos reais, mas utilizando muita liberdade criativa, o longa nos apresenta as Agojie, guerreiras do Reino de Daomé, que foi um dos estados mais poderosos da África entre os séculos XVIII e XIX. Viola dá vida a Nanisca, a amada general desta unidade de mulheres, fortes e extremamente hábeis em combate. O grupo constituía a principal força comandada pelo rei Ghezo (John Boyega).
A sinopse parece familiar? Fãs de cinema ou apenas dos quadrinhos da Marvel, com certeza, lembrarão de “Pantera Negra” e das suas “Dora Milaje”. A associação não é bem uma coincidência, já que as chamadas “Amazonas de Daomé” do filme de Davis foram, de fato, a inspiração para criar as guerreiras do reino de Wakanda, que, assim como no universo cinematográfico da Marvel, eram treinadas desde a infância para as batalhas.
Porém, mesmo tendo muita história boa para contar, as verdadeiras Agojie africanas são pouco conhecidas ou citadas nos livros de história ocidentais. A ficção costuma retratar amazonas quase sempre com a visão eurocentrista de mulheres brancas, altas e de olhos claros. Em coletiva de imprensa realizada nesta segunda-feira, 19, no Rio de Janeiro, da qual o Cineinsite A TARDE participou, Viola Davis disse que A Mulher Rei pretende promover uma reparação histórica para essas guerreiras.
“Sempre conheci as amazonas, mas só fui conhecer as Agojie pelo filme. ‘Amazonas’ é uma expressão colonizadora. Eu só as conheci em 2018, quando comecei a preparação para o longa. Dê o nome de verdade às amazonas, que são as Agojie. Elas eram mulheres descartadas e que ninguém queria. Recrutadas entre oito e 14 anos. Muitas delas eram decapitadas caso não quisessem se tornar Agojie”, contou a atriz.
"É a chance de sermos vistas. Não estamos presentes em filmes de grandes cineastas, de grandes filmes. Nós não somos vistos na vida. Nem nossa beleza, nossa cultura. Não somos vistos como valiosos. Nós somos invisíveis. Agora, a vida dessas mulheres negras, durante duas horas e seis minutos, é finalmente vista”, completa.
Vencedora do Oscar por “Um limite entre nós", Davis volta a esbanjar talento, com sua Nanisca tão forte, e ao mesmo tempo, frágil com questões do passado. Mas além da competência tão conhecida - e que, por si só, já é motivo suficiente para correr pro cinema - o magnetismo da atriz ganha ainda mais significado com a batalha de Viola também fora das telonas.
A artista apostou grande no filme: foram seis anos tentando tirá-lo do papel, com estúdios e produtores. Ao falar também sobre sua preparação para viver a guerreira, a atriz, de 57 anos, treinava cinco horas por dia. No entanto, ela ressalta que A Mulher Rei não é apenas um filme de ação. "É um drama histórico. É reduzir demais dizer que este é um filme de cinema de ação", afirmou.
Mas não é só Viola quem brilha em cena, pois um dos maiores méritos da produção é o seu elenco talentoso, formado por mulheres pretas e de descendência africana, como Thuso Mbedu (Nawi), Lashana Lynch (Izogie) e Sheila Atim (Amenza). Todas conseguem demonstrar a que vieram, graças ao ótimo equilíbrio entre ação e história, que possibilita a abertura e a finalização necessárias para os arcos de cada personagem. E falando em ação, Gina Prince-Bythewood faz bonito com cenas eletrizantes e lutas bem coreografadas, em meio as subtramas paralelas do roteiro.
A caracterização de A Mulher Rei é também um ponto a se notar, ou melhor, premiar com as estatuetas de Melhor Figurino e Melhor Maquiagem e Cabelo. Uma verdadeira celebração à cultura e a beleza africanas, que, definitivamente, merecem mais espaço na indústria do cinema.
Brasil na telona
Nos primeiros minutos do filme, dois estrangeiros falam um idioma que, embora rebuscado, dispensa legendas para os brasileiros: o português. A milhares de quilômetros do que hoje é o Benin, cenário da produção, o Brasil é citado pelo seu infeliz papel como um dos principais mercados escravagistas do mundo.
E esse é um dos motivos que fizeram Viola escolher o país para divulgar o filme, que também pincela sobre a escravização e a venda de africanos por seu próprio povo. No Rio de Janeiro, ela se sentou em uma réplica do trono de Daomé, um presente dado ao príncipe regente D. João 6º pelo rei Adandozan, e visitou as ruínas do Cais do Valongo, maior porto receptor de escravizados no mundo.
“Milhões de escravizados deixaram a África Ocidental, e a primeira parada foi o Brasil. Há um sentimento na cultura negra, seja você um afro-americano, do Caribe ou brasileiro, de que nós estamos conectados. Nós somos parte de um todo. Um dos pontos centrais do filme é justamente essa profunda conexão, e a contribuição do Brasil nesse sentido é imensa. Minha mente já estava aberta para isso desde que eu tinha vinte e poucos anos e foi ainda mais cimentado com este filme. A conexão que temos como pessoas de cor”, explica ela.
E para além de pautas como racismo e a escravidão, A Mulher Rei também discute machismo, abuso sexual e o papel da mulher na sociedade. É deste destaque, inclusive, que vem o título. Afinal, por que “Mulher Rei” e não "rainha"?
"Ela é uma general que mereceu isso, que mereceu esse título. Essa mulher merece estar no topo. Não como uma parceira, não como uma segunda em comando. Mas uma líder. Nós, geralmente, somos secundárias. Mulheres, mulheres negras. Ver alguém como eu em um pôster com a palavra 'rei' significa algo inacreditavelmente poderoso", explica Viola, citando sua personagem.
Marido da atriz e também produtor do filme, Julius Tennon, complementou: "esse filme pode criar uma mudança que todos nós queremos. Afinal, tudo começa com algo espetacular".
Viola fala sobre a importância do filme chegar aos cinemas agora, como uma forma de protesto pela mesmice de personagens negras. "Como mulheres negras, estamos no fim da lista. Pode até ver médicas, advogadas negras sem nomes nos filmes. Você vê a pessoa na tela e depois fica procurando quem é, nos créditos, e não encontra. Estou farta disso. Eu sei quem são essas pessoas. São nossas mães, nossas tias. Eu sei quem são. Por isso é um filme importante", pontua.
Confira o trailer do filme
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