Menu
Pesquisa
Pesquisa
Busca interna do iBahia
HOME > A TARDE +
Ouvir Compartilhar no Whatsapp Compartilhar no Facebook Compartilhar no X Compartilhar no Email

A TARDE +

Corre Coletivo Cênico produz vídeo-podcast sobre HIV/Aids

Série mostra que mostra que, 40 anos depois da descoberta do vírus, é possível levar uma vida normal com HIV

Por Gilson Jorge

05/03/2022 - 17:58 h | Atualizada em 05/03/2022 - 19:16
O fotógrafo 

e designer Ton Schübber vai falar sobre afetividade
O fotógrafo e designer Ton Schübber vai falar sobre afetividade -

O fotógrafo e designer Ton Schübber cuidou do namorado durante meses enquanto ele permaneceu internado no Hospital Couto Maia, enfraquecido pelas complicações impostas pela Aids. Limpava o corpo do companheiro depois de episódios de diarreia, trocava sua roupa depois dos banhos, monitorava os horários das refeições e tinha que lidar com posturas homofóbicas. Às vezes, um olhar diferente, um a certa má-vontade por parte de um funcionário evangélico e a dificuldade para que as pessoas o tratassem como o companheiro, o cônjuge do paciente.

Ambos foram infectados pelo HIV. Ton, que cumpre o cronograma do tratamento e toda a medicação prescrita desde que recebeu o diagnóstico tem carga viral indetectável. O que significa que não desenvolve a doença e nem mesmo pode transmitir o vírus.

Seu namorado deixou o tratamento por três vezes, sempre porque não estava bem emocionalmente e não conseguia ir ao posto de saúde pegar a medicação, com medo de que alguém o reconhecesse. Depois do agravamento do quadro de saúde, com a defesa do organismo debilitada, não resistiu a uma pneumonia e morreu.

Histórias como a de Ton começam a ser contadas, a partir de hoje, em uma série de vídeo-podcast chamada Conversas pro paraíso, que tem o objetivo de mostrar que, 40 anos depois da descoberta do vírus pelos cientistas, é absolutamente possível levar uma vida normal mesmo com a presença do HIV no organismo. E, ao mesmo tempo, chamar a atenção para o fato de que a Aids ainda é, sim, um grave problema de saúde pública.

“Não se pode romantizar a situação e achar que está tudo bem. É preciso continuar vigilante”, pontua o ator e jornalista Rafael Brito, integrante do grupo Corre Coletivo Cênico e um dos organizadores da série de podcasts que está em seu segundo ano. O projeto, em que cinco entrevistados falam de suas experiências como pessoas com carga viral indetectável surgiu a partir da peça online Para-Iso, criada pelo grupo durante a pandemia para discutir o impacto não apenas do HIV, mas da Covid na comunidade LGBTQIA+.

Uma das premissas do grupo é a necessidade de se falar sobre homossexualidade de forma aberta. “Pensando nisso, criamos este projeto para construirmos novos imaginários afirmativos dos corpos que vivem com HIV, para que possamos combater, por sua vez, estigmas e preconceitos sociais. Queremos potencializar os movimentos de representatividade, validar a presença, atuação e narrativa de gays, bichas pretas e corpos positivos. É reafirmar o direito de existir e amar”, explica Rafael Brito, integrante do grupo. No repertório do Corre, a palavra soropositivo é substituída pela expressão ‘corpo posithivo’, com o h evocando a sigla HIV no meio da palavra.

Outro idealizador do projeto, Luiz Antônio Sena Jr. fala da importância de usar todas as mídias possíveis para desmistificar o vírus. Pesquisas recentes, como a divulgada esta semana no Reino Unido, apontam que há uma maior prevalência de novos casos em homens heterossexuais, por exemplo.

“É preciso furar a bolha e passar informação confiável para todos os grupos sociais”, aponta Luiz. Os bate-papos serão publicados diariamente a partir das 12h nos perfis do Instagram @corre_ba e no canal do coletivo Corre no YouTube.

O preconceito e a estigmatização contra pessoas que vivem com HIV continuam presentes, mesmo muito tempo depois que os cientistas deixaram claro de que a doença não se transmite pelo uso compartilhado de objetos que não sejam perfurocortantes, por exemplo. Lâminas de barbear e tesouras de unha não devem ser compartilhadas.

Mesmo se sentido privilegiado por receber acolhimento da família, Ton conta que repetidas vezes teve que reagir quando algum parente lhe oferecia um sabonete à parte. Sem perder a ternura.

“Mesmo as pessoas que acabam agindo de forma preconceituosa, por falta de informação, precisam do nosso afeto”, explica Ton.

Nem sempre é fácil. Rafael Brito destaca que só teve coragem de contar aos amigos que tinha recebido o diagnóstico depois de três anos. Mas hoje milita para que outras pessoas não tenham que viver com medo.

Um dos desafios das pessoas que encaram a decisão de se mostrar como HIV positivo é, justamente, normalizar a sua existência. Rosaria Piriz, 65 anos, cinco filhos, 14 netos, sem emprego desde o início da pandemia de Covid por ter comorbidades, sabe que vai enfrentar dificuldades adicionais quando tentar voltar ao mercado de trabalho, mas ainda assim banca sua decisão de falar abertamente do tema.

“Ninguém quer dar emprego a quem é soropositivo, mas não me arrependo”, diz ela, uma uruguaia que mora há 33 anos em Salvador e que há 24 tornou-se voluntária do Grupo de Apoio à Prevenção à Aids na Bahia (Gapa).

Isolamento social

Rosaria gosta de explicar coisas e, durante o isolamento social, sente falta de reunir a família inteira para um churrasco, de preparar para seus descendentes um bife à milanesa, de sair para passear com os netos, levá-los ao shopping ou ao parque e contar para eles as atividades em que está envolvida. Na abertura da série de podcasts, ela fala, para quem quiser ouvir, o que se pode fazer para levar uma vida tranquila, desde que se faça o uso da medicação necessária.

Mas, no que diz respeito à vida cotidiana, ela pontua o que torna as coisas mais difíceis para quem depende da medicação, como a carência de médicos na rede pública, a demora para marcação de consultas e o custo de transporte para pessoas pobres. Os R$8,80 gastos na ida e volta até o posto são um fator inibidor para moradores da periferia que estejam desempregados, por exemplo. “Algumas cidades oferecem passe livre para quem faz tratamento, Salvador ainda não”, comenta Rosaria.

No ano passado, a Defensoria Pública do Estado conseguiu que a Justiça concedesse a uma menina de 12 anos, moradora de Camaçari e portadora do HIV, o passe livre intermunicipal para fazer o tratamento em Salvador.

A medicação oferecida gratuitamente pelo SUS inclui a Prep (Profilaxia Pré-infecção de Risco à Infecção pelo HIV e a PEP (Profilaxia Pós-Exposição). A Prep é destinada especialmente a homens que mantêm relações homossexuais, pessoas trans e trabalhadores do sexo. A PEP deve ser usada por pessoas vítimas de agressões sexuais, por quem fez sexo sem proteção e por quem teve o corpo ferido por material perfurocortante ou se expôs a material biológico. Recomenda-se que a PEP seja feita nas duas primeiras horas após a exposição e, no máximo, após 72 horas.

SUS

Comunicólogo e policial militar aposentado, Moysés Toniolo é um ardoroso defensor do SUS e costuma encerrar mensagens com um forte abraSUS. “É necessário ressaltar a importância desse sistema para a população”, afirma Toniolo, uma vítima do preconceito, que foi forçado a se aposentar por ser soropositivo. Desde então, tornou-se um militante contra a discriminação e a favor do tratamento digno dos portadores de HIV.

Ex-conselheiro nacional de Saúde, Toniolo fala no podcast sobre o poder da mídia e como os meios de comunicação abordam o assunto. Sobre isso, Rafael Brito lembra a famosa capa da revista Veja com a foto do músico Cazuza enfraquecido, com a chamada “Uma vítima da Aids agoniza em praça pública”.

Outro convidado do projeto é o professor Ramon Fontes, que estrela o segundo episódio com reflexões em torno das questões de gênero e sexualidade, e também as intersecções entre raça, saúde, território e memória. Sobre a importância de falar da Aids, ele chama a atenção para a importância de campanhas de esclarecimento: “É preciso fazer campanhas ao longo do ano, não apenas no Carnaval e em dezembro”.

No que pese o fato de que, à exceção de Rosaria Piriz, os protagonistas e parte dos idealizadores sejam homens brancos de classe média, Rafael Bastos destaca a importância de se falar para os jovens negros pobres. Isso porque se há 10 anos os brancos eram maioria entre as vítimas da doença, agora, a cada dez novos casos da doença, seis são em pessoas negras, com um aumento de 12,9% na incidência do HIV nesse grupo entre 2019 e 2020. Os dados foram divulgados pelo Ministério da Saúde em dezembro do ano passado.

Segundo o boletim do ministério, a Bahia está entre os cinco estados com menor incidência relativa de Aids, com uma taxa de 10 casos por 100 mil habitantes. Mas quando se analisa apenas Salvador esse índice pula para 22 casos por 100 mil habitantes. No Brasil todo, foram registrados no ano passado 32.701 casos de HIV. Desses, 29.917 desenvolveram Aids.

Multiartistas

Os episódios têm como anfitriões os integrantes multiartistas do Corre Coletivo Cênico: Anderson Danttas, Igor Nascimento, Luiz Antônio Sena Jr., Marcus Lobo e Rafael Brito. A cada episódio, um convidado fala de suas experiências pessoais ou de pesquisas sobre HIV/Aids.

A primeira temporada do Conversas pro Paraíso, no ano passado, contou com oito bate-papos com artistas, pesquisadores, corpos posithivos, jornalistas, entre outros, em que eles falavam a respeito do espetáculo e as temáticas debatidas. Nessa segunda temporada, o formato bate-papo foi transformado no modelo podcast, um estilo de entrevista mais casual que virou febre na internet.

O Conversas pro Paraíso tem apoio financeiro do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura (Prêmio Cultura na Palma da Mão/PABB) via Lei Aldir Blanc, redirecionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal.

Compartilhe essa notícia com seus amigos

Compartilhar no Email Compartilhar no X Compartilhar no Facebook Compartilhar no Whatsapp

Cidadão Repórter

Contribua para o portal com vídeos, áudios e textos sobre o que está acontecendo em seu bairro

ACESSAR

Siga nossas redes

Siga nossas redes

Publicações Relacionadas

A tarde play
O fotógrafo 

e designer Ton Schübber vai falar sobre afetividade
Play

Flixbus é alvo de reclamações por atrasos e serviços precários

O fotógrafo 

e designer Ton Schübber vai falar sobre afetividade
Play

Irmãos Macêdo reúnem fãs e artistas na Concha em festa pelos 50 anos

O fotógrafo 

e designer Ton Schübber vai falar sobre afetividade
Play

Professor de história diz em sala que apoia e admira Hitler: "enorme"

x

Assine nossa newsletter e receba conteúdos especiais sobre a Bahia

Selecione abaixo temas de sua preferência e receba notificações personalizadas

BAHIA BBB 2024 CULTURA ECONOMIA ENTRETENIMENTO ESPORTES MUNICÍPIOS MÚSICA O CARRASCO POLÍTICA