A TARDE BAIRROS
Wish Hotel da Bahia restaura o Painel de Genaro de Carvalho
O primeiro cinco estrelas da capital continua a ser referência de requinte e elegância
Por Letícia Belém
Uma das joias que existem no Largo do Campo Grande que conferem um ar de sofisticação e glamour à região é a existência do histórico Hotel da Bahia, pertencente ao Grupo Wish desde 2013. Recentemente reformado, o hotel se prepara dar início à restauração do mural “Festas Regionais”, do artista- Genaro de Carvalho, que foi pintado diretamente nas paredes internas do atual restaurante “Genaro por Vini” em 1950, reaberto ao público recentemente.
Além de conservar a imensa pintura que ocupa 200 metros quadrados das paredes do restaurante do hotel, tombada individualmente pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) em 1981, o restauro pretende resgatar a vivacidade da obra, avaliada em R$ 10 milhões. O curador das obras de arte do charmoso hotel, que também foi tombado em 2010, Rafael Dantas, adianta que será o maior restauro de um painel circular modernista no Brasil.
“A restauração será feita pelo mesmo artista que recupera a pintura desde os anos 1970, que irá utilizar a mesma técnica de pintura de sua confecção, - a têmpera de ovo - que confere cores brilhantes e vibrantes e durabilidade, não esmaecendo ou escurecendo com o tempo”, explicou Dantas. Ele anunciou que a inauguração da restauração será realizada dentro de cinco meses com uma grande festa, que ainda será divulgada.
Outra novidade para 2025 é o retorno dos grandes bailes de gala e festas que aconteciam no apogeu da fama do hotel, dos anos 50 até os 70. “Foi um pedido da sociedade, principalmente dos moradores mais antigos que se lembram com saudade do período de ouro do hotel. Fizemos um experimental este ano e deu tão certo que, a partir do próximo ano, faremos um baile black tie com toda a sofisticação para recriar o clima dos anos 1950, uma vez ao ano. Será o evento da cidade”, conta Rafael.
O baile experimental que aconteceu há poucos meses contou com piano e violino tocando as músicas da época para um salão repleto de senhores com smoking, camisa branca, calça preta e gravata borboleta, colete ou faixa na cintura, paletó com lapela de cetim, meias pretas e sapato de verniz ou couro, e mulheres de vestidos longos, sandálias de salto fino, joias e engarrafamento na porta. Foi um sucesso.
Dantas, que também é historiador, planeja também incrementar uma programação que já é oferecida pelo hotel, que é o “Café com o Historiador”, para uma experiência exclusiva que é o Jantar com História. No primeiro o público pode, mediante reservar, fazer um passeio guiado contemplando as obras de arte espalhadas pelo imóvel, contextualizadas com a história do hotel e da Bahia e um chá da tarde com o historiador.
Já em 2025, será oferecida uma experiência gastronômica exclusiva e histórica, em que além das receitas dos anos 50 das culinárias indígena, africana, baiana e portuguesa recriadas pelo chef do restaurante, o jantar será oferecido em porcelanas, cristais e baixelas antigas da época de ouro do hotel, que estão sendo resgatadas em antiquários.
O curador explica que tudo isso acontece motivado pelo presidente do grupo Wish, Eduardo Malheiros, que é uma pessoa muito sensível às artes e reconhece a importância histórica e cultural do Hotel da Bahia para o país, tanto é que contratou um curador para o seu acervo artístico. O grupo pretende continuar resgatando e valorizando a arte e a cultura, e planeja ampliar o atual acervo, que já é o maior existente dentro de um hotel no país, recuperando aos poucos as obras de arte originais que se perderam no leilão de 2010.
História
Foi em 1951 que o primeiro hotel de luxo da Bahia foi inaugurado na esquina da Praça Dois de Julho com a Avenida Sete de Setembro, a região mais nobre e urbanizada da época, reduto da elite de Salvador. Gestado desde 1947, o famoso Hotel da Bahia (atual Wish) foi o primeiro cinco-estrelas do estado, idealizado para dotar a capital baiana de um empreendimento hoteleiro de alto padrão, que pudesse hospedar principalmente os turistas estrangeiros, mas também dignamente artistas, pessoas ilustres, políticos e empresários oriundos de outras cidades do país e do mundo.
Segundo conta o historiador Rafael Dantas, em meados do século XX, a Bahia já era um destaque no contexto do turismo internacional e recebia muitos visitantes franceses e norte-americanos. O hotel funcionou como um cartão de visitas para receber o público internacional, e era coberto com o máximo de luxo e glamour da época. Era também reduto de celebridades e palcos de festas e bailes memoráveis da alta sociedade baiana.
“O que diferenciava Salvador do Rio de Janeiro e São Paulo nos anos 1940 é que a cidade conservava uma certa poesia de uma cidade que quase parou no tempo, muito característica da Bahia de Jorge Amado, que chegou a morar no hotel antes de morar na casa do Rio Vermelho. Tanto é que artistas e intelectuais que vieram para cá ficaram encantados”, narrou, citando como exemplos os escritores Jean Paul Sartre, Simone de Beauvoir e Albert Camus.
Dentre os seus hóspedes ilustres, reis e rainhas da Noruega, Dinamarca, Mônaco, Inglaterra e Japão, artistas como Michael Jackson, Mick Jagger e Elton John, todos os presidentes do país, todos os governadores da Bahia, e outros nomes importantes como Assis Chateaubriand, Jorge Amado, Dorival Caymmi, Pablo Neruda, Mário Vargas Llosa, Bill Clinton, Família Rockfeller, Elza Soares, Belchior, Xuxa, dentre outros.
O hotel, segundo Dantas, foi considerado o mais belo da arquitetura modernista do Brasil à época, com repercussão internacional, e chegou a congestionar o aeroporto com tantos voos vindos especialmente para a sua inauguração, inclusive com artistas nacionais e internacionais para participar.
Tombado pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), em 2010, ele já nasceu com importantes obras de arte integradas em mostra de requinte e status: fachada do volume cilíndrico do restaurante, no pavimento térreo, foi revestida externamente por azulejos brancos e azuis com motivos marinhos em alto-relevo, de autoria do arquiteto e artista plástico Paulo Antunes Ribeiro.
Internamente, além do mural “Festas Regionais”, o artista Genaro de Carvalho pintou diversos outros painéis em suas paredes. Dantas conta que durante a sua construção, o hotel sediou o primeiro Salão Baiano de Belas Artes, em 1949, com a presença de artistas brasileiros renomados, repetindo o feito nos dois anos subsequentes.
Em 1951, o térreo do hotel também abrigou o salão, já com importância nacional, com premiação para os mestres da pintura brasileira que tiveram as suas obras expostas ali, a exemplo de Portinari, Di Cavalcanti, Tarsilla do Amaral, Alberto Valença, Juarez Paraíso, Presciliano Silva, dentre outros.
O Hotel da Bahia já nasceu com esse pendor artístico e cultural. O seu acervo artístico tem um valor superior a R$ 30 milhões, incluindo três painéis de concreto do artista Carybé, mais de 300 fotografias de Pierre Verger que decoram todos os apartamentos, 84 gravuras de Calazans Neto, uma mandala de Júlio Espinosa, um mural de pastilhas de vidro de Fernando Duarte que decora a área da piscina e duas esculturas de Tatti Moreno, do orixá Exu e o gradil em aço “Revoada dos Pássaros, além das pinturas de Di Cavalcanti que adornam a suíte presidencial de 300 metros quadrados”, dentre outros.
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