ARTIGOS
Crise climática em debate: as vozes dissonantes que ecoaram na COP30
Delegações e cientistas pedem cautela na transição energética; Disputa sobre a conta de combustíveis fósseis divide países

Por Georges Humbert*

É falsa a premissa de consenso científico consolidado, até porque a ciência exige contraponto e falseamento, e foi contestado o senso de urgência climática que domina a 30ª Conferência das Partes (COP30). Um conjunto de autoridades, cientistas e delegações estrangeiras destoou do coro comum ao questionar o tema, a urgência, os efeitos e a gravidade do que se convencionou chamar de aquecimento global.
Essas vozes, embora minoritárias em plenárias, trouxeram densidade científica e acadêmica para o debate, alertando que o alarmismo está sendo usado como escudo político e econômico para travar o crescimento de países em desenvolvimento, com impactos diretos na mineração, no agro e no setor energético brasileiro.
O ceticismo estratégico e a tensão geopolítica na COP30
Ao longo das sessões, representantes de países reticentes voltaram a defender a tese de que o aquecimento global seria um fenômeno natural e cíclico, não necessariamente agravado, com proeminência, pela ação humana. Essa postura, ao contrário do senso comum que domina as narrativas ambientais, tem base em estudos e fatos seculares e merece atenção, pois o alarmismo é frequentemente utilizado como escudo para impedir o crescimento de nações pobres.
A manutenção de matrizes energéticas intensivas em combustíveis fósseis foi defendida não apenas por interesse econômico, mas também como questão de segurança energética, segurança alimentar, produção de insumos básicos em escala e geração de riqueza para tirar os países pobres da miséria.
O contraponto à urgência e o risco econômico
Houve também autoridades que adotaram uma postura de “ceticismo estratégico”: reconheceram o aquecimento, mas contestaram sua intensidade, urgência ou o papel dos países em desenvolvimento nas metas de mitigação. Discursos pediram mais tempo, mais flexibilidade ou mais foco na adaptação, uma forma indireta de adiar compromissos robustos de redução de emissões.
Outro grupo — dependente da exportação de petróleo, carvão e gás — procurou demonstrar que a transição energética acelerada é “precipitada” ou “economicamente arriscada”, fundamentado em dados mais concretos do que os alarmistas que, no passado, fizeram especulações fracassadas (como a de Al Gore sobre o fim do mundo ou a de que a Amazônia viraria deserto em 2000).
Esses posicionamentos tensionaram negociações técnicas e atrasaram a construção de consensos em temas como financiamento climático e abandono gradual dos combustíveis fósseis.
O fio condutor dominante: abandono de fósseis
Apesar das vozes de cautela, um dos eixos mais fortes da conferência foi a defesa de uma mudança acelerada rumo a fontes de energia limpas. Delegações de mais de 80 países declararam apoio ao plano brasileiro para que o mundo abandone gradualmente os combustíveis fósseis.
Márcio Astrini, da rede Observatório do Clima, ressaltou que “acabar com o uso de combustíveis fósseis” é o verdadeiro teste de credibilidade da COP30. Para esse grupo, o limite de 1,5 °C estabelecido pelo Acordo de Paris corre risco de ser inalcançável sem ações rápidas e verificáveis.
A responsabilização financeira e as contradições
Outra corrente forte em Belém foi a da responsabilização financeira. Países em desenvolvimento cobraram das nações ricas o cumprimento das promessas de financiamento climático. O valor de US$ 300 bilhões anuais prometido está muito distante da necessidade real (estimada em US$ 1,3 trilhão), o que transformou a acusação de que os países desenvolvidos não estão cumprindo sua “dívida climática” em um ponto sensível.
A legitimidade das negociações também foi tema de debate, com a sociedade civil denunciando a presença recorde de lobistas da indústria de petróleo, gás e carvão — mais de 1.600, segundo levantamento da coalizão Kick Big Polluters Out.
O Brasil, país-sede, também esteve no centro dessas contradições. A busca por conciliar desenvolvimento econômico e compromissos climáticos, exemplificada por políticas internas relacionadas à exploração de petróleo e grandes obras, refletiu o dilema global.
A COP30 se configurou, portanto, não apenas como um espaço de reafirmação científica, mas como um palco de negociações políticas complexas: de um lado, a urgência ambiental; de outro, o apelo por prudência, realismo, segurança energética e um financiamento climático justo para as nações mais pobres. O resultado final dessa conferência definirá o ritmo da agenda climática global nos próximos anos.
*Georges Humbert é correspondente de A TARDE na COP30, em Belém.
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