COP30
Nem toda restinga pode ser APP: o julgamento do STJ e a repercussão nacional do REsp 1.827.303/SC
Decisão histórica do STJ encerra insegurança jurídica e confirma que a vegetação de restinga só é APP quando fixa dunas ou estabiliza mangues

Por Georges Humbert; Marcelo Buzaglo Dantas; Lucas Dantas Evaristo de Souza; Monique Demaria

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou, em julgamento nesta terça-feira, 11 de novembro de 2025, o quanto já delimitava a Constituição, a Lei e a melhor doutrina: nem toda restinga constitui Área de Preservação Permanente (APP). Essa tensão institucional e a insegurança jurídica, que assombrava o setor produtivo e elevava o custo Brasil, foi resolvida no julgamento do Recurso Especial nº 1.827.303/SC.
A Corte Superior alinhou-se aos ditames da lei, definindo que a vegetação de restinga só é considerada APP quando exerce funções geomorfológicas específicas, como fixação de dunas ou estabilização de mangues. A decisão, tomada à unanimidade, tem repercussão nacional e confere critérios objetivos para o licenciamento ambiental.
O Histórico da Controvérsia e o Voto do STJ
A controvérsia jurídica teve início com uma Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) contra o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA). O MP pleiteava que fosse considerada APP "qualquer local onde se apresente vegetação de restinga, independentemente da existência ou não do acidente geográfico 'restinga'".
Em primeira instância, o pedido foi acolhido, mas o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) reformou a sentença, reconhecendo a condição de APP apenas quando a vegetação desempenhasse funções ecológicas específicas.
A delimitação legal e o Código Florestal
O MPSC interpôs o Recurso Especial, e a relatora, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, apresentou voto apoiado em dois regramentos do sistema jurídico brasileiro:
- Art. 4º, inciso VI, da Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal);
- Art. 3º, inciso IX, da Resolução CONAMA nº 303/2002.
Dessa forma, a Corte Superior de Justiça confirmou a legalidade, definindo que são consideradas Áreas de Preservação Permanente (APP) as restingas quando:
- Fixarem dunas ou estabilizarem mangues.
- Em faixa mínima de 300 metros, medida a partir da linha de preamar máxima.
O voto da relatora foi acompanhado à unanimidade pelos demais Ministros da Segunda Turma. O entendimento prevalente é que a condição de APP não pode ser ampliada além do que a legislação definiu, sob pena de violação da competência legislativa e do princípio da legalidade.
O grande impacto econômico e federativo
A relevância da tese foi demonstrada pela participação ativa de 12 Estados Federativos (incluindo Bahia, Rio de Janeiro e Espírito Santo) e entidades do setor da construção civil (CBIC, SINDUSCON) na condição de amicus curiae.
A decisão tem repercussão nacional e atinge diretamente políticas públicas e licenciamentos ambientais. O impacto no uso do solo é expressivo:
- Dados Nacionais: O Brasil possui 741.145 hectares de vegetação de restinga.
- Exemplo Local: Um estudo indica que, caso toda restinga fosse considerada APP, a área protegida na Ilha de Florianópolis saltaria de 26,46% para 66,14% do território da ilha.
A decisão do STJ reafirma o desafio de conciliar proteção ambiental, desenvolvimento econômico e justiça federativa. Não se trata de enfraquecer a tutela ambiental (que já está prevista, por exemplo, na Lei da Mata Atlântica), mas de fortalecê-la dentro dos limites da legalidade, da técnica e da razoabilidade, conferindo a tão buscada segurança jurídica.
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