ARTIGOS
O vereador que não votou no próprio nome
Por Jolivaldo Freitas
Pasma! Acredite! Tenha certeza! Deus é mais! Fique sabendo que, a partir de 2025, quando os vereadores eleitos tomarem posse em todos os municípios brasileiros, na sombra deles, assombrando, estarão os mal-assombrados. São mais de 400 suplentes de vereadores que não tiveram um só voto nas eleições. Você então me pergunta com esses olhos arregalados: "E pode?". Pode. O STF disse que pode.
Entenda que atualmente o que seleciona o suplente é o fato de a eleição dos vereadores ser proporcional, ou seja, para se determinar quem é eleito, toma-se primeiro o número de votos de cada partido e calcula-se quantas cadeiras a legenda tem direito de ocupar na Câmara Municipal. Caso um partido eleja dez vereadores, por exemplo, isso significa que os dez mais votados na lista de candidatos dele vão tomar posse do cargo. E o que acontece com as vagas restantes? São distribuídas com base no cálculo da média de cada partido e outras coisitas mais.
Tem mais: para ser eleito, o vereador precisa ter uma votação mínima, equivalente a pelo menos dez por cento do quociente eleitoral, que é a divisão do total de votos válidos pelo número de vagas disponíveis. E os suplentes? Difícil de entender, né? Mas é feito justamente para isso. Político tem parte com o caipora, esconde os rastros. Como dito, a suplência pertence a outros candidatos do mesmo partido, que, pela ordem dos votos recebidos, ficam torcendo para que o avião que leva o titular caia, o cara tenha um piripaque, o barco afunde — o suplente deseja uma vaga arfdentemente sabe que para isso o vereador titular tem de deixar o cargo por bem ou por mal E nada como ganhar um cargo de vereador sem ter feito força. Mas vou lembrar a você que foi o STF quem, ano passado, garantiu que os suplentes não precisam de uma votação mínima. Zero voto vale.
Fique aí pensando que: os caras não tiveram voto, não se mexeram, nem suaram, e, mesmo assim meteram a mão no erário público. Vou te dizer que as campanhas de cada suplente zerado tiveram custo. Boa parte recebeu verba para sua "campanha". No total, foram gastos R$ 363.194 com a campanha dos suplentes. Responda, por favor: "É ilegal?". Claro que não, mas é mais imoral que maluco sem cueca no meio da rua. Moral de jegue.
Para você não dizer que acordei azedo com os políticos, vou contar uma história verdadeira. Quando eu era criança já crescida e morava na Boa Viagem, Cidade Baixa de Salvador, bucólica Península Itapagipe, época de Jânio Quadros presidente, seu Marcelino, um vizinho benquisto por todos, prestativo, emprestava dinheiro sem juros, ajudava idosos a atravessar a rua, carregava compras, batia uma laje, decidiu se candidatar a vereador. Fez uma bela campanha, com jingle e tudo, e o slogan "Marcelino não é doutor; Marcelino é um trabalhador". Quando saíram os resultados das eleições, descobriu que não tinha obtido um voto sequer. Na ânsia da campanha, esquecera de votar em si mesmo. Os dois filhos e a mulher votaram em outros nomes. O pau comeu, e ele cortou relações com a vizinhança. Como se diz na Bahia: "Deus é mais!". Povo é ingrato.
*Romancista e jornalista. Autor de “Histórias da Bahia – Jeito Baiano” e “Baianidade”, dentre outros.
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