SALVADOR
Abandono apaga sítio arqueológico do Centro Histórico

Por Tássia Novaes
Nesse solo sagrado, da velha Sé da Bahia, surge esta praça, que resgata a memória e se insere no contexto de recuperação e revitalização do Centro Histórico de Salvador. Após sete anos, as palavras da placa de inauguração da praça da Sé perderam sentido diante do atual estado de degradação e abandono do local, abrigo de um sítio arqueológico do século XVIII. Cerca de 20 centímetros de mato, além de restos de papel, copos descartáveis e latas de refrigerante cobrem ossadas e outros objetos seculares que remontam o tempo da Bahia antiga.
Revitalizada em 1999, na primeira gestão de Antonio Imbassahy (1997-2000), a praça da Sé foi erguida sobre as ruínas da igreja da Sé Primacial. Para surpresa dos arquitetos responsáveis pela obra, Assis Reis e Márcia Reis, durante as escavações de fundação da praça foram encontradas naquele ano ossadas humanas em urnas funerárias e diversos objetos de uso doméstico. As ossadas pertenciam a índios e escravos que eram enterrados no adro da Igreja.
Com a descoberta, o material, símbolo do cotidiano de Salvador nos século XVIII e XIX, foi mantido intacto e tombado como sítio arqueológico devido à importância histórica. A escavação teve de ser interrompida para preservar o acervo, os arquitetos, inclusive, tiveram que modificar o projeto inicial, explica Wellington Pereira da Silva, superintendente da Superintendência de Manutenção e Conservação da Cidade (Sumac).
Sobre o terreno foram instaladas grades elevadas que permitem a passagem de turistas e demais pedestres pelo local além de possibilitar a inserção à cultura da Bahia, como se fosse um museu ao ar livre. É uma relíquia, ali consta o acervo da igreja, onde várias pessoas foram sepultadas, diz Wellington.
Só que o projeto foi louvável até o dia em que era feito o serviço de manutenção da praça. Nos últimos seis meses, segundo comerciantes do local, o mato alastrou e quase não é possível enxergar o solo debaixo das grades. Ninguém limpa, ficou tudo esculhambado como se fosse um chão qualquer. Parte da história da Bahia, ou melhor, do Brasil foi tapada, diz Antoniel Reis, 39, vendedor de artesanato, referindo-se ao fato de Salvador ser o berço do País.
Devido ao descuido, grande parte das pessoas que circulam na praça, inclusive os turistas, nem imagina estar sobre um sítio arqueológico. De férias em Salvador há uma semana, a estudante norte-americana Kate Rutter, 24, ficou surpresa com a revelação feita pela reportagem. Aqui? Onde? Tem certeza que existe um cemitério debaixo desse mato?, questionou. Após ser informada da importância histórica do acervo, Kate criticou: Por que está abandonado? Assim fica difícil. Pensei que a parte histórica se resumia às construções do Pelourinho.
Já o economista paulista Marcos Pedreira, 42, foi mais irônico. Isso é típico da falta de cultura do brasileiro. Enquanto na Europa as pessoas preservam cada pedrinha que restou do Coliseu, aqui a gente faz questão de passar por cima sem nem saber do que se trata.
Outro desavisado, o vendedor de café, Maciel Santos, 33, também não aprovou o abandono do local. Podiam pelo menos tirar o mato, disse.
Questionado sobre conservação da praça, o superintendente da Sumac disse que a manutenção deveria ser feita pela Limpurb, empresa que recolhe lixo na cidade, mas não entrou em detalhes sobre o descuido do local. Está sujo? Vou mandar limpar, limitou-se a dizer.
A praça da Sé abriga um conjunto arquitetônico formado por ruínas de fundação da igreja da Sé Primacial, um belvedere que funciona como centro cultural e de lazer, dois monumentos, o da Cruz Caída, escultura de autoria do artista plástico Mário Cravo e a estátua do primeiro-bispo do Brasil, Dom Pero Fernandes Sardinha.
Erguida em 1553, a Igreja da Sé Primacial foi demolida em 1933 para implantação do sistema de transporte de bondes, época em que foi consolidada a ligação viária da cidade. Atualmente, o local funciona como um espaço cultural e de entretenimento, como parte do acervo do Centro Histórico de Salvador.
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