CAMPANHA
Ação visa adoção de jovens a partir de seis anos
Diferença entre crianças à espera de família e famílias aptas tem como empecilho a idade das crianças
Por Priscila Dórea

Das 1.033 crianças em lares de acolhimento da Bahia, 113 estão em processo de adoção e 215 estão prontas para serem adotadas, enquanto o número de pessoas disponíveis para adotar é de 1.001, de acordo com o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Infelizmente, essa diferença entre crianças à espera de uma família e famílias à procura de uma criança não tem como empecilho apenas a burocracia do sistema de adoção, mas também a idade dessas crianças.
Dados do SNA mostram que, em 2019, 90% dos interessados em adotar no Brasil buscavam crianças de até 7 anos, enquanto 67% das crianças e adolescentes prontas para serem adotadas tinham entre 7 e 18 anos. Por essa razão o Ministério Público (MP), o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) e a Defensoria Pública lançaram, na tarde da última segunda-feira, a campanha ‘O amor não tem tamanho’, que através de palestras e ações educativas, tem o objetivo de incentivar a adoção de jovens com mais de 6 anos.
“A busca restrita às crianças com menos de 6 anos impossibilita que crianças mais velhas, adolescentes e grupos de irmãos tenham chance, assim como aquelas com deficiência ou alguma doença. A Constituição determina que a criança e o adolescente devem ser prioridades absolutas, então elas devem ser prioridades absolutas do Ministério Público, do Tribunal de Justiça e da Defensoria também”, afirmou a promotora de justiça e coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Crianças e Adolescentes (Caoca), Anna Karina Trennepohl.
Presidente da Organização de Auxílio Fraterno (OAF) - que acolhe 84 crianças, 38 delas com idades entre 6 e 17 anos -, salienta que reconhece que o CNJ junto aos tribunais de justiça, a Defensoria e o MP tentam construir um trabalho que dê mais celeridade ao processo de adoção, mas levanta um questionamento: Depois da criança que precisa ou irá ser adotada ou será retornada ao convívio da família biológica, quem é o outro principal ator do processo de adoção? Para ele, a resposta é fácil: A instituição.
“É a instituição de acolhimento que tem conhecimento a partir do momento em que a criança ou adolescente teve o direito violado. É nela que, através da sua equipe técnica, é feito o acompanhamento da família, do direito da criança de ter atendimento psicológico, pedagógico e assistente social. Além de realizar a visita técnica da família para saber das condições materiais, sociais e psicológicas. Mas onde participamos no momento de adoção? Em nenhum momento”, explica o presidente da OAF.
O resultado disso, afirma Jozias Sousa, é uma audiência com um defensor público legalista que vê o processo na forma fria da lei, e que, mais vezes do que não, toma conhecimento da situação da vida daquela criança ou adolescente, naquele momento. “Muitos se mostram totalmente leigos, porque não conhecem nada, nem o que está no processo, muito menos a vida da criança. E isso, muitas vezes, acaba prejudicando a finalidade do processo, que é a dignidade daquela criança. E isso vale também para profissionais do MP e do TJBA, é todo um grupo que gera esse fator, e ao invés de desburocratizar, burocratiza cada vez mais as adoções”.
Porém, outros fatores também contribuem para o aumento dessa burocratização. É certo que essa burocracia existe como uma forma de garantir segurança para a criança e a família, explica a diretora do Lar da Criança, Iraci Coimbra, mas o aumento da parte burocrática se deve muito mais aos familiares sanguíneos das crianças do que do sistema propriamente dito. “É relativamente comum aparecer uma tia ou uma avó, por exemplo, bem no meio do processo, e quando isso acontece, tudo é interrompido para que a situação seja analisada e resolvida”.
Hoje, o Lar da Criança acolhe cinco crianças com menos de 6 anos e oito com mais de 7, e Iraci destaca que a situação se complica ainda mais quando elas fazem 18 e precisam sair dos lares de acolhimento. Em 1999, quando ela se tornou diretora da organização, encontrar uma forma de se manter apoiando essas, agora adultas, crianças que cresceram no Lar da Criança, foi um de seus primeiros objetivos. A solução? Alugar uma casa onde pudessem viver enquanto começavam a trabalhar e encontravam meios de construir seu futuro.
“Fui muito criticada na época, mas até hoje, mantemos esse mesmo sistema. Nós somos o apoio e a única família que essas crianças têm. E isso deu certo a tal ponto que Defensoria Pública viu a proposta de acompanhamento e junto a prefeitura criou uma república para acolher essas pessoas, mas eles ainda preferem ficar nessa casa alugada, onde estão por eles mesmos, encontrando o rumo de suas vidas”, afirma a diretora.
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