SALVADOR
Amaralina conserva o charme de balneário
Por Valmar Hupsel Filho do A TARDE
Espremida entre os populosos bairros da Pituba, Nordeste de Amaralina e Rio Vermelho, uma faixa de terra plana de cerca de 1,5 km de extensão e duas quadras de largura se insinua de frente para o mar, em meio ao caos urbano, com ares de balneário de férias. O tradicional bairro de Amaralina acompanha o formato da praia de mesmo nome - e na ausência de seus limites definidos, fica a impressão de que ele não consegue se afastar do mar.
Amaralina faz uma referência ao sobrenome Amaral, cuja linhagem descende do comendador Álvares do Amaral, proprietário da antiga Fazenda Lagoa. "Minha família mora neste bairro há pelo menos 150 anos", revela o bisneto Antônio Tadeu Oliveira do Amaral, cujos parentes (e ele, inclusive) dão nome a ruas de Amaralina. O largo onde há aparelhos e ginástica e brinquedos para crianças, à beira-mar, leva o nome de seu avô, João.
A sede da fazenda ficava em um morro, ao lado da praia, numa localização privilegiada.
“Durante a Segunda Guerra, parte do terreno foi tomada pelo Exército para a construção de uma fortificação militar", disse Tadeu Amaral. O local serviu inicialmente para a instalação do 4º Grupamento Motorizado de Artilharia de Costa.
"O mundo estava em guerra, o litoral brasileiro era ameaçado por submarinos e o 4º Grupo foi fundamental para a nação defender seu território", disse o coronel Tadeu Araújo, gestor do Centro de Amaralina. Além do contingente do Comando, o lugar abriga atividades do Exército e um Hotel de Trânsito, onde também são realizados eventos diversos. Mas até hoje a capela da fazenda está lá.
"Amaralina já foi ponto turístico, mas hoje está abandonada". O lamento é do capoeirista Anderson de Jesus, 22 anos, morador do bairro desde que nasceu. A nostalgia é do tempo em que havia apresentações de grupos folclóricos no Largo de Amaralina, em reforma há dois anos. A obra afastou dali os capoeristas, as baianas e, conseqüentemente, os turistas. "Depois disso, já vi baiana catando latinha pra sobreviver" revelou Joselice Batista dos Santos, 36 anos, terceira geração de tabuleiro no Largo.
Das 26 profissionais que existiam ali antes da reforma, ela é uma das únicas que resistem no local onde trabalha desde os 14 anos. Até a década de 50, era ali que, extra-oficialmente, a cidade do Salvador acabava. O hoje conhecido como Largo das Baianas já foi o fim de linha do bonde. "Adiante não havia nada. Quem queria seguir para a Pituba tinha que ir na paleta", lembra o aposentado, Ernani do Lago, 81 anos, 40 deles no bairro.
Seu Ernani lembra do Cine Amaralina, no tempo em que as ruas eram de barro. E que para ir à praia ver as famosas pescarias de xaréu, era preciso vencer um caminho cheio de quixabeiras e pés de cansanção. A pesca, no entanto, já não é mais a mesma. E não está no mar o motivo da queixa dos pescadores.
”Este ano colocamos o presente para Yemanjá e ela aceitou", revelou o pescador Romário Oliveira da Ressurreição, 47 anos, ressaltando que a entrega do presente à Mãe D'água, em Amaralina, acontece tradicionalmente no segundo domingo de janeiro.
O problema, segundo Romário, está na ausência de uma sede para a colônia Z1 de Amaralina para dar suporte aos cerca de 120 pescadores. A casa que existia, utilizada para proteger equipamentos e motores de pesca, foi derrubada em setembro de 2006 com a promessa de que uma outra, melhor, seria reconstruída. Os pecadores ainda aguardam.
Enquanto isso, são obrigados a carregar por quilômetros os motores de barco até a praia durante a madrugada. "A gente ainda é parado pela polícia", disse Romário . Além disso, não há salva-vidas na praia de mar revolto. “Deixamos de trabalhar para dar socorro às pessoas“, conta o pescador, que já presenciou dezenas de afogamentos.
Apesar da cadência praieira, Amaralina cresceu diante dos olhos de moradores antigos, como seu Ernani, e hoje abriga um comércio vibrante, faculdades, trânsito intenso nas duas avenidas principais (Amaralina e Visconde de Itaboraí).
Até se arrisca a ter vida noturna. A farra rende até tarde no inusitado bar onde durante o dia funciona uma casa de pedras. O local é freqüentado por boêmios que buscam ali a saideira e comidas "leves" como sarapatel e maniçoba, além do papo com garçons, verdadeiras "figuras" e cheios de histórias.
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