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Amo a história de Salvador: soteropolitano usa internet para contar história da cidade

Publicado segunda-feira, 29 de março de 2021 às 06:00 h | Autor: Gabriel Andrade
Luciano resolveu compartilhar sua paixão por Salvador com a página "Amo a História de Salvador" | Foto: Acervo pessoal
Luciano resolveu compartilhar sua paixão por Salvador com a página "Amo a História de Salvador" | Foto: Acervo pessoal -

Salvador, que é a primeira capital do Brasil, atrai muitos olhares e admiradores não só no seu aniversário, que é comemorado nesta segunda-feira, 29. O soteropolitano como Luciano Bahia, mais conhecido como Louti Bahia, fala sobre a cidade o ano todo.

Na realidade ele não só é apaixonado pela cidade como decidiu compartilhar isso, com a página Amo a História de Salvador. Desde de 2014, quando a página foi criada, já conta com 61,1 mil seguidores no instagram e 76 mil no facebook.

Ele explica que sua ligação com Salvador e com a Bahia é de profundo amor. “Sou daqui e meu sobrenome de família é Bahia mesmo. Além disso, minha família paterna veio do Recôncavo, de Cachoeira, e minha família materna também tem ligação com a região”, conta Louti.

“Hoje eu vejo que nasci e vivi mergulhado na história de Salvador. As festas do largo do Santo Antônio, da Lapinha e da Soledade; o desfile de 2 de julho que passa na esquina da minha rua; bater um baba no Quartel do Barbalho; tudo isso sempre fez parte da minha vida”, continua.

Apesar dessa ligação, ele conta que nem sempre foi atento à história da cidade, que completa 472 anos nesta segunda. “Só mais tarde, a partir dos 17 anos, quando comecei a estudar Arquitetura na Ufba é que a ficha começou a cair e a ligação emocional se consolidou”, explica.


Entre aulas de história da arquitetura, a ligação emocional se consolidou e aconteceu a química. “Tive que largar arquitetura e acabei me formando em propaganda, atuo como redator publicitário há 20 anos. Porém, em 2006 a paixão pela cidade falou mais alto e voltei a estudar arquitetura conciliando o tempo com o trabalho e o casamento”, conta.

E foi nessa segunda fase que ele começou a aprofundar o estudo sobre Salvador e a pesquisar imagens antigas nos arquivos públicos e privados. Nesse tempo, Louti já conseguiu reunir mais de 4 mil imagens, fez passeios guiados pela cidade e, recentemente, lançou o curso Retratos da História.

Para este aniversário, Luciano deseja que cada soteropolitano faça contato com seu sentimento de pertencimento e com a sua identidade cultural. “Precisamos sentir que Salvador é nossa, não é do poder público e nem de grupos empresariais. Salvador pertence a todos os baianos e brasileiros porque foi a primeira cidade e a primeira capital do Brasil”, diz.

“A história de Salvador é a história dos nossos antepassados negros, brancos e indígenas. Precisamos conhecer e internalizar essa identidade cultural para ativar o sentimento de pertencimento. Só assim seremos verdadeiros guardiões da nossa história e da nossa memória. Só assim vamos conseguir parar a destruição do nosso patrimônio arquitetônico, histórico e ambiental”, completa.

Confira a entrevista completa:

Primeiro queria que me contasse sobre sua relação com a cidade? É soteropolitano? Sempre gostou ou descobriu seu amor pela cidade um pouco depois?

Minha ligação com Salvador e com a Bahia é realmente uma ligação de profundo amor porque sou daqui e meu sobrenome de família é Bahia mesmo. Além disso, minha família paterna veio do Recôncavo, de Cachoeira, e minha família materna também tem ligação com a região. Vivi quase a vida inteira no Barbalho, um bairro histórico, e então a Soledade, a Lapinha, o Santo Antônio Além do Carmo, a Baixa dos Sapateiros, a Saúde, o Pelourinho, o Dique do Tororó, etc, sempre fizeram parte do meu dia-a-dia.

Hoje eu vejo que nasci e vivi mergulhado na história de Salvador. As festas do largo do Santo Antônio, da Lapinha e da Soledade; o desfile de 2 de julho que passa na esquina da minha rua; bater um baba no Quartel do Barbalho; tudo isso sempre fez parte da minha vida de uma forma absolutamente natural. Quando eu era uma criança ou adolescente, eu não tinha a percepção da importância histórica desses lugares.

Só mais tarde, a partir dos 17 anos, quando comecei a estudar Arquitetura na Ufba é que a ficha começou a cair e a ligação emocional se consolidou: eu via os professores de história da arquitetura e história das cidades me ensinando sobre estes lugares que eram tão meus, tão vivos para mim, mas eram tão distantes dos colegas que moravam nas áreas mais novas da cidade. Aí aconteceu a química.

Eu tive que largar a arquitetura e acabei me formando em propaganda: atuo como redator publicitário há 20 anos. Porém, em 2006 a paixão pela cidade falou mais alto e voltei a estudar arquitetura conciliando o tempo com o trabalho e o casamento. Foi nessa segunda fase que eu comecei a aprofundar o estudo sobre Salvador e a pesquisar imagens antigas nos arquivos públicos e privados.

Já consegui adquirir mais de 4 mil fotos que uso no Instagram, no Facebook, em vídeos que produzo e publico no Youtube e também uso nas aulas do curso online Retratos da História que criei nestes tempos de pandemia. O curso substituiu o Passeio na História, uma aula de campo que eu fazia antes da pandemia levando as pessoas para conhecer a área antiga de Salvador.

Consegue eleger o seu lugar favorito de Salvador? Aquele que você se sente em casa, que renova suas energias...

Amo muitos lugares da cidade, mas meus lugares favoritos são o Santo Antônio Além do Carmo e o Farol da Barra. Não consigo desempatar essa disputa entre os dois. O Santo Antônio além do Carmo faz parte da minha infância, juventude e vida adulta. A minha vida tem ligação íntima com o lugar, com o largo, com a vista do pôr do sol dali, com o forte, a igreja, a Cruz do Pascoal.

Meus avós paternos moraram na Rua Direita. É um lugar onde realmente me sinto em casa porque daqui do Barbalho para lá desço uma ladeira e subo outra. Já o Farol da Barra, onde sempre adoro caminhar e fazer exercício, é uma lugar mágico para mim. O pôr do sol é um espetáculo. A mistura entre história e beleza natural do lugar me deixa entorpecido. Acho que tem a alma de Salvador ali muito forte.

Sempre gostou de história também? Como começou a explorar a história de Salvador?

Outro dia eu estava me dando conta que sempre adorei estudar história na época do colégio e da faculdade e fechei provas discursivas. Tirar 10 em prova aberta de história, só mesmo quem gosta de mergulhar no conteúdo. Muita gente pensa que sou historiador, mas não sou.

Respeito muito essa profissão e o conhecimento que estes grandes homens e mulheres nos transmitem com livros, teses, artigos maravilhosos. Porém, meu olhar sobre a cidade é baseado na minha nova área de atuação: não concluí o curso de arquitetura mas como eu já tinha outra graduação concluída e cursei mais da metade de arquitetura, me habilitei para duas pós-graduações.

Hoje sou especialista em Desenvolvimento Urbano e também em Planejamento Ambiental. Com estas duas especializações concluídas, fui realizar uma pesquisa pessoal na Europa, centrada na Itália. Entre 2014 e 2015 morei 10 meses em Florença/Itália conhecendo e estudando as Cidades Slow, um movimento que me encanta. Também conheci Findhorn, a primeira ecovila do planeta, localizada na Escócia. Eu me considero um Pesquisador de Cidades porque é isso que eu faço, é o tema que amo.

Como elas surgiram, como se desenvolveram, quais seus grandes méritos e grandes problemas. Muita gente não percebe que as cidades são lugares reais. O estado e o país são abstrações, mas a cidade é algo físico, palpável, perceptível. É onde a gente vive e interage com a nossa nação.

Muita gente também não sabe que a cidade foi uma invenção humana: o ser humano criou a cidade, um lugar para reunir tudo o que ele precisava para viver. Antes delas, éramos nômades, não tínhamos ligação com nenhum lugar.

Meu amor pela história de Salvador, a minha cidade, fica ainda mais forte com o meu amor pelas cidades. Como eu poderia estudar as cidades pelo mundo sem me aprofundar no conhecimento da minha cidade, das minhas raízes? A história de Salvador faz essa ligação com minha missão de vida e me dá energia e substância para pesquisar no mundo inteiro.

E a ideia da página? Queria que falasse um pouco sobre como isso começou

A ideia de criar a Amo a História de Salvador surgiu justamente quando eu estava longe da cidade, morando em Florença/Itália. Aconteceu em 2014. Desde 2006, quando voltei a estudar arquitetura, eu já postava no Facebook as fotos antigas de Salvador que eu encontrava. Eu escrevi sobre a história dos lugares e meus amigos e familiares adoravam.

No período em que fui pesquisar Cidades na Europa eu comecei a postar imagens de Salvador diariamente e meu perfil pessoal ganhou uma cara nada pessoal rsrs. Então criei a página Amo a História de Salvador e para minha grata surpresa o amigo Samuka Marinho me enviou de presente a marca e o estudo de cores e tipologia.

Quando voltei pra Salvador, durante seis meses, eu investi em pesquisa dentro de arquivos públicos e privados e consegui encontrar e comprar mais de 4 mil fotos antigas. Aí a página foi ganhando conteúdo e crescendo. Lembro que quando eu consegui 1000 fãs fiquei super feliz e agora vejo a página com quase 140 mil fãs.


Para mim, é muita coisa, é muita gente porque o tema é história, não é besteirol, não é nudez, não é sexo, temas que atraem público mais facilmente. E não faço impulsionamento pago nem no Facebook nem no Instagram: minha página é absolutamente orgânica, não tem perfis ali para dar número: são pessoas reais que segurem porque gostam do conteúdo e interagem diariamente comigo. E eu sempre entrego a elas o meu olhar de urbanista sobre o desenvolvimento da cidade.

Trabalho basicamente quatro aspectos na minha pesquisa: história, memória, identidade cultural e pertencimento. Acredito, de verdade, que levando a história de Salvador a mais e mais pessoas eu posso fazer meu trabalho de formiguinha para criar uma nova mentalidade, um novo sentimento de amor pela cidade que seja importante para a defesa do nosso patrimônio histórico e ambiental.


Quando eu dizia isso antes de criar a página, parecia uma utopia para muita gente. Agora com quase 140 mil pessoas lendo o que escrevo, me ouvindo nas lives, fazendo o curso Retratos da História e o Passeio na História comigo, não há dúvidas que o meu sonho não é utópico e já está se realizando.

Milhares de pessoas acompanham o trabalho que faz, você já lançou cursos, vídeos... esperava ter esse alcance falando de história? Eu acho 140 mil fãs no Facebook e Instagram, um número muito expressivo exatamente porque o tema é história. Não esperava ter esse alcance pois não é fácil atrair um público tão segmentado.

Eu acho que além das fotos antigas que são sensacionais, a página cresce porque eu produzo séries especiais em fotos ou em vídeos, eu uso o meu conhecimento e experiência como redator publicitário para dar criatividade à página. Procuro dar um traço autoral aos textos e estimular a memória afetiva/emocional das pessoas. Uso textos em baianês: dois deles circularam pelo mundo recentemente. Um sobre a Fundação de Salvador e outro sobre a Independência da Bahia, no dia 2 de julho.

Também crio e ofereço experiências sensoriais como o Passeio na História, uma aula de campo que dura 4 horas pelas ruas do centro da cidade; e o curso online Retratos da História, que tem 5 módulos de 2 horas cada e eu faço uma viagem no tempo pela história da cidade através de centenas de fotos antigas que fazem parte da minha pesquisa. E eu envio todas para os alunos: eles podem postar e reenviar, sem problemas.

Salvador tem uma história muito rica, mas acha que as pessoas conhecem pouco a história da própria cidade?

A história de Salvador é genial. Claro que não tem só beleza, tem coisas tenebrosas como a escravidão, por exemplo. Mas é uma história consistente de uma cidade que foi um dos principais entrepostos do planeta até o século XIX. Para ilustrar essa importância, eu sempre cito que Charles Darwin esteve em Salvador a bordo do navio Beagle e pesquisou a nossa Mata-Atlântica. Escreveu em seu diário que aqui encontrou a mais rica diversidade entre as matas tropicais que já havia visitado. Voltou a Salvador mais duas vezes e participou até do carnaval que antes acontecia no Largo do Theatro, atual Praça Castro Alves.

Então, Salvador fez parte da pesquisa que deu origem à Teoria da Evolução das Espécies formulada por Charles Darwin. Isso dá a dimensão da importância da nossa cidade no planeta. Precisamos conhecer essa história, resgatar essa importância e usar a favor da população através do turismo que pode crescer muito e gerar mais empregos e renda.

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