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Após 74 anos, petróleo volta a agitar moradores de Lobato

Publicado quinta-feira, 24 de janeiro de 2013 às 22:51 h | Atualizado em 24/01/2013, 22:54 | Autor: Luana Almeida
famíla do lobato encontra petróleo
famíla do lobato encontra petróleo -

O ano era 1939. Munidos de alçapões, dois jovens percorriam as ruas do bairro do Lobato, subúrbio de Salvador, em busca de passarinhos. Ao montar uma armadilha no mato, perceberam que a vegetação estava manchada por um óleo consistente, de cor preta.

A história, contada e recontada muitas vezes na localidade,  foi a primeira lembrança que veio à cabeça do pedreiro Edvaldo Silva, 24, ao encontrar, no início da semana passada, uma tubulação que vazava um líquido preto, na obra onde trabalhava.

A demanda da dona de casa Tereza Barbosa, 57, que o contratou, era simples: retirar o barro do quintal para, posteriormente, construir mais um quarto para a mãe, de 83 anos, e ampliar a cozinha.

Por conta da substância misteriosa que surgiu sob o barro do chão, a obra teve que ser paralisada. Em pouco tempo, a casa tornou-se o local mais visitado do bairro. Após 74 anos de descoberto, o petróleo voltou a ser assunto na comunidade.

Era início da tarde de segunda-feira quando a filha da dona Tereza, Daniela Barbosa, 27, teve seu descanso da tarde interrompido pelos gritos do pedreiro. Pela janela do segundo andar da casa, ela visualizou uma cena que até então, permeava somente em seu imaginário.

"Cresci ouvindo várias histórias de pessoas que encontraram petróleo no Lobato. Quando saí na janela para atendê-lo, vi os pedreiros com as mãos sujas de preto e pensei 'mas logo na minha casa?", contou.

A primeira atitude de Daniela foi ligar para a mãe, que estava em São Roque do Paraguaçu, distrito do município de Maragojipe, sua cidade natal. Nervosa, mal conseguia contar o ocorrido.

Ao ouvir as palavras da filha, dona Tereza decidiu retornar imediatamente. Já no bairro, ao apontar na esquina da Rua Getúlio Vargas, onde reside, sentiu o forte cheiro de combustível e atestou "é petróleo, meu Deus!".

Sem valor - Inicialmente pensou tratar-se  da  "providência divina" e lembrou de quando foram instaladas  as primeiras sondas para a retirada do petróleo no Lobato, durante o governo do presidente Getúlio Vargas, em 1939.

À época, encontrar um poço de petróleo no quintal de casa era o sonho de muitos moradores do bairro. Vizinhos, que preferiram não se identificar, contam que muita gente mudou de vida após encontrar petróleo em seus terrenos.

Mas, para dona Tereza, o achado está longe de ser um presente. "Não durmo direito. Estou assustada, tenho medo que aconteça uma explosão e coloque em risco a vida de minha família e dos vizinhos", desabafou.

A dona de casa diz não estar interessada em lucrar com o poço. E não seria mesmo possível: segundo as primeiras análises dos técnicos da Agência Nacional de Petróleo (ANP), é impossível explorá-lo pois trata-se de um vazamento em um poço há muito desativado e, como outros localizados na região, extintos e encobertos por aterros. De acordo com a assessoria de comunicação do órgão, as reservas "não apresentam volume de óleo significativo".

A ANP deu o diagnóstico sobre a misteriosa substância,  entretanto,  os vários técnicos que continuam transitando pelo quintal mantêm viva  a esperança da família. "Estão fazendo muitos testes. Acho que vão avaliar e, depois, voltar aqui e explorar. Não estamos querendo faturar com isso, mas, se acontecer, será bem-vindo. Somos uma família simples", afirmou Clóvis Barreto, 58, marido de dona Tereza.

Interdição - A tão almejada mudança no padrão de vida por dona Tereza parece estar longe de chegar. E também o sonho de se ver a mãe instalada em um quarto maior. Segundo informações da ANP, técnicos continuarão visitando o local e somente após análises do material e do terreno, o vazamento será contido.

Enquanto homens de fardas laranja e capacetes  deixam pegadas de barro e óleo na cerâmica branca da cozinha da família,  o neto de dona Tereza, David Willian, 4, acompanha os passos dos técnicos da ANP.

Ele se diverte entre a lama negra do fundo do quintal e as pedras da obra.  Ao contrário de muitos garotos do Lobato, que apenas escutaram casos a respeito do petróleo, David terá sua própria história para contar.

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