MEMÓRIA
Arte e elegância marcaram trajetória de Lola Suarez
Figura respeitada na história da presença espanhola em Salvador partiu aos 96 anos, último dia 6
Por Jade Santana*
“Eu quero ficar no vento”. Com a alma livre, como todos os artistas, Luzdivina Seabra Andion, ou Lola Suarez, antes de falecer, pediu para a filha que suas cinzas fossem espalhadas na terra de origem, Gaxate.
Natural da vila espanhola, imigrou com a família para a Bahia com apenas 6 anos, sendo a mais nova entre os irmãos, e aqui se tornou um dos nomes de destaque na história da colônia espanhola em Salvador. A baiana-galega, que chegou ao estado ainda na década de 1930, participou da consolidação da presença sociocultural da comunidade que migrou da Galícia.
Desde muito jovem já tinha veia artística e, assim, conseguiu, junto ao marido, Manuel Suarez (Manolo), promover a ascensão da comunidade espanhola na Bahia por meio da arte, em locais como o centro cultural Caballeros de Santiago e o Clube Espanhol. Lola também constituiu família na cidade, mãe dos empresários baianos Carlos, Mário e Manuel, além de Ana Maria e Fátima Suarez, esta bailarina e coreógrafa, tendo criado, em 1990, a Escola Contemporânea de Dança, com apoio e participação da mãe como sócia.
Lola, que morreu na última segunda-feira, aos 96 anos, inspira não só familiares e amigos, como toda a comunidade espanhola a relembrar sua contribuição cultural.
Para Jackson Noya Costa Lima, médico que a acompanhava há anos, ela era o centro das atenções da família. Não de uma forma ruim, afinal, após o falecimento do marido, ela assumiu a liderança. Dedicada à família, transparecia muito cuidado e preocupação com todos. “Alguém que quando você conhece, jamais vai esquecer, muito admirável, sempre ajudando, produtiva, ativa e impressionante. Mesmo com a idade avançada, nunca parou de fazer o que gostava”, diz o médico.
Além da arte, Lola gostava de pessoas e foi fácil se adaptar à sociedade baiana – e fez isso a partir da cultura. “Muitas pessoas foram ao velório. Foi lindo, tivemos muita gente diferente também, de todas as classes sociais, uma diversidade mostrando a aceitação que ela tinha com todas as pessoas”, relembra Fátima.
“Uma forma de o imigrante estar ligado com sua terra e sua comunidade é através da cultura. Meu pai e minha mãe sempre foram pessoas muito ligadas à cultura. Ainda jovens eles promoveram, na década de 40, a Semana de Cervantes. Foi a primeira vez que os galegos tiveram uma semana com apresentações em Salvador. Eles sempre festejavam muito esse momento, foi mesmo a inauguração cultural da comunidade espanhola aqui”, lembra Fátima.
Para a filha, foi a Bahia que fez Lola descobrir que era artista e a ajudou a apurar o senso estético. Além de atuar na produção de espetáculos, apresentações e festas, ela também cantava, era ceramista, fazia arranjos de flores e costurava. Dos 31 espetáculos da Escola Contemporânea de Dança até hoje, 30 tiveram figurinos comandados por Lola.
O espetáculo de número 31, que teve estreia ontem, foi o primeiro em que Lola não esteve envolvida. De fato, era tão respeitada e querida que tinha um secto de costureiras que sempre pedia opinião sobre os figurinos, e como o pai havia trabalhado de alfaiate, Lola sempre tinha uma presença e uma voz muito marcantes nos processos criativos em que se envolvia.
Como sócia, Fátima conta que Lola resolvia tudo, não existia dificuldade para ela e, se tinha problema, na hora ela dava um jeito. Bem crítica, “se gostava ou não gostava, opinava”, relata. Em paralelo ao desenvolvimento como artista, também se descobriu professora e, ao juntar as duas paixões, também começou a transmitir conhecimento prático sobre os diferentes tipos de arte.
“Minha mãe teve a vida dedicada ao bom gosto, à elegância, à beleza, a educar as outras pessoas. E ela tinha muito prazer em fazê-lo. Tem gente que nasce com isso. É um dom”.
* Sob a supervisão do jornalista Luiz Lasserre
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