SALVADOR
Com ar rural, Cassange necessita de melhoras com urgência
Por George Brito, do A TARDE
Pela estrada do Cia-Aeroporto chega-se à altura da casa de retiro Quinta Portuguesa e vira-se à esquerda, no sentido Simões Filho. Depois, é chão de barro a perder de vista, com matagal, sítios e casebres espaçados pelas margens, em um cenário tipicamente rural. Seja bem-vindo a Cassange, povoado que bem há pouco tempo, com a elaboração do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) de 2007 de Salvador, ganhou status de área urbana, passando a ser bairro, lotado, inclusive, em Zona de Proteção Ambiental (ZPAM).
É que este lugar está em área rica em mananciais, rodeado pelas represas Ipitanga I e II. Fonte de água não falta por ali. Curiosamente, os cerca de seis mil habitantes ainda penam, aos moldes de um cotidiano peculiarmente rural, com baldes na cabeça andando até quatro quilômetros para conseguir o líquido vital.
Em Cassange, a Embasa ainda não deu o ar da graça. Por lá, água encanada mesmo só pela rede improvisada há 17 anos por companheiros do cunhado de Alzira Fernandes, 54 anos. Ela virou a “Embasa” de lá. Controla a distribuição e, para se ter direito, paga-se uma taxa mensal entre R$ 5 e R$ 10.
O encanamento só chega mesmo a duas casas, mas o líquido, à disposição em torneira privada embora em via pública, chamada de “chafariz”, tem capacidade para abastecer cerca de 60 famílias. “Se não fosse Alzira, ia ser difícil ter água”, afirma Cristiane Silva de Oliveira, 28 anos, que desde os 2 mora em Cassange e costuma guiar todos os dias seu carrinho de mão com meia dezena de baldes cheios.
CORRESPONDÊNCIAS – Com luz elétrica a comunidade já conta. E é possível encontrar sítios com piscina e até lugar onde se pode alugar DVD. São rasgos da modernidade urbana na localidade, que guarda, no geral, o clima e a composição das antigas três fazendas que a delimitavam: Tapera, Raposo e Cassange. Tal divisão ainda persiste no imaginário dos habitantes e também nas correspondências.
A líder comunitária Rosenice Souza, 36 anos, diz que “agora as fazendas viraram uma coisa só”, cujo nome passou a ser Cassange. Mas, na conta de luz, o endereço é Fazenda Tapera, São Cristóvão. Já subindo ou descendo poucos metros pela região, moradores dizem que moram em Tapera, em Raposo e Cassange.
As três fazendas, que foram loteadas no mínimo há mais de meio século, eram de propriedade de negros, segundo Antônia Souza, 74 anos, mãe de Rosenice, a líder comunitária. Ela mesma, conta, é neta do antigo dono da Fazenda Tapera, Cândido Ferreira. “Trabalhei desde os 15 anos tomando conta do sítio, que era de meu avô e dos irmãos dele. Fazia de tudo. Eram todos negros, e nos reuníamos sempre. Me lembro bem, o dono de Raposo era Querino”, conta Antônia, puxando o passado da memória.
Só fosse a falta de água para a população o problema de Cassange já seria gravíssimo. Mas na lista dos anseios da comunidade entram ainda educação, transporte, lazer, saneamento básico e segurança. Desde janeiro deste ano, a comunidade vem, com apoio do Ministério Público Estadual (MPE), tentando articulação com órgãos estaduais e municipais para resolver os problemas do bairro. Na próxima terça-feira, 14, inclusive, os líderes comunitários apresentarão na Secretaria Estadual de Desenvolvimento Urbano (Sedur) as propostas da comunidade para melhorias em todos os segmentos.
São da Sedur os números que atestam a precariedade do lugar comunidade. Entre os seis mil habitantes predominam pessoas com até o 1º grau. Há duas escolas em Cassange, a Juarez Rocha, da prefeitura, e a Edvaldo Pereira, de Lauro de Freitas.
A líder comunitária Rosenice Ferreira, com apoio da comunidade – R$ 15 de cada pai – faz trabalho de alfabetização junto a 28 crianças de 2 a 6 anos de idade, como forma de atenuar a falta de estrutura. Além da grave condição educacional, Cassange enfrenta também a violência, com índice elevado de assaltos na região. O transporte é outro entrave. Nem sempre a única topic passa no horário, e aí se vai a pé, por quilômetros.
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