SALVADOR
Fantoches da Euterpe luta para manter história
Por Luana Almeida

Na mitologia grega, Euterpe é a musa da música e do prazer. Foi sob a permissão dela que três gerações de boêmios se divertiram em um dos clubes sociais mais tradicionais da capital: o Fantoches da Euterpe, no largo Dois de Julho.
Fundado em 1884, há 131 anos, ele é referência no Carnaval da capital baiana e foi o pioneiro nos desfiles de rua, com carros alegóricos, fantasias e eleições de rainhas da festa.
No entanto, a história ficou apenas na memória. O espaço, antes frequentado pela alta sociedade baiana, encontra-se hoje em processo de decadência.
Nos arcos construídos nos moldes da arquitetura colonial, ainda preservados, faltam pintura e reboco. No chão, o piso original já não possui o mesmo brilho.
De acordo com o diretor social, Reginaldo Santos, o Fantoches acumulou, ao longo dos anos, cerca de R$ 90 mil em dívidas de impostos com o Predial Territorial Urbano (IPTU), o que impediu que fossem realizadas reformas.
No ano de 2013, o local teve a licença para funcionamento cassada por conta da ausência de um plano de segurança e isolamento acústico, exigidos pela Secretaria Municipal de Urbanismo (Sucom).
"Como estamos impedidos de realizar eventos, não temos como arrecadar dinheiro para cumprir as devidas exigências da Sucom, muito menos de quitar as dívidas", disse o diretor.
Desde 2013, o clube realiza apenas pequenos eventos, que tem parte da bilheteria revertida para o pagamento das contas de água e luz, além de salário dos dois funcionários que ainda trabalham no local.
"Ainda contamos com alguns sócios. No entanto, eles não contribuem mais financeiramente, pois o clube não oferece mais atrativos como antes", completou.
Hoje, a presidência busca patrocínio para que o clube seja transformado em um memorial do Carnaval de Salvador.
"Não queremos deixar a história do clube morrer. Nada mais justo que ver a história do Carnaval reunida em um dos locais em que a festa nasceu", disse o presidente do clube, Roberval Cidreira.
Amor sem fim
À frente da presidência do Fantoches desde 2013, o aposentado Roberval Cidreira, 71, nutre um carinho especial pelo clube há 50 anos.
A primeira vez em que pôs os pés no piso de ladrilhos vermelhos do local, ele tinha 20 anos. "Foi amor à primeira vista", contou.
Era Carnaval quando foi convidado por amigos para ir ao clube. Cidreira estava solteiro e se animou com a possibilidade de conhecer as mais bonitas garotas da cidade.
"O clube era famoso por reunir meninas da alta sociedade, todas muito bem-vestidas e arrumadas. Quando entrei, não quis mais sair. Depois disso, não passei mais um Carnaval sem ir ao Fantoches", brincou.
A folia teve que ser interrompida quando Cidreira casou. No entanto, o amor pelo clube permaneceu. Hoje, muitas vezes, ele banca, com o próprio dinheiro, pequenos consertos e reformas urgentes.
Para não deixar de frequentar aquele que foi palco das aventuras da juventude, a aposentada Iraildes Magalhães, 77 anos, decidiu montar um grupo de dança de salão no local.
Os ensaios do grupo acontecem, diariamente, no salão onde dona Iraildes dançava, aos 16 anos, com as paixões da adolescência.
"Foi a forma que achei de relembrar, com saudade, do passado e manter esse lugar maravilhoso sempre vivo", contou, saudosa.
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