SALVADOR
Lugar de criança é no museu
Por Andreia Santana
Museu no dicionário: local onde se guardam peças antigas que contam a história de um povo, país ou época. A explicação, apesar de correta, não é atraente para crianças. Pensando assim, a pedagoga Susan Murray transformou a casa onde morou há 20 anos, no bairro de Patamares, em um espaço diferente, imaginado para pessoas com um metro de altura, curiosidade maior que o mundo e que não se satisfazem em ver os objetos, precisam pegar e sentir.
O Museu For The Children, criado há seis anos, parece a oficina do professor Pardal, o personagem da Disney que é cientista e inventor. Nos cômodos da casa e até no jardim e quintal, brinquedos se misturam a fósseis de verdade, sucata, réplicas, âncoras de navio e peças realmente antigas, como um telefone de parede, a máquina registradora do tempo em que a moeda do Brasil era o mil réis e a carteira escolar da vovó.
No ambiente informal, planejado para crianças entre três e oito anos, que não conseguem ver nada sem esticar as mãos, o lúdico dialoga o tempo inteiro com o conhecimento. Crianças nessa faixa etária tem grande curiosidade e descobrem o mundo a partir do toque e das brincadeiras, diz a pedagoga.
Filha de norte-americanos, Susan Murray nasceu no Brasil, mas se mudou para os Estados Unidos com menos de dois meses de vida, só retornando ao país de origem depois de sair da universidade. Foi quando ainda morava nos EUA que pensou em criar o Museu For The Children.
Segundo ela, nas cidades americanas existem muitos museus criados para atender a curiosidade infantil e projetados para que cada objeto traga ao mesmo tempo uma lição e muita diversão.
Por ter sido criada nos Estados Unidos, Susan faz questão de reforçar os laços com a língua inglesa. No museu, espaços e peças do acervo são acompanhadas de explicações em português e em inglês. Na biblioteca, que parece a sala de uma casinha no campo, livros nos dois idiomas podem ser manuseados pela garotada, que participa ainda de sessões de narração de histórias.
A regra é fazer a criança ouvir, mas também contar aventuras à sua maneira. Na antiga casa da pedagoga, a única negativa é para a violência. Não vale bater no colega, não vale discriminar. Mas fora isso, vale tudo. Pode tocar em tudo e tirar tudo do lugar, enfatiza Mônica de Souza Aguiar, amiga que coordena o museu junto com Susan.
Cinza de vulcão, ossos e fósseis
Logo na entrada da casa/museu, o fetiche da criançada, dinossauros de brinquedo, divide o espaço com réplicas de esqueletos originais desses grandes répteis e com fósseis legítimos, dentes de tubarão e cinzas do vulcão Santa Helena, situado na Califórnia (EUA).
Uma geringonça inventada por Susan e que só funciona se duas crianças manusearem ao mesmo tempo, ensina sobre leis da física como a força centrípeta. Outra engenhoca, cheia de círculos, fitas, tubos e coisas de puxar e apertar estimula a coordenação motora nas crianças mais novas. Um diapasão, por sua vez, mostra aos mais velhos como o som se propaga.
Mas no laboratório empírico da pedagoga Susan Murray, muitos objetos também saem da imaginação infantil, como a caixa que guarda lixo (embalagens plásticas, de vidro e metal). A idéia é encher a caixa com terra e acompanhar a degradação desses objetos, o que demora pelo menos 50 anos, no caso do plástico. É uma forma de ensinar sobre preservação ambiental. Mas a idéia aqui não é ficar dando explicações para as crianças, nós as deixamos à vontade, para descobrirem o mundo em volta.
Uma sala atrai a atenção de adultos e crianças. A Bubble Room (sala de bolhas de sabão) possui invenções que possibilitam que uma criança construa uma parede inteira de bolinhas ou que simplesmente seja envolvida por uma bolha gigante, como se estivesse dentro dela. Os pais disputam com as crianças para entrar na bolha gigante, revela Mônica.
No jardim, junto a brinquedos de parque como o balanço, uma teia de cordas faz os meninos se sentirem Homem Aranha por um dia. No quintal, a caça ao tesouro (escavar ossos de dinossauro em um terrário) vira motivo para mais histórias. A sensação das sensações, porém, é uma coisa bastante comum, mas que faz falta principalmente para crianças criadas em apartamento: uma árvore enorme e cheia de galhos para escalar, que ora vira montanha, ora o navio pirata. Fico impressionada como muitas crianças aprendem a subir em árvores aqui porque no dia-a-dia não tem essa oportunidade.
Solidariedade e cidadania
Mesmo sendo voltado para crianças dos três aos oito anos, o museu For The Children também abre espaço para a turma dos nove aos 12. Os mais velhos formam um clube de amigos que, em animadas oficinas, ajudam na confecção dos brinquedos para as crianças menores.
Atualmente, a turma está empenhada em construir uma casa de bonecas para enviar de presente a uma creche em Ipirá, no interior da Bahia. Campanhas para arrecadar alimentos para a manutenção tanto dessa creche quando de entidades sociais de Salvador também mobilizam os amigos do museu, muitos deles estudantes de escolas particulares.
O For The Children, enfatiza Susan Murray, nasceu de uma iniciativa particular e não conta com subsídio público ou de empresa privada. A sucata que serve para construir brinquedos é doada por amigos. Mas, mesmo assim, o museu dá sua contribuição social e organiza visitas para crianças atendidas por creches e orfanatos. A pedagoga faz questão que as visitas das crianças abrigadas em lares sociais ocorra junto com turmas de escolas particulares.
Todos são iguais e a diferença existe apenas na conta bancária. Para as crianças mais ricas é importante conhecer e brincar com as mais pobres, principalmente para que essa geração cresça sabendo que quem tem menos não nasceu para servir quem tem mais, defende a idealista Susan.
Saiba mais
Museu For The Children
www.forthechildren.museu.org.br
Tel: (71) 3367-0790/ 3461-3456
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