SALVADOR
Ong que castra animais de graça pode ser despejada por falta de dinheiro
Por Mariana Mendes
Gatos e cachorros da Ong Célula Mãe estão prestes a ficar desabrigados. A instituição, que funciona há cerca de dois anos em uma residência na Rua José Seixas Filho, Loteamento Parque São José, no bairro de Cajazeiras, em Salvador, está para ser despejada do imóvel alugado, já que o proprietário quer vendê-lo. Sem recursos financeiros, a Ong, que castra animais de rua gratuitamente e ajuda a fazer o controle populacional, não tem condições de comprar o imóvel e tem até o dia 30 para se mudar. Em frente à casa, uma placa de vende-se e um número de telefone para contato confirma o interesse do proprietário em desfazer-se do imóvel.
"Tínhamos a preferência da compra, mas não temos dinheiro. Tentamos financiamento nos bancos, mas não conseguimos. Além disso, o imóvel valorizou quase que o dobro. Se não tínhamos dinheiro para comprar antes, agora ficou ainda mais difícil, e o proprietário quer a casa. Ele até deu o prazo com antecedência, nós é que não tivemos condições de sair. Ele disse que o imóvel já foi vendido", conta Janaína Rios, uma das fundadoras da associação, criada em 2006.
Hélio Rubens, irmão do dono da residência, Edson Matos, e à frente das negociações da venda da casa, confirmou o prazo que a Ong deve deixar o espaço e informou o valor da oferta: R$ 100 mil. Segundo ele, o irmão já quer vender a casa há algum tempo e não há interesse que o comprador seja os responsáveis da instituição. "Temos respeito pelo trabalho que elas fazem e sabemos que é importante, mas a vizinhança está incomodada. Os moradores acham que a Ong não está no lugar adequado. Muitas pessoas reclamam do barulho e do mau cheiro que os animais deixam", diz.
Questionado sobre a possibilidade se esticar um pouco mais o prazo para a Ong deixar a residência, Hélio Rubens acredita que o pedido seja negado: "Eu acho meio difícil, mas só ele poderia dar uma decisão sobre isso. O prazo foi dado bem estendido e já foi prorrogado algumas vezes. Ele pediu o imóvel por volta de seis meses atrás", conta.
Ong - A casa, que atualmente conta com cerca de 40 animais, serve de lar temporário e centro pós-cirúrgico dos animais castrados. "A Ong não é um abrigo de animais. Aqui temos animais que se recuperam da castração e alguns que encontramos doentes ou feridos na rua, tratamos e colocamos para adoção ou devolvemos à comunidade", explica Janaína.
Atualmente, a Ong sobrevive de doações e realiza a castração graças a uma verba repassada pela Secretária de Saúde do Estado da Bahia (Sesab), conforme convênio firmado em junho de 2010. De acordo com Janaína, a Sesab disponibilizou a quantia de R$ 245.554,56, dividida em duas parcelas (junho de 2010 e julho de 2011), para a cobertura exclusiva dos gastos com o procedimento. "Com o valor compramos o material cirúrgico, pagamos três prestadores de serviço para cuidar dos animais e pagamos a taxa de castração às clínicas conveniadas, que varia de R$ 50 a 90 reais, a depender do porte do animal. O valor é quase que simbólico, levando em conta o que as clínicas cobram", disse. A Ong tem parceria com duas unidades, Clínica Vilas do Atlântico, em Lauro de Freitas, e a 4 Patas, no Bonfim. O valor cobrado pelas clínicas particulares em Salvador varia de R$ 400 a R$ 1.300.
Fora o dinheiro do convênio com o Estado, a Ong Célula Mãe conta com doações para funcionar, o que não costuma ser muito fácil de se conseguir. O aluguel do imóvel custa R$ 400, além do custo com material de limpeza, alimentação dos animais, produtos de higiêne, e muitas outras coisas. "Na maioria das vezes tiramos no nosso próprio bolso para manter a Ong e continuar o projeto", relata a fundadora.
Dificuldade - Se a Ong ficar sem residência, além do projeto ser interrompido, não terá como o convênio com o Estado ser renovado. "Quando a gente for tentar renovar o acordo, teremos de prestar contas. Se o trabalho for interrompido e não tivermos uma sede, a possibilidade disto acontecer é mínima, quase zero", diz Janaína.
A fundadora da Ong criticou a burocracia dos bancos para emprestar dinheiro às Ongs. "Eles pedem tanta coisa, que acredito que poucas possam conseguir. Estivemos em vários e continuamos sem dinheiro".
Solução - Para solucionar o problema da sede, Janaína conta que ela e as demais administradoras da Ong já encontraram um terreno, na mesma região, que daria para ser construído o Canil. A área custa R$ 15 mil, mas elas só poderiam comprar e construir dentro de um período de 8 meses. o prazo seria o tempo que Janaína acredita ser necessário para batalhar a arrecadação de fundos e conquistar parceiros.
"Seria ótimo se conseguíssemos ir para lá. Mas, não temos nem esse dinheiro para comprar. Ainda teriamos que buscar doações de material de construção para fazer os canis e gatis. Isso não se consegue de uma hora para outra", lamenta.
Controle - A castração é uma forma de controle populacional dos animais, principalmente dos que vivem nas ruas. Com o valor do convênio do Estado, do segundo semestre de 2010 até agora, a Ong Célula Mãe já conseguiu realizar cerca de três mil cirurgias de castração.
A cirurgia, feita em cães e gatos, fêmeas e machos, para impedir que se reproduzam sem controle, também é feita gratuitamente pelo Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), vinculado à Secretária de Saúde de Salvador (SMS). No entanto, o órgão só realiza o procedimento em animais domiciliados, ou seja, com residência ou responsáveis. "O animal ter um dono é uma prerrogativa para que seja feita a cirurgia", disse o sub-gerente administrativo do Centro, Marcelo Almeida.
O CCZ, segundo Almeida, tem como prioridade os cuidados com a saúde pública e não com os animais que vivem nas ruas. "Cerca de 80% dos animais que vivem nas ruas têm donos. O problema é que na hora da obrigação, os responsáveis não aparecem. Nenhum animal brota na rua do nada", disse. O Centro realiza cerca de 250 castrações por mês, ou seja, 3 mil por ano. o número ainda é considerado pequeno, segundo Almeida, e deve ser aumentado a partir do próximo semestre deste ano para 290 procedimento/mês.
Há quatro anos o CCZ não captura animais das ruas. O órgão só é responsável por vacinar e castrar cães e gatos, mediante uma regulação feita na coordenação de saúde ambiental. "O que também fazemos é conscientizar a população do bem estar animal, alertar sobre a importância da vacinação e das responsabilidades que o dono deve ter".
Estima-se que 60 mil animais estejam abandonados nas ruas da cidade. Por lei, a ação configura maus-tratos e está sob penalidade, de acordo com o Art. 32 da Lei de Crimes Ambientais - Lei Federal nº 9.605 de 1998.
O CCZ trabalha na prevenção, controle e diagnóstico das zoonoses urbanas como dengue, raiva, leishmaniose e leptospirose. O órgão está subdividido em: controle de roedores; controle da profilaxia da raiva; controle de vetores (prevenção de doenças transmitidas por hospedeiros); e laboratórios de diagnósticos de zoonoses (doenças de animais transmissíveis ao homem).
Janaína Rios acredita que o abandono dos animais é motivado por duas razões: falta de impunidade aos responsáveis e falta de política pública para atendimento veterinário para animais em que os responsáveis sejam moradores de baixa renda. "Muitas famílias que não tem condições financeiras de cuidar dos animais doentes acabam abandonando-os na rua, como forma de garantir a saúde da própria família", diz.
Para solicitar o serviço de castração do CCZ, basta ligar para o número 160 e se cadastrar com os dados pessoais, além de emitir informações do animal, ou para o Disque Saúde, por meio do número 136.
Serviço:
Célula-Mãe - Fanpage no Facebook
E-mail: [email protected]
Telefone: (71) 3303-6715
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