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Política Pública em Debate: Qualificação é desafio para Uneb e pagas

Da Redação

Por Da Redação

29/08/2009 - 18:33 h

Desafios, conquistas e aspectos da história recente do ensino superior na Bahia são temas da segunda edição do projeto Política Pública em Debate, que traz à audiência do Grupo A TARDE entrevistas que aprofundam o olhar sobre temas diretamente ligados à vida da população. A pró-reitora de graduação da Universidade Estadual da Bahia (Uneb), Mônica Torres, e o diretor da Associação Baiana de Entidades Mantenedoras do Ensino Superior (Abames), Marcelo Rocha, foram entrevistados, quarta-feira passada, pelos jornalistas Luiz Lasserre, Biaggio Talento, Edson Rodrigues e Valmar Hupsel Filho. Mônica, pedagoga, mestre em educação pela Universidade Federal da Bahia, assumiu a pró-reitoria na Uneb em 2006. Rocha, médico, representa gestores de entidades da rede privada no ensino superior.

A TARDE – qual o maior problema enfrentado pela Uneb, no momento?

Mônica Torres – A Uneb é uma universidade multicampi, com 29 departamentos em 24 municipios e poderia dizer que é uma universidade jovem (26 anos de criação). Participou e participa da democratização do ensino superior no interior. Instalar departamento, com unidade gestora, em cidade com menos de 100 mil habitantes, traz muitas desafios para a gestão desta logística acadêmica e administrativa. A Uneb sempre foi muito propositiva na criação de cursos de graduação e acabou se expandindo muito na oferta de cursos. Em 2004, foram 26 cursos novos e, em 2006, começaram as aulas destes cursos. O grande desafio, desde o início da gestão, tem sido a estruturação com qualidade da oferta destes cursos. Outro desafio que a universidade enfrentou, a partir de 2006, é ampliar a oferta de ensino de pós-graduação e número de pesquisa. São os dois grandes desafios.

AT – Para crescer da forma que quis, imagino que foi preciso muita verba.

MT – Quando estes cursos foram criados não houve uma aporte de orçamento, na época, para dar conta da estruturação deles. Tivemos cursos de áreas muito caras, como os da área de farmácia, fisioterapia e direito, que são desafios para resolver nesta gestão e estamos trabalhando para isso. Temos algumas coisas em vista para a estruturação. Afinal de contas, desde 2006 estamos negociando com o governo esta condições para estruturação e já temos sinalizações positivas. Mas, os problemas decorrentes da não-contratação de professores e a não-estruturação tem dado muita dor-de-cabeça.


AT – A Abames é como se fosse um sindicato das faculdades particulares?

Marcelo Rocha – Não chega a ser um sindicato. A Abames representa 32 faculdades na Bahia, as maiores e umas poucas do interior. A quantidade de faculdades no Estado é bastante elevada. Temos mais ou menos 50 na capital e 152 no Estado (A TARDE confirmou 114 licenciadas pelo MEC). A Abames tem como objetivo congregar e defender os interesses das faculdades e batalhar pela qualidade e programação de professores. Não existe um sindicato formado de faculdades privadas ainda. As faculdades estão ligadas isoladamente ao sindicado das escolas privadas.

AT – Quais os principais problemas enfrentado, e que devem estar sendo agravado neste ano de crise econômica?

MR – Não tenha dúvidas. Seria legal que a gente fizesse um rápido retrospecto dessa expansão que estamos falando aqui do ensino superior e lembrar este aspecto. Na Bahia em 1997 existiam basicamente sete instituições de nível superior citando as três universidades públicas, Federal, Uneb, Católica e mais quatro particulares somente. Daí em diante, o governo federal, prevendo que o Brasil estava em último lugar na América Latina, por causa do número de alunos que tinham acesso ao nível superior, passou a estimular uma política de expansão para crescer esse número. Em 1999 nós tínhamos apenas um milhão de alunos no Brasil inteiro, de todas as universidades do Brasil inteiro, isso significava cerca de 2% da comunidade de jovens da população. Na Argentina já tinham 30%, nos Estados Unidos significavam 60% da população de jovens com faixa etária entre 18 e 25 anos, que deveriam ter terminado o curso básico e estar no ensino superior. O Brasil estava reduzido a menos de 2% e foi feito, então, nessa época, quando foi lançado o Plano Nacional de Educação por um ministro, na segunda etapa do governo de Fernando Henrique, o Paulo Renato, em que foi feito um planejamento de 10 anos, prevendo que no ano de 2010 deveríamos ter, no mínimo, 10 milhões de alunos no ensino superior. Este plano está completamente defasado, nós temos, hoje, a um ano desse período, 4,8 milhões, de acordo com o último censo feito pelo Inep, isso está abaixo de 50%. Continuamos abaixo de toda a América Latina, percentualmente falando, se citarmos a Argentina, nosso vizinho mais próximo, com 30% hoje. Foi aí que começou a expansão que, no Brasil, foi vista como um bom negócio, pois antigamente as escolas de nível médio e superior tinham uma ligação muito forte com a figura do educador, mas, daí em diante, foram abertos diversos grupos que viram uma oportunidade de fazer investimento.

AT – Houve programa de incentivo fiscal? O que motivou essa criação?

MR – Não. Abriu a possibilidade, franqueou as possibilidades. O governo federal abriu essas oportunidades porque antigamente só podia se fazer uma instituição de ensino superior se fosse uma associação ou fundação sem fins lucrativos. Em 1997, tinha uma série de dificuldades porque, antigamente, antes de 1997, a aprovação de uma escola particular ou de ensino superior demorava seis, sete anos, para ser aprovada. Hoje em dia, o processo está reduzido a um ano e meio, dois anos no máximo. Algumas escolas que precisam de mais recursos demoram dois anos, em média. Com esta facilidade começou a expansão do alunado, a grande oferta possibilitou uma maior procura dos alunos, mas as classes que ocupavam o ensino superior eram A e B. Quando abriram a oferta de vagas, estas foram ocupadas por outras classes sociais, a exemplo da classe C. A expansão está acontecendo na classe C.

AT – Então, a Abames identifica como público majoritário essa classe?

MR - Identifica, mas isso não é só a Abames, as estatísticas estão aí, os estudos do Inep ( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) estão mostrando isso, até que veio um programa chamado ProUni (já no governo Lula), que conseguiu colocar as classes D e E no ensino superior, a última etapa do crescimento está ai. O ProUni concede bolsa total ou parcial, a maioria tem bolsa integral, para os alunos da classe D e E. Em 2007/2008, o crescimento foi estabilizado nas estatísticas.

AT – Isso é curioso porque o ano de 2008 foi considerado um ano econômico excepcional.

MR - O problema é o seguinte: candidato tem, não tem é quem pague. Acabou a capacidade de pagamento da classe C, que pode ir e pagar seus próprios estudos mesmo trabalhando. Hoje, a tendência é total de cursos noturnos. A procura básica dos estudantes é o horário noturno, trabalham de dia e estudam à noite para poder financiar o próprio estudo. Acabou a capacidade de pagamento, esse ano o agravamento não foi isso: desde 2007 nós já vimos que começou a estabilizar o crescimento, quando eu disse que nós temos 4,8 milhões de alunos e estamos 50% abaixo do que deveria ser, estou mostrando isso. Deu um crescimento rápido e parou porque faltam fontes de financiamento, só existe uma fonte de financiamento que é o Fies. O Fies era um crédito administrativo, com Ministério da Educação, mas financiado pela Caixa Econômica Federal, mas observamos que o aluno tem medo de se endividar com o banco, tem medo de pegar o financiamento porque a inadimplência está se tornando insuportável. Todas as faculdades tem esse problema sério.

AT – Fazendo uma interpolação com a Uneb, que não é paga, já que o senhor identificou ou ratificou essa impressão que a gente tem que os números do Inep mostram, que o público C, majoritariamente nessa área, e D e E entrando também de uns anos para cá. Na Uneb, como a senhora definiria o público, o perfil econômico do estudante?

MT – Olha, a gente tem um marco antes do sistema de cotas, em que pese a gente achar que a Uneb pela sua estrutura de Campi, desde a sua criação vem favorecendo no interior do Estado a inclusão de jovens que jamais teriam a oportunidade de entrar na universidade pelas questões de localização, de moradia, de dificuldades econômicas, ela vem absorvendo isso ao longo dos 26 anos da história da instituição, depois do sistema de cotas a gente tem absorvido um número grande de estudantes oriundos de escolas públicas acentuando mais ainda radicalizando mais ainda essa digamos assim a política de inclusão de jovens de classe C e D, óbvio que ainda temos os cursos que concentram os estudantes das classes A, B, alguns cursos que têm mais procura nessas classes também na universidade. Mas, pela própria política da universidade e a partir do momento que ela assume essa política de cotas para afrodescendentes e para índios a gente começa a admitir mesmo que essa inserção, a política de democratização para essas classes. Já desde a origem a gente já reafirma isso, nós temos história de pessoas que jamais teriam condições de ter feito uma universidade se a Uneb não estivesse estado lá, a mil, 800 km daqui da capital.

AT – Esse aluno de classes C e D, ele precisa de algum financiamento para se manter, para não sair da universidade?

MT – Então, outro desafio também é a permanência. Em que pese as instituições privadas terem democratizado o acesso e a ampliação do número de vagas, mas a democratização e a ampliação do número de vagas não garante a permanência dos estudantes não é, porque de fato mesmo o estudante em uma instituição pública ele precisa se manter. Nós temos uma preocupação, mesmo, com a questão da política de assistência estudantil, a universidade tem uma proposta já aprovada pelo conselho universitário, e tem uma proposta de criar uma pró-reitoria de assistência estudantil mas já temos a manutenção de diversas residências universitárias onde têm os departamentos porque os departamentos da Uneb por incrível que pareça eles se situam em uma cidade do interior mas eles absorvem estudantes de 10, 15 cidades dali da região próxima, que não tem condição de permanecer na cidade sede do departamento. Então a universidade já tem hoje residências na maioria dos departamentos, na maioria essas residências são alugadas e o projeto é a construção de residências estudantis e aí vem na fila restaurantes universitários e outras demandas que os estudantes colocam de apoio. Existem também apoios, como bolsas de monitoria de ensino, nós saímos em 2006 de 100 bolsas de monitoria de ensino para 350 e de extensão também. Saímos de um número maior um pouco para 350 bolsas de monitoria de extensão hoje, que são bolsas que têm uma proposição que o aluno realize um trabalho na área de ensino ou de pesquisa ou de extensão e ele é remunerado por isso, ele recebe uma bolsa-auxílio que o ajuda a manter na universidade também, além de ter um outro espaço de formação muito interessante além da sala de aula .

AT – Esse número é muito significativo, professora, em termos percentuais?

MT – Não, é um número ainda muito aquém do universo do número de matrículas, não sei nem se chega a 1%. Nós temos um número de matrículas que beira a casa dos 28 mil matrículas, mas isso inclui a pós-graduação, educação a distância , os programas especiais que um deles é o de formação de professores, que a gente tem um número de matrículas grande. Mas, na graduação de oferta contínua no vestibular em torno de 16 mil matrículas e para este universo, para onde as bolsas são destinadas o número ainda é muito pouco, mas a gente se debate aí com a questão do financiamento das universidades. Outras atividades vão sendo financiadas, a participação deles em eventos também tem o apoio da universidade como uma forma de qualificar a formação mas também dar um apoio nas atividades a que eles teriam muita dificuldades em realizar.

AT – Uma pergunta para os dois, sobre esta questão do alunado, tanto de um quanto de outro. Como é que vocês veem esta questão da má preparação dos alunos para a rede particular e na Uneb, que se reflete no funil do vestibular das instituições públicas?

MR – Primeiro fazer uma reflexão sobre quando a professora estava falando sobre o nível de qualidade dos alunos da universidade estadual em si, eu queria comparar e fazer referência ao aluno do ProUni que está na escola particular, na instituição de ensino superior particular. O ProUni colocou 100 mil alunos por ano, desde a sua criação. Tem hoje 450 mil alunos no Brasil inteiro. Este número, nós temos trabalhos específicos que observam que existe evasão razoável de alunos do ProUni que têm bolsa integral, mas ele não tem capacidade de manutenção própria, não tem o dinheiro necessário para o transporte coletivo nem para a sua manutenção básica. Existe evasão do ProUni com bolsa total em razão da falta de capacidade econômica.

AT – Existe um número preciso?

MR – Não, esse número depende ainda do trabalho do Inep, que eles estão fazendo, mas já publicaram que existe isso. Tanto assim que já existe algumas bolsas de manutenção e que eles estão querendo expandir esta bolsa de manutenção para o aluno ProUni. Já existe esta bolsa mas é muito limitada, mas eles querem ampliar isso para o aluno continuar. Quanto à questão de vestibular, a observação é a seguinte: a universidade federal tem o quê? Tem 50 mil candidatos, quem tem mais candidatos é a Uneb, tem 60 mil, quer dizer, dentro do nosso Estado, para 4 mil vagas, então o vestibular é sério e seletivo mesmo. Como é que vai selecionar 20 para 1? As outras então, o que é que está acontecendo agora com o ensino particular? Há excesso de vagas. Nós estamos na maioria dos cursos com 50% de ociosidade, 50% de vagas sem preenchimento, mesmo com o ProUni. O ProUni é uma compensação de impostos, não é pagamento, quem faz o cálculo é o próprio ministério, é o próprio Inep. A instituição fornece o seu faturamento anual e ele faz o cálculo que é 10% de bolsa. O governo federal calcula em cima do seu faturamento 10% do valor para que sejam distribuídas bolsas e nisso ficam essas 100 mil bolsas nacionais. Essa é uma troca, uma compensação do Finsocial, PIS e imposto de renda, que fazem a compensação do pagamento das bolsas. Então, tem limite. O governo federal não injeta dinheiro nenhum acima disso. Ele calcula, você informa o seu faturamento. No vestibular em si, a única regra que existe hoje é a prova de redação. É obrigatório você ter uma prova de redação e ter o resto que você completa dentro do limite. A tendência de hoje é você ver o número de questões que abrangem a disciplina básica do curso médio, e estão divididos, as escolas também têm o direito de usar esta divisão no seu vestibular.

AT – É mito ou verdade que muitos alunos não estão preparados para receber os conteúdos do ensino superior e que isso os desestimula? O nível dos cursos de graduação das universidades particulares é mais baixo ou é mito?

MR – Eu não concordo com isso, que seja mais baixo. A evasão está na formação do ensino básico. O aluno quando chega no ensino superior vê uma realidade diferente da que ele espera. Ele não está sendo preparado corretamente no ensino básico. O vestibular é só para você ter uma avaliação de conhecimentos gerais do aluno. Hoje, as provas convergem para conhecimentos interdisciplinares e uma redação porque você tem de provar que sabe escrever.

AT – A provocação é esta: isto quer dizer que os alunos menos preparados pelo ensino básico, ou seja, que não conseguem acessar as escolas de ponta, pagas e caras, vão parar nessas escolas do ensino privado e isso gera um aluno menos qualificado para ser formado na graduação? Isso é uma regra?

MR – Não, porque você pode ver: o Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) tem mostrado que tanto os alunos da escola particular quanto da escola pública têm desempenhos bons. O aluno que vem de uma classe menor, muitos alunos estão com o desempenho muito bom dentro do Enade, então prova que têm capacidade.

AT – Então, é possível, ao longo da formação nas escolas particulares superiores, compensar esta má formação do nível básico? O profissional que sai de lá é do mesmo nível de uma Ufba, Uneb? Vocês teriam de ter a capacidade de compensar esta formação não muito boa?

MR – O aluno que vem mal formado, sem nenhum conhecimento, não passa em nenhum vestibular, porque ele fica logo na prova de redação, é uma condição básica. Eu já fui em um congresso internacional que os americanos diziam que só precisavam ensinar a língua mãe e matemática. Se você ensinar isso, o indivíduo vai aprender. As escolas preparam a parte técnica.

AT – Quando o ensino superior vira um negócio, há vagas ociosas e, se não houver aluno, o negócio fecha. Não há o risco de o aluno ser admitido mesmo com uma redação ruim?

MR – No nosso projeto pedagógico há que obedecer princípios de qualidade. O Sinaes (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior) nos avalia e ainda temos três programas de avaliação interna, autoavaliação e reconhecimento, pois o ministério faz renovação de reconhecimento das escolas. Isso é feito junto com a nota do Enade, que tem sido um princípio de avaliação da qualidade da escola. Eu não respondo pela imagem do empresário que aplica provas simples para obter candidatos. A instituição que eu represento não faz isso e recomenda que não seja feito, chamando muito a atenção de que temos de cumprir as normas, com o objetivo de levar a qualidade.

AT – A pergunta está direcionada à Uneb, sobre qualidade, evasão e levando em consideração que tem o lado que vai para as particulares mas tem um lado que é compatível com a Uneb, por que ? Porque a Uneb está em várias cidades do interior da Bahia, cidades cujo ensino muitas vezes não tem muita qualidade. Fizemos uma matéria com a menina que passou em primeiro lugar pelas cotas e ela passou no geral também, ela não tinha necessidade disso. Existe algum tipo de avaliação de se saber se de fato, que era a queixa de quem era contra as cotas, de que iria diminuir o nível das universidades ou não se constatou isso?

MT – Não se constatou isso. Depois eu chego nesta resposta aí. Sobre a questão da qualidade, existe um índice de evasão que ainda está sendo quantificado mas ele se apresenta em nosso edital de matrícula especial, em cada semestre a gente oferece um número X de vagas ociosas da universidade para matrícula especial , que é uma sinalização das vagas que foram ou abandonadas pelos estudantes que estão na universidade ou não preenchidas no vestibular e que para a gente se aproximaria um pouco do nosso primeiro percentual de evasão. A gente tem hoje no acúmulo destes 26 anos, as vezes a gente oferece 1,5 mil vagas no edital de matrícula especial para todos os cursos de Uneb em funcionamento. Mas, a gente tem pensado em evasão como uma coisa muito mais complexa mesmo. Não está associado somente a questão da renda, tem alguns fatores que acabam dificultando esta permanência. Na universidade a gente tem uma pesquisa em andamento sobre evasão nos cursos da Uneb, esta pesquisa ainda não está pronta mas a gente sabe que pela complexidade do tema a gente tem a possibilidade de ter evasão porque o aluno fez uma escolha precoce do curso, em todo o Estado. Então, hoje, cada vez mais os alunos estão fazendo vestibular mais cedo, 16, 18, 19 anos, e esta escolha nem sempre está muito bem definida entao as vezes o aluno entra no curso e ele descobre lá no terceiro semestre que era uma outra coisa. Uma outra razão que também pode contribuir para isso é a questão mesmo do turno das ofertas de cursos. Muitos cursos na oferta do diurno tem dificuldade de permanência por que muitos têm de trabalhar também e acaba contribuindo para esse número de evasão. E o outro são os formatos dos currículos, agente tem avaliado que isso também pode contribuir para isso. No caso da Uneb a gente já teve uma reformulação curricular que afetou cerca de 70% dos cursos que a gente tem hoje. Esses currículos estão mais flexíveis tão atendendo as diretrizes curriculares que traz alguns princípios de flexibilidade de uma formação mais integrada. Nós estamos dizendo isso porque, às vezes, um currículo mais rígido, que tem muito pré-requisito, acaba segurando o aluno que perde uma matéria e acaba por não avançar. Então, as reformulações e as novas tendências de formação, com mais flexibilidade, e tende acabar com os pré-requisitos em atenção aos currículos que valorize experiências vividas na universidade e passam a contar para o currículo oficial. Nós temos hoje em todos os currículos de licenciatura 200 h de ACC (atividades científico-culturais), que é vivido fora da universidade, a participação em eventos que ele comprova, a instituição certifica e reconhece afinidade desse evento com a formação. Como a Uneb tem 137 cursos e a maior parte dessa oferta, 96 de licenciatura, nos podemos dizer que hoje oferecemos nossos currículos nesse formato. Não temos pesquisa, mas queremos acreditar que eles vem contribuir para que o aluno são seja retido por conta dos pré-requisitos. Uma das coisas que aconteceu com essa reformulação foi exatamente a quebra do pré-requisito. São questões que estamos pensando hoje. Na Uneb a gente pensa que pelo fato de ser aluno do interior ter também haver com a renda muitos estudantes desistem, pois não podem permanecer no município sem estar num departamento da Uneb. É por isso que temos praticamente em todos os departamentos a residência. Elas também são poucas e não dão conta de absolver todos. Isso obviamente tem contribuído. Um estudo feito pela comissão de ações afirmativas diz justamente o contrário. Os alunos do sistema de cotas, tem desempenho igual ou melhor, que alunos não optantes. Isso é uma surpresa até por que na época da aprovação existiam essas posições e questionamentos de que a universidade iria ter um número de grande de evasão sobretudo nesse universo do sistema de cotas. O que não se comprova, não é verdade. Quando um aluno que sai do ensino médio de uma escola pública e vai para uma universidade seja pública ou privada, existe uma ruptura de um universo de uma forma de vivenciar do ensino médio que passa ele a ter que se adaptar a um novo universo acadêmico. Então você tem rupturas epistemológicas por que eles passam a ter/ele vêem o conhecimento de um jeito no ensino médio e dentro da universidade começam a ter uma outra visão das áreas de conhecimento, do entendimento da realidade, são rupturas também sociais e políticas, passam a ter uma compreensão mais crítica. Então são várias rupturas que eles passam a ter que vivenciar quando entram numa universidade, seja publica ou privada. Isso tem de ser tratado por todas as instituições, isso tem de ser acolhido. Temos de acolher de fato esses estudantes que vem de um universo de formação diferente. As vazes mesmo de uma instituição privada, boa, é muito diferente do que ele vai vivenciar a partir do primeiro semestre. O contato com o conhecimento, organização acadêmica, vai exigir dele uma adaptação que alguns alunos terão mais dificuldades, principalmente os de classes mais baixas, principalmente também com a linguagem. Os alunos de classes mais altas têm acesso a teatros, a cinema, até pela origem familiar e isso amplia esse universo. Quando ele chega reconhece mais fácil esse mundo acadêmico e por vezes os alunos que vêm de escolas públicas vêm com muito mais dificuldades. A universidade entende que a gente não pode avaliar esses produto naquele momento. A gente acha que isso pode chegar em um ou dois semestres, não seria uma adaptação perdida, o aluno está vivendo um novo mundo, um novo universo cultural, construindo novos valores. Há deficiências na escrita, até pela própria formação, isso tem que ser corrigido na universidade. Se a gente tivesse um ensino médio mais qualificado, o programa universidade para todos, que é um cursinho pré-vestibular para alunos que saem do 3º ano. Os professores têm que ter consciência dessas deficiências e buscar tratá-las.

AT – A avaliação está melhorando, como vocês acompanham isso? É feito provão para avaliar o desempenho do aluno?

MT– Alguns cursos nós temos tido resultado satisfatório no Enade, outros estão abaixo do esperado. A universidade, hoje, está fazendo uma avaliação dos cursos de graduação em todo o Estado. Estamos em processo de avaliação porque, como têm cursos que são ofertados há mais de 20 anos em outras regiões, essa avaliação combinada com o Enade vai nos dar a possibilidade de reorientar a oferta. Temos tentado ver isso e também com a sinalização que podemos mudar.

AT – A senhora poderia citar um curso de excelência e quais os que demandam esse desafio?

MT – Eu não poderia rotular, na Uneb isso é muito diverso. O resultado do Enade tem o curso de pedagogia como um dos primeiros colocados. Recentemente, tivemos fonoaudiologia, então não podemos catalogar por área, mas eu posso passar para vocês por ano, para ser mais justa, o curso de direito de Juazeiro tem sido muito reconhecido no Enade em que pese ser no interior. Não é só o fato de ser de Salvador que significa ser bem conceituado, o de pedagogia de Irecê é um dos melhores do Estado. Vale a pena conferir esse dados por ano. O de medicina da Uesc é bom também.

AT – Quais os cursos seriam fechados por causa do valor, qual a tendência de mortalidade dos cursos?
MR – A mortalidade dos cursos é uma tendencia causada pelas fusões e aquisições feitas por grupos de fora, em todo o Brasil vai acontecer isso. Se os grupos econômicos não levarem a sério o ensino superior, isso vai acontecer... isso está acontecendo com as universidades americanas.

AT – E na Bahia isso está acontecendo?

MR – Na Bahia tem duas: a associação feita pela Jorge Amado e uma universidade americana e a FanoC (instituição que adquiriu a Ruy Barbosa, ÁREA 1 e FTE), graças a uma união de um banco suíço que efetuou a compra. Esse banco tinha no Rio de Janeiro e já está em outros países.

AT – Qual a avaliação que a Abames faz desse fenômeno?

MR – É um fenômeno que está acontecendo e a tendência vai ser essa.

AT – Quais são as filiadas da Abames, todas elas são?

MR – As três citadas e a Unijorge.

AT – Será que os americanos vão vir para cá e fazer o mesmo que eles fazem lá, com o foco na excelência, ou eles vêem com uma visão extremamente capitalista, tipo “o que nos interessa não é bem a educação e, sim, sair do País e ganhar dinheiro? 0

MR – Bem, todas elas que estão vindo têm grande poder econômico e grande quantidade de alunos nos EUA. Existia uma regulamentação que dizia que não podia passar de 50% do capital estrangeiro aqui, mas o que estamos vendo é que essa regra não está sendo cumprida. Menos da metade do capital deveria ser de fora, para manter o controle nacional, mas em São Paulo é muito comum isso do controle maior de fora... a tendencia é nacional.

AT – Há algum exemplo disso?

MR – Essa dos bancos, que eu acabei de falar, já é uma totalidade.

AT – Qual a opinião de vocês (professores) de como o capital entra no ensino? Depois disso os empresários, que não são da área, muitos que não têm histórico de educação, começam a se interessar pela educação?

MR – Isso pode ser negativo ou positivo, a depender da ação que o grupo acionário faz, mas para ter isso, para fazer essa ação, eles têm que ter atenção à qualidade e seguir uma linha.

AT – Qual a situação dentro da Abames, tem um momento antes e um momento após a entrada desse capital?

MR – A Unijorge e as outras citadas estão mantendo a participação.

AT – Estão tendo que falar inglês lá na Abames (risos)?
MR – Eles têm apenas um representante, pelo o que tenho conhecimento, que fica na sede, mas o representante americano não aparece lá, só os diretores acadêmicos e financeiros, que estão representando o grupo, comparecem à Abames.

AT – A presença econômica reflete-se somente na saúde financeira da instituição ou isso e reflete também na campanha de qualidade do ensino?

MR – Por enquanto não podemos dizer que houve qualidade no ensino, nós interpretamos como estando a mesma coisa, mas o aporte financeiro melhora a estrutura física... a inadimplência das faculdades, em geral, é uma coisa bastante preocupante.

AT – Temos informações que existe um grande número de questões trabalhistas com o corpo docente. Na Uneb, a quantidade de mestres e doutores e essa questão com os professores, o Estado tem sofrido com muitas paralisações (essa semana teve um dia de protesto), ou seja a questão salarial tem sido muito turbulenta nas estaduais e nas particulares, são questões trabalhistas. O senhor citou que existe um problema muito grande, que é a inadimplência dos alunos, mas como está a questão salarial dos professores?

MR – De um modo geral, a Abames não trata disso.

AT – E os filiados da Abames? É complicado ter um filiado que não tem garantidos os seus direitos trabalhistas. Se o filiado dela não pagar, vocês tem como excluir o filiado?

MR – Existe um estatuto de conduta ética, onde não podemos excluir e, sim, recomendar.

AT – Mas isso é uma prova que existe professor ou o senhor está falando que não existe?

MT – Nós temos conhecimento de casos, mas esses casos não chegam à Abames como uma queixa formalizada. Uma vez chegou uma carta de um professor que disse que não estava recebendo salário, convidamos o associado e foi feita, inclusive, uma assembleia, para leitura da carta, onde ele se explicou. Depois, a faculdade publicou uma resposta àquela carta que havíamos recebido

AT – Há uma rotatividade do quadro de professores de um modo geral no mercado?

MR – Não classificaria assim, eu acho que houve uma expansão, muitos cursos de demanda que se estabeleceram em cursos menores.

AT – Em termos de remuneração, se eu fosse professor universitário ganharia mais na pública ou na privada?

MR – Em valor nominal da aula, as particulares pagam melhor, mas na pública há possibilidade de expansão da hora-aula... é possivel se expandir, a depender dos departamentos.

AT – Há um compartilhamento de profissionais que ensinam nas públicas e nas pagas?

MR – Claro. Principalmente nos cursos de pós-graduação, o professor é procurado em todos os lugares, ele é uma referência... se não tiver dedicação exclusiva pode ensinar e ser até consultor em pós-graduação, não em aula específica.

AT – Nessa questão dos docentes, qual o relatório do MEC?

MT – Existem uma avaliação do funcionamento das universidades, as estaduais também aderiram ao projeto... este é o instrumento que o governo tem para fazer a avaliação e regulamentação em tudo que for expandido em termo de administração privada e pública, houve uma estabilização e uma ampliação dessas demandas, que estão muito aquém do que são colocadas. A capacidade de se fazer regulamentações e depois verificar se estas foram cumpridas e não deixar que isso seja feito em um novo processo de recredenciamento, eu acho que esse é um dos desafios que o MEC tem...

AT – Há uma queixa constante das lideranças da Uneb de que o governo passado atendia interesses políticos. Um deputado podia instalar uma universidade aqui e acolá... e isso impactou na verba da universidade. Esse é um entendimento de vocês, realmente aconteceu isso aí?

MT – A gente sabe que na história dos departamentos do interior havia uma política muito grande, até os que foram criados por determinações do governo. Temos cursos que não foram criados com o consentimento do Conselho Universitário... mas a expansão não era realizada só pela política, a própria comunidade acadêmica pressionou, o que resultou em 26 cursos novos. Mas, na história da Uneb há registros da participação política na criação de alguns cursos. discutimos sempre a autonomia da Uneb. Uma pauta que está em discussão com o secretário, que deve ser agendada também com o MEC, é a o financiamento das faculdades estaduais. Mas posso dizer que, nos últimos anos, os cursos que foram criados foram por decisão da universidade.

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