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Sebos e projetos de livros usados ganham preferência dos pais

Economia por meio de aquisição de itens usados chega a 70%

Publicado domingo, 16 de janeiro de 2022 às 13:07 h | Autor: Priscila Dórea

Enquanto livrarias e papelarias ainda sentem um movimento fraco no que diz respeito às listas de materiais escolares nesse início de ano, as atenções dos pais e mães estão concentradas nos sebos, projetos e grupos de usados, e seus livros que podem chegar a ser 70% mais baratos. E essa redução nos custos será muito bem vinda em 2022 já que, de acordo com a Associação Brasileira de Fabricantes e Importadores de Artigos Escolares (ABFIAE), o aumento no preço dos materiais escolares pode chegar a 30%.

“Para 2022 temos reajustes elevados em todas as categorias de materiais escolares, variando de 15% a 30%, em média”, afirmou o presidente executivo da ABFIAE, Sidnei Bergamaschi. E esse aumento já está fazendo as pessoas se segurarem nas compras, explica o gerente da Nova Cultura Livraria e Papelaria (Pituba), Antônio Batista. A loja vende material escolar e de escritório, e já em dezembro começava a receber as listas de materiais para o orçamento. Porém, a realidade de 2022 está bem diferente.

“Não temos recebido listas e até mesmo o atendimento presencial está fraco. Essa é a época, por exemplo, que estaríamos aumentando a equipe, mas não só não contratamos, como não vimos necessidade de repor estoque, pois as vendas foram fracas o ano todo. As pessoas estão se segurando e comprando apenas o necessário”, conta o gerente. 

Mas mesmo o estritamente necessário tem saído caro, afirma a professora do ensino fundamental, Juliane Oliveira Silva: os materiais de papelaria de sua filha, Joana Oliveira Marques (3º ano do ensino fundamental), custaram em torno de R$ 650. “E a lista de materiais dela é bastante enxuta se comparada às de outras instituições, o preço dos materiais está elevadíssimo. Mas como mãe, educadora e formadora de opinião, procuro dar o exemplo em casa e em sala de aula, principalmente no sentido de poupar a natureza, evitar o desperdício e a produção excessiva de lixo. Os livros paradidáticos dela sempre foram repassados de filhos de amigas. Só eram comprados caso não conseguisse e acredito que com isso a economia, em alguns anos, era de 100%”, conta a professora.

A educadora colocou os livros didáticos da filha à venda no grupo Balaio de Livros (@balaio_delivros), que através do Instagram e Facebook, dá não só a oportunidade das pessoas venderem seus livros parados, mas também de encontrar livros muito mais em conta. Outra boa opção é o projeto Ler na Praça que recebe livros durante todo o ano e os oferece de graça a quem interessar, sempre com muitos exemplares didáticos, paradidáticos. E claro, há os sebos, que sempre ficam movimentados nesse período, afirma a proprietária da Cantinho do Sebo - com stand no Shopping Lapa e loja na Pituba -, Tatiana Amâncio Queiroz.

“Normalmente em janeiro e fevereiro o movimento aumenta, e já pudemos perceber isso na última semana. Hoje esperamos que o comércio volte à normalidade, pois com a pandemia tivemos uma baixa, mas esse ano as expectativas estão melhores. Fazer esses livros circularem é uma forma de ajudar a natureza, assim como dá a oportunidade para que as pessoas economizem, já que os livros podem ficar de 40% a 70% mais baratos”, explica Queiroz.

Historicamente, a procura por livros chega a crescer 50% entre dezembro e início de fevereiro, afirma a gerente de comunicação e marketing da Estante Virtual - site que reúne sebos de todo Brasil -, Erica Cardoso. “E 2022 não está sendo diferente. Vemos a Estante Virtual como uma oportunidade para os pais economizarem. Nascemos justamente com esse propósito de democratizar o acesso à leitura através de livros novos e seminovos”, afirma.

Compra em grupos de livros usados exige cuidados

Quando se trata da compra de materiais escolares todo o cuidado é pouco, e deve ser redobrado quando essa negociação é feita em grupos de livros usados: quando você compra de alguém que não tem o hábito da venda ou isso como profissão, as regras do código do consumidor não podem ser aplicadas, salienta o diretor de fiscalização do Procon, Iratan Vilas Boas, que recomenda a compra de livros usados, já que isso ajuda na manutenção da economia do consumidor, mas é preciso ter cuidado, até porque não é possível garantir devolução ou troca caso o produto seja insatisfatório.

"Por isso recomendo que verifiquem bem a procedência desses grupos e o perfil da pessoa que está oferecendo o produto. Já quando forem comprar os materiais em loja física, é de suma importância que não levem as crianças junto, pois elas vão preferir determinado personagem e marca, e isso pode representar uma diferença de quase 400% na diferença de preço desse produto e um outro de mesma qualidade. Aí tem aquela pressão psicológica da própria crianças e que sensibiliza os pais, muitos inclusive assumindo que aquilo vai motivar ela nos estudos, e isso acaba apenas o complicando financeiramente no futuro", explica o diretor.

É importante também se atentar ao prazo de validade de alguns itens, como tintas, massinhas e canetas hidrográficas, que podem enganar o consumidor por estarem em promoção, mas "esse valor pode estar apenas maquiando a validade do produto e como são materiais muito usados principalmente pelas crianças, o prejuízo pode não só  econômico, mas de saúde também". 

É preciso estar atento também aos itens que não podem entrar nessas listas escolares, como material de limpeza ou de uso coletivo da escola, como copos, pratas e giz de quadro. "No mais, recomendo que baixem o nosso aplicativo, o Procon Ba Mobile App, onde o consumidor pode denunciar caso se sinta lesado ou encontre alguma irregularidade".

Uso de itens usados incentiva o consumo consciente e coletivo

Embarcar no mundo dos livros usados abre os olhos da pessoa para o consumo consciente e coletivo, explica o jornalista e criador do perfil de incentivo a leitura, Articulendo (@articulendo), José Ricardo Oliveira. 

“É um movimento muito bacana, onde você vai ter pais vendendo livros antigos e com esse dinheiro eles compram novos, sejam usados ou não. Pode até ser que para quem vende o retorno seja pouco, mas para quem adquire esses livros é fantástico. O preço dos livros torna o acesso muito difícil e caro, por isso que projetos como o perfil Rede 30 Colaborativa são incríveis”, conta o jornalista.

Ação afirmativa

Criado pela arte educadora da rede pública municipal e estadual de ensino, Márcia Braga, o perfil Rede 30 Colaborativa (@rede30_colaborativa) faz parte do projeto Africanidades Afirmação Identitária, que a educadora criou, no ano de 2017, na Escola Municipal ACM após o Novembro Negro de 2016, quando ela percebeu não haver nenhuma ação voltada a história negra na escola. 

“Hoje desenvolvo ações afirmativas para que essas crianças se vejam nas literaturas, nos brinquedos e possam sonhar chegarem aonde quiserem. Porém, como o salário de professora não me permite adquirir todo material que desejo, passei a intermediar a venda e compra dos livros dos colegas dos meus filhos em troca de doação”, explica.

Ela então passou a receber literatura diversificada e criou a página do Instagram para vender esses livros e reverter os valores em material afro didático, atendendo hoje pais de vários colégios com o mesmo objetivo. 

“Os livros de literatura afrobrasileira vão para as escolas na Bolsoteca, uma bolsa super colorida que empresta os livros aos alunos. Já os outros livros são vendidos baratinhos pelo Instagram e os pagamentos são direcionados para mulheres negras, escritoras e artesãs, que produzem o material que ainda não tenho. A leitura é uma forte aliada no combate aos preconceitos enraizados em nossa sociedade e uma arma contra o racismo que ainda fere e segrega nossas crianças negras”, aponta a educadora.

Representatividade

E uma das beneficiárias da Bolsoteca, a estudante do 3º ano do ensino médio, Jlia Borges dos Santos Alves, concorda e assina embaixo. “É um projeto super interessante e acredito que ter acesso a literatura afro, de escritores que são como eu, negros, me enche de inspiração. Eu amo escrever, e ter acesso a livros como esses me faz ver que eu também posso evoluir como eles evoluíram, mesmo em uma sociedade majoritariamente racista", explica.

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