DIVERSIDADE
Deportação de militante provoca debate sobre direitos
No Brasil, uso do nome social por pessoas trans, travestis e não-binárias é reconhecido desde 2017
Por Jade Santana*
Após a presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Keila Simpson, ter sido detida e deportada do Aeroporto Internacional da Cidade do México, no último domingo, por não ter seu nome social retificado em seus documentos oficiais de identificação, os direitos da população LGBTQIA+ voltaram ao foco de debates.
Militante e travesti, Simpson é uma das principais lideranças do movimento no país desde 1990. Além da coordenação da Antra, coordenou o Centro de Promoção e Defesa dos Direitos de LGBT (CPDD LGBT), espaço que recebe denúncias de violações de direitos do público na Bahia. Foi por conta da sua relevância que ela iria participar do Fórum Social Mundial, onde representaria o Brasil e a associação que reúne mais de 170 ONGs no país. O evento este ano é sediado, entre 1º e 6 deste mês, na Cidade do México.
"Foi uma grande ironia. Enquanto o país apresenta (no evento) dados sobre violência contra a comunidade LGBT, acabei sendo violentada. Isso é muito comum na vidas das pessoas trans. Foi constrangedor, mas como eu digo, para travesti nada é fácil", comentou em postagem nas suas redes sociais. No vídeo, ela destacou que foi detida mesmo após ter apresentado a passagem de volta e a comprovação da participação no evento.
A ativista conta que passou cerca de 10 horas detida no aeroporto, sem informações, até as 4h30 (horário do México), quando foi chamada por um agente e recebeu uma passagem para retornar ao Brasil. "A luta continua, a gente vai vencer essas barreiras. Primeiro, aqui no Brasil, e depois o resto do mundo", afirmou ela que foi impedida de entrar no país porque sua expressão de gênero não corresponderia ao nome que constava no passaporte, o que configuraria, segundo agentes aduaneiros, ‘atitude suspeita’.
“No aeroporto, dei passaporte, visto e cartão de imigração. Meu nome não está retificado no passaporte e, a partir dali, já notei a situação de constrangimento. O policial me pediu o recibo do hotel onde eu ficaria e a passagem de volta”, conta Keila. Ela afirma ainda que, enquanto estava detida, a delegação que a acompanhava tentou contatar o Ministério das Relações Exteriores do Brasil, o Estado mexicano, mas não foi oferecido suporte.
"É um caso clássico de transfobia. Apesar de não haver nenhum tipo de empecilho legal, recusaram um direito humano fundamental - de ir e vir. Se não há motivo para se suspeitar que o documento foi forjado ou falsificado, e você não compreender que a pessoa não mudar o seu documento é uma escolha política, e achar que assim você pode proibir a circulação dessa pessoa, isso é uma violência de gênero”, opina o Juiz Mário Soares Caymmi Gomes, presidente da Comissão LGBTQIA+ do Poder Judiciário da Bahia (PJBA).
Para o magistrado, existem duas opções. Na primeira, teria que ser ajuizada uma ação no México, a partir de uma contestação para conseguir uma liminar que garantisse o direito de Simpson de não ser discriminada pela identidade de gênero. A segunda opção é que o Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) seja acionado por conta da deportação.
No Brasil, o uso do nome social por pessoas trans, travestis e não-binárias já é reconhecido desde 2017. Esse público não tem a obrigação de mudar de nome, mas o direito. “Nenhum estado pode limitar a entrada, saída ou retorno de qualquer pessoa baseada nessa discriminação”, declara Lívia Almeida, defensora pública.
*Sob a supervisão da editora Meire Oliveira
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