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BAHIA

Espaços culturais promovem cidadania e inclusão social no Estado

Teatro e música educam, promovem inclusão e criam fontes de trabalho e renda para comunidades em toda a Bahia

Por *Madson Souza e Priscila Dórea

23/10/2023 - 6:00 h | Atualizada em 23/10/2023 - 12:52
Grupo Polo de Atores foi formado há dez anos e tem aulas de iniciação teatral
Grupo Polo de Atores foi formado há dez anos e tem aulas de iniciação teatral -

Foi nas aulas do Grupo Polo de Atores, realizadas no Cine Teatro Lauro de Freitas, que o aspirante a ator Matheo Sousa, de 13 anos, passou a integrar uma pequena revolução social despertada pela arte em sua comunidade. “O teatro é um livro, uma caixa contadora de histórias, que muda ideias e que trouxe uma mudança radical na minha vida”, garante o jovem, que há pouco mais de um ano frequenta o espaço.

O Cine Teatro Lauro de Freitas é um dos 40 centros culturais – entre museus, teatros, centros, bibliotecas, largos – mantidos pela Secretaria de Cultura da Bahia (SecultBa) no Estado. Envolvendo as comunidades nas quais estão instalados, cada um dos espaços incentiva a produção cultural e o engajamento dos moradores, que formam projetos e grupos artísticos para promover a inclusão e mudar narrativas sociais.

A especialista em segurança pública e porta-voz da Rede de Observatórios da Segurança na Bahia, Larissa Neves, explica que os espaços culturais “são vivos” e que as comunidades “produzem e criam ‘tecnologias de sobrevivência’” usando a arte e a cultura. “Elas articulam diversos atores políticos e sociais para dialogar e integrar em ações conjuntas, aliando políticas sociais e culturais para construção do espaço público”.

O Grupo Polo de Atores, do qual Matheo faz parte, por exemplo, foi formado há dez anos, com aulas de iniciação teatral no Cine Teatro, e a partir dali mudou de forma notória a cena teatral de Lauro de Freitas e da Região Metropolitana de Salvador como um todo. Entre projetos sociais e aulas abertas à comunidade e diversas atividades, o grupo chega a ter 10 mil pessoas como público para suas peças. “O grupo teve sua alfabetização teatral na própria estrutura de ensino e hoje seus integrantes são profissionais desta arte milenar chamada Teatro”, ressalta o diretor teatral e coordenador-geral do grupo, Alberto da Cunha Velloso Neto, o Tobé.

Mãe da pequena atriz de 10 anos Cicinha Alcântara, a técnica em mecatrônica Lílian Alcântara avalia que a entrada da filha no Grupo Polo de Atores aos 5 anos trouxe um amadurecimento “fora do normal” para a idade dela. “Isso mostrou para mim o quanto o teatro pode ser importante na vida de uma criança, não só para seguir a carreira de atriz, mas para que essa criança aprenda a se expressar”, explica. E Cicinha não mede palavras: “Gosto muito de atuar, gosto de fazer um personagem e gosto de ensinar. Na verdade, gosto de tudo no teatro”.

Moradora de Areia Branca, Ilana Mello ingressou no grupo aos 12 anos e hoje, aos 18, dá aulas nas turmas infantis do Polo de Atores, além de atuar como assistente de direção e nos espetáculos em circulação. Para ela, quando se promove cultura e arte, tudo é enriquecido. “Precisamos chegar nas escolas e falar sobre esses espaços, pois sempre há quem diga: ‘sempre quis fazer teatro’ ou ‘eu também quero fazer’”, afirma. “É uma crescente, um verdadeiro efeito manada do bem”.

TRABALHO

No entanto, salienta a coordenadora do Espaço Cultural Alagados (@eculturalalagados), Jamira Alves Muniz, a arte não pode ser só um arranjo, ela tem de ser trabalho – e dar trabalho, também. “A arte é um posicionador que combate a violência de dentro pra fora, pois a violência está dentro de cada um de nós”, argumenta. “Então, quando você faz arte, você libera isso e não pensa em destruir o outro, e sim em compartilhar com o outro. É nesse momento que você vê as crianças se juntarem e se definirem”.

Espaço Cultural Alagados promove  inúmeras atividades para a comunidade
Espaço Cultural Alagados promove inúmeras atividades para a comunidade | Foto: Olga Leiria / Ag. A TARDE

Apostando numa gestão compartilhada com a Secult estadual e a comunidade, uma das grandes parceiras do Espaço Cultural de Alagados é a Escola Comunitária Luiza Mahin, onde questões raciais são levadas para sala de aula a partir dos primeiros anos escolares. “Nosso público mais vulnerável são as crianças e os jovens”, afirma uma das fundadoras da escola, Jandayra Bonfim.

Escola Comunitária Luiza Mahin Uma é parceira do Espaço Cultural de Alagados
Escola Comunitária Luiza Mahin Uma é parceira do Espaço Cultural de Alagados | Foto: Olga Leiria / Ag. A TARDE

“Portanto, todas nossas ações integram a luta contra o envolvimento deles no crime, enquanto oferecemos oportunidades para aqueles que vivem em situação de risco e violência”.

Ex-aluno da escola, Diorgenes Reis hoje é educador social na instituição e afirma ser muito grato pela educação libertadora e transformadora que teve. “Para mim, a escola tem esse papel acolhedor e transformador, que une o útil ao agradável”, avalia. “Não é à toa que a Luzia Mahin é uma referência nacional, pois temos o nosso fazer e ensinar diferente, uma educação antirracista e libertadora que faz uma grande diferença na comunidade”.

HIP-HOP

Outro espaço social libertador e transformador é o criado pelo hip-hop – movimento que inclui expressões culturais como o rap, o break e o grafite –, que aos poucos tem sido chancelado de maneira mais formal no âmbito da educação. Exemplo disso é o Rap Lab (@laboratorioderap), iniciativa financiada pelo edital setorial de Culturas Identitárias de 2019, e que foi realizado em 2022. O projeto é um laboratório de rap para jovens, que teve sede em Cruz das Almas, Santo Antônio de Jesus e Conceição do Almeida e foi focado na experimentação de rimas, produção musical e reflexão teórica sobre a identidade cultural negra.

Foi a partir da percepção dessa distância entre o Estado e a cultura hip-hop que surgiu a ideia de Alanna Oliveira, Danrlei Moreira (Reidan) e Felipe Ramos (Dj Felipe). “Os laboratórios são espaços de valorização deste elemento artístico que é o rap, como parte da cultura negra da juventude contemporânea, e que precisa ser reconhecido enquanto tal”, explica Alanna.

Apesar de o público-alvo do Rap Lab ser até 14 anos, o projeto atendeu crianças e jovens dos 10 aos 25 anos. Para o MC Esdras Nascimento, foi importante participar do programa por ser um tema que faz parte de sua vida e que é de interesse de sua cidade, Conceição do Almeida. “Esses programas mostram que a vida não é só o que a gente vê nas ruas”, argumenta. “O rap me ajudou a ficar longe dos lados negativos da rua. Hoje, o hip-hop é a forma mais segura de se expressar, de estar em um lugar que a gente pode falar e sabe que está seguro.”

Os últimos anos têm evidenciado um aumento de projetos de intervenção social voltados à arte que mostram resultados muito positivos e com um grande impacto na vida dos participantes, explica a doutora em Ciências Musicais e docente da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Ariana Perazzo. “Acredito que, ao oferecer conhecimento, acolhimento, uma melhor qualidade de vida e direitos sociais mediados pela arte, isso automaticamente refletirá em mudanças significativas na vida de indivíduos que se encontram em situação de vulnerabilidade social, reduzindo assim a violência de uma maneira geral.”

*Colaborou Maurício Viana, sob supervisão da jornalista Hilcélia Falcão

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